A autogestão é um projeto que emerge no
capitalismo e que ganha vários nomes, sendo que a palavra somente surge no
final da década de 1960. Toda palavra, no entanto, está inserida num conjunto
mais amplo de uma concepção que lhe dá o sentido. O sentido da palavra
autogestão foi deformado com o passar do tempo e nesse contexto é preciso
entender esse processo de deformação. Para entender tal processo é fundamental
entender a ideologia. A razão para isto é devido ao fato de que a autogestão,
no sentido original da palavra e como significado, é oriunda de uma teoria e
sua deformação significa sua absorção por uma ideologia. Sendo assim, vamos
iniciar o presente texto com uma discussão a respeito dos procedimentos
ideológicos de deformação da autogestão e posteriormente colocar alguma de suas
principais formas de manifestação no caso do termo autogestão, destacando sua
principal forma contemporânea, a ideologia da economia solidária.
A Apropriação Ideológica da Autogestão
A ideologia é um sistema de pensamento
ilusório, falsa consciência sistematizada, e sua produção está ligada aos
interesses da classe dominante e/ou suas classes auxiliares. Trata-se de um
saber complexo, sistematizado, que gera uma inversão da realidade, deforma a
realidade apresentando-a e ao mesmo tempo ocultando-a. Não se deve confundir
ideologia com ilusão em geral. As ilusões assumem várias formas, inclusive a
forma do saber não complexo, do saber comum. Esse saber comum já foi chamado de
“senso comum”, “cultura popular”, “saber popular”, “conhecimento cotidiano”,
“representações sociais”, “representações cotidianas”, entre inúmeros outros
nomes. As representações cotidianas são as formas do saber não complexo e não
especializado que todos os seres humanos desenvolvem, inclusive os cientistas,
filósofos e teólogos sobre os temas e questões que não abordam em suas
produções profissionais/especializadas. A ideologia, ao contrário, é um saber
complexo e por isso se distingue das representações cotidianas, inclusive as
ilusórias. A ideologia produz ilusões, mas sob forma complexa, o que a torna
mais convincente. A ideologia se manifesta como filosofia, teologia, ciência,
etc.[1]
A humanidade sempre conviveu com as
ilusões, mas antes das sociedades divididas em classes sociais antagônicas, a
razão de sua existência era a falta de informação e compreensão da natureza e
das relações sociais, devido ao grau de desenvolvimento das forças produtivas.
Quando a humanidade supera em grande parte esse obstáculo, o que se amplia com
o passar do tempo, ela cria uma nova necessidade de produção de ilusão, agora
com raízes sociais: a divisão social do trabalho e as classes sociais com suas
necessidades e interesses, especialmente as classes dominantes que precisam
negar, de forma intencional ou não, um entendimento profundo das relações
sociais, pois não pode declarar abertamente a exploração e a dominação, precisa
justificá-las e isso é a fonte da produção da ideologia por parte dos
ideólogos. Os próprios ideólogos são produtos da divisão social do trabalho.
São aqueles que se especializam no trabalho intelectual e produzem formas de
saber complexo que invertem a realidade.
A ideologia está intimamente ligada à
luta de classes, não apenas por reproduzir os interesses da classe dominante
e/ou de suas classes auxiliares, mas também no sentido de que uma das
atividades dos ideólogos é combater as formas de consciência das classes
exploradas. Eles fazem isso através da crítica, da desqualificação (como as
classes exploradas, devido à divisão social do trabalho, não produzem saber
complexo, a não ser em casos individuais, então a desqualificação das
representações cotidianas, chamadas pejorativamente de “senso comum” é uma
produção da ciência, da forma dominante de ideologia dominante), entre outras
formas. No caso do capitalismo, uma das formas assumidas pela luta cultural da
burguesia contra o proletariado é a de assimilar e deformar as ideias
revolucionárias. Esse foi o caso do que foi feito com o marxismo, entre
diversos outros exemplos. Também não faltam estudos que mostram como o saber
operário em uma fábrica é apropriado e deformado pelos representantes da classe
capitalista.
Esse é o caso da autogestão. A palavra
autogestão tem dupla origem[2],
mas seu conteúdo antecede sua existência formal. A palavra emerge no bojo do
movimento do maio de 1968 na França, quando a rebelião estudantil e luta
operária atingiram grande radicalidade e quase se tornou uma tentativa de
revolução proletária[3].
Autogestão, nesse contexto, significava uma nova sociedade em substituição à
sociedade capitalista. Esse significado foi deformado com a derrota da luta
estudantil e proletária.
