A PEC 241/55 E AS POLÍTICAS DE AUSTERIDADE
01:
O DISCURSO TÉCNICO DO BLOCO DOMINANTE
Nildo Viana
Vivemos numa época obscura e curiosa. A proliferação de
discursos e discussões, em parte devido a conjuntura da sociedade brasileira,
em parte devido às redes sociais e novos meios de comunicação, convive com o
reino da superficialidade. Muitas informações e muitas opiniões convivendo com
poucas reflexões e pouca criticidade. A sociedade brasileira está vivendo um
caos que teve seu início com dois processos simultâneos: crise
político-institucional e crise pecuniária (“econômica”). A origem desses
processos remonta ao primeiro Governo Dilma, que é quando ocorreram os
primeiros sinais de desestabilização do regime de acumulação integral no Brasil
e se iniciou a crise político-institucional (esta a partir das manifestações de
2013) e ambas foram se intensificando nos anos posteriores. Hoje, estamos
diante de um Governo que veio com a promessa de resolver essas duas crises, mas
ainda não conseguiu resolver a crise principal e não superou totalmente a crise
política-institucional, tanto pela crise de legitimidade da democracia
representativa, quanto pela crise de governabilidade que ainda não se resolveu
e ainda ameaça agravar-se pela lentidão, incompetência e propostas impopulares
do atual governo.
Vamos apresentar uma série de pequenos artigos, que depois
serão unificados em um só, sobre a PEC 241/55 e as políticas de austeridade em
geral e os discursos vigentes ao seu respeito, para posteriormente apresentar
uma análise crítica e uma proposta alternativa. A série de artigos pequenos é
por causa da triste realidade atual, na qual as pessoas possuem preguiça de ler
textos mais longos, o que já existia em diversos setores da sociedade, mas foi
ampliado com a era das redes sociais e das postagens curtas e rápidas. Para
aqueles que gostam de textos completos e mais desenvolvidos, uma outra versão
reunindo os pequenos textos será postada no presente blog (http://informecritica.blogspot.com.br/).
A proposta da PEC[1]
241/55, realizada pelo Governo Temer, visa estabelecer um teto para os gastos
públicos durante 20 anos (com possibilidade de revisão em 10 anos). Durante
esse período, os gastos públicos não poderiam ser maiores do que a inflação.
Isso incluiria a educação e a saúde, que só poderiam ter mais gastos se os
recursos fossem oriundos de outras áreas. Ao contrário do que alguns dizem, não
se trata de “congelamento” e sim de um “teto” (máximo) para gastos, que seriam
os atuais e com acréscimos calculados com base na inflação. A justificativa
para tal proposta é realizada a partir de um discurso técnico. Existe a
necessidade de equilíbrio orçamentário por parte do Estado, e nos últimos anos
ocorreu um aumento dos gastos estatais acima da receita. Se o Estado gasta mais
do que arrecada, então promove a dívida pública. O quadro abaixo explicita esse
processo (clique na imagem para ver em tamanho maior):
Disponível em: http://www.politize.com.br/wp-content/uploads/2016/07/teto-de-gastos-pu%CC%81blicos-.png |
A partir dessas informações, fica claro a necessidade de
resolução do problema, pois o aumento da dívida pública (interna e/ou externa)
traz um acréscimo nas despesas estatais (juros, etc.) e tende a piorar ainda
mais a situação. Nesse sentido, o discurso técnico apela para o cálculo
mercantil e assim se justifica: o Estado não pode gastar mais do que arrecada.
A solução encontrada pelo governo Temer é a PEC 241/55 (aliadas a outras
políticas de austeridade, como a reforma da previdência). Se não fizer isso, o
país, que já passa por dificuldade, tende a entrar numa crise grave, pois a
dívida pública aumentaria, os recursos se tornariam ainda mais escassos e o
desequilíbrio afetaria as despesas futuras. Nesse sentido, segundo o discurso
técnico, não existe outra solução e por isso as políticas de austeridade, a
começar pela PEC 241/55, é uma necessidade.
A PEC 241/55 seria, pois, um remédio amargo que durante 20
anos seria usado para recuperar o país e possibilitar o retorno do crescimento
econômico e ajuste entre receita e despesas estatais. Uma vez havendo a
recuperação, os gastos poderiam novamente subir. Em dez anos isso poderia ser
revisto, caso a recuperação ocorresse num ritmo e grau que o possibilitasse.
Esse discurso é verdadeiro? A situação é realmente essa? Tais
políticas resolvem o problema? Essas são questões fundamentais e que pretendemos
responder nos próximos artigos. No entanto, é necessário entender que existe
uma forte oposição à aprovação da PEC 241/55. Um outro discurso existe. Esse é
o discurso demagógico do bloco progressista e a sua análise é necessária antes
da crítica do discurso técnico do bloco dominante.
(Continua...).
[1]
Proposta de Emenda Constitucional. É uma proposta de alterações parciais
(“emendas”) na Constituição Federal, no caso brasileiro, a última, que é a de
1988.
Nenhum comentário:
Postar um comentário