A derrota do maio de 1968 fez com que a
classe capitalista e seus aparatos (principalmente seus ideólogos) realizassem
uma contrarrevolução cultural preventiva, ou seja, criaram ideologias diversas
para se apropriar e deformar as ideias revolucionárias que emergiram ou
ganharam evidência nesse momento de ascensão das lutas sociais. Essa é a época
de surgimento do chamado “pós-modernismo”, um nome já problemático e que revela
uma consciência falsa, e por isso outros denominaram “pós-estruturalismo”[4].
Isso se aplicou a diversos termos, incluindo ao termo de autogestão. A palavra,
que era um outro nome para o que Marx denominou “comunismo”, “livre associação
dos produtores”, “autogoverno dos produtores”, etc. ou o que alguns anarquistas
denominaram “anarquia”, uma nova sociedade sem estado, classes, capital, etc.
fundada no processo no qual a população dirige ela mesma o seu destino e o
conjunto das relações sociais, foi reduzida a uma parte do todo e retirada do
contexto, que era a sociedade do futuro.
Após essa contrarrevolução cultural
preventiva, a palavra autogestão passa a ser usada pelos reformistas e outros,
retirando seu caráter revolucionário. Esse processo ocorreu com outros termos,
mas ela é o nosso foco aqui. O procedimento ideológico para deformar o termo
autogestão é o mesmo que para os demais termos: destotalização e
despolitização. A destotalização se caracteriza por negar a importância
metodológica da categoria de totalidade, o que significa retirar determinado
fenômeno social de seu contexto histórico, social, sua inserção na sociedade
como um todo. Derivado disso, ocorre o processo de despolitização, pois assim
vira algo meramente técnico, isolado, desligado do Estado, das lutas de
classes, do capital, etc.
As diversas concepções ideológicas de
autogestão que irão surgir terão essa característica fundamental: retirar a
autogestão da totalidade e substituir a concepção totalizante por uma
fragmentadora. Assim, há a transformação da autogestão em mero elemento de
administração, em algo semelhante a uma cooperativa, etc. A autogestão deixa de
ser uma nova sociedade autogovernada pelo conjunto da população e passa a ser
gestão de empresas isoladas, cooperativas isoladas, democracia direta, etc.
Esse é o procedimento ideológico da deformação da autogestão, pois através
deste fantástico e pouco realista desligamento da autogestão da totalidade das
relações sociais e abolindo a percepção de que sob forma isolada é impossível
sua existência, a não ser temporariamente ou em escala muito limitada e estando
distante do Estado e do capital.
As Principais Concepções Ideológicas de
Autogestão
Desde o início dos anos 1970, com a
contrarrevolução cultural preventiva depois da derrota do Maio de 1968 (VIANA,
2009), começaram a existir diversas deformações do termo autogestão e seu
significado. A burocracia partidária, expressa nos partidos socialdemocratas e
bolchevistas, buscaram desqualificar a autogestão, colocando que ela era
“impossível”, “esquerdista”, “utópica”, etc., ou colocando como parte do seu
programa, mas não enquanto projeto de uma nova sociedade, apenas como forma de
“gestão democrática”. Esse é o caso da CFDT (Confederação Francesa Democrática
do Trabalho, central sindical), PSU (Partido Socialista Unificado), PCF
(Partido Comunista Francês, que até se colocou contra o movimento estudantil em
1968), PS (Partido Socialista), CGT (Central Geral dos Trabalhadores, central
sindical atrelada ao PCF), etc.
A CFDT foi a primeira e graças ao seu
ideólogo, Pierre Rosavanllon, autor de A
Era da Autogestão, obra publicada em 1976, iniciou o processo de deformação
assimiladora da palavra, sob forma sistemática, ao contrário de outros (tal
como alguns bolchevistas, que preferiram negar e criticar a ideia de
autogestão). A concepção de autogestão em Rosavanllon é reformista, algo
gradual, e que seria uma espécie de forma de gestão das fábricas e empresas,
que, com o processo gradual de transformação, se tornaria um dos pilares da
sociedade futura (ROSAVANLLON, 1979). Ou seja, autogestão aqui não é
totalidade, é parte, a parte política garantida pelo “direito social”, ou seja,
uma versão jurisdicista da autogestão. A segunda forma de deformação ideológica
da autogestão pode ser vista em Jean-Luc Dallemagne na qual ocorre a recusa da
autogestão e uma interpretação ideológica que mescla a concepção de seus
defensores com posições reformistas e esquerdistas, visando defender a
necessidade de burocracia no “socialismo”, bem como interpretando-a como mera
questão de “gestão” (DALLEMAGNE, 1977).
Essas primeiras formas de deformação da
ideia de autogestão seriam reforçadas e ampliadas especialmente nos anos 1980,
quando a própria classe capitalista passa a querer se apropriar do termo
autogestão e transformá-lo em algo compatível com o capitalismo, tornando-se
mera “gestão de empresas” (LOJKINE, 1990). Da mesma forma, algumas tendências
supostamente de “esquerda” passam a usar o termo autogestão num sentido próximo
ao dos reformistas franceses, seja como cooperativa ou “economia solidária”,
seja como algo que ocorreria apenas no interior das fábricas. Por isso torna-se
necessário a crítica das ideologias que deformam o conceito de autogestão e
para isso é necessário mostrar a impossibilidade da autogestão no interior do
capitalismo.
Autogestão e Capitalismo
A palavra autogestão, especialmente a
partir de 1980, passou a ser usada para designar coisas como “democracia
direta”, “forma de gestão ou administração”, “cooperativa” ou “economia
solidária”, entre outras concepções ideológicas. Todas essas concepções são
ideológicas por utilizar o termo autogestão como se fosse apenas uma parte da
sociedade, algo restrito, e que, a partir desse processo de extração do
conteúdo totalizante do conceito, pode pensá-lo no interior de outra
totalidade, ou seja, dentro do capitalismo.
Pensar a autogestão como “democracia
direta” significa pensá-la a partir de uma concepção ideológica, mesmo para
quem se diz anarquista ou use qualquer outro nome. Isso ocorre por reproduzir a
concepção ideológica que separa a realidade em diversas partes separadas e
separáveis, promovendo um isolamento de coisas que estão unidas na vida real.
Sem dúvida, a divisão social do trabalho no capitalismo cria a política
institucional (a instância do Estado e dos aparatos burocráticos), bem como o
modo de produção capitalista cria um conjunto de divisões e se distingue de
outros aspectos da realidade, assim como se cria um setor especializado na
produção cultural. Contudo, mesmo no capitalismo, a “política”, a “economia”, a
“cultura”, etc., não estão separadas totalmente. Eles são partes do todo e sua
relativa separação é marcada pela relação, determinação, imbricação,
correspondência, etc. A doutrina dos fatores – uma ideologia que divide a
realidade em “fatores”, tais como o “fator político”, “fator econômico”, etc. –
como se eles fossem independentes e autônomos, revela apenas a percepção da
aparência da divisão social do trabalho no capitalismo[5].
Essa percepção da aparência, por se limitar a ela, é fetichista e ideológica. O
projeto autogestionário é totalizante não por reduzir a divisão social do
trabalho e sim por aboli-la e, portanto, numa sociedade autogerida, nem no
nível da aparência tais divisões seriam percebidas, já que seriam inexistentes.
A ideia de “democracia direta” é em si
problemática e considerada sinônimo de autogestão significa reduzir o projeto
autogestionário a algo que seria separado, a instância política, tal como no
capitalismo. Assim, isso significa pensar a sociedade do futuro, como suas
relações sociais radicalmente diferentes, a partir dos termos e construtos do
presente, que expressam as relações do capitalismo. Ao projetar termos e
construtos do capitalismo para a sociedade autogerida, essa concepção
simplesmente deforma a ideia de autogestão, sendo a projeção do capitalismo e
sua divisão social do trabalho para o futuro, tendo caráter
contrarrevolucionário. Além disso, ainda promove a confusão de pensar na
possibilidade da autogestão no interior do capitalismo, pois sendo apenas uma
parte da realidade, a da política, se poderia pensar em “democracia direta” no
seu interior.
A ideia de autogestão como “gestão de
empresas”, seja de “fábricas recuperadas”, seja como forma de administração de
empresas capitalistas, é outra deformação ideológica do conceito original. As
empresas capitalistas funcionam para realizar o processo de exploração e uma
“autogestão” no seu interior é impossível. Nesse caso, o que pode existir é
“participação”, “controle operário” ou “cogestão”. A participação é o que
ocorre nas empresas capitalistas que usam formas de administração
participativas, nas quais os trabalhadores podem influenciar, discutir, e até
mesmo decidir alguns aspectos do processo produtivo, mas jamais o processo em
sua totalidade. A classe capitalista jamais permitiria isso, embora, sem
dúvida, possa usar um nome bonito como “autogestão” e permitir a participação
dos trabalhadores em parte do processo para aumentar a produtividade e a
docilidade dos mesmos. Essa participação pode ser mais ampla e permitir o que
foi denominada “controle operário”, processo no qual a participação geral é
mais intensa e o processo de trabalho fica sob o controle dos trabalhadores.
Aqui é apenas uma questão de grau, quantitativo, e o processo de trabalho, uma
parte do processo de produção em geral, fica sob a responsabilidade do controle
dos trabalhadores. Ou seja, trata-se de controle de apenas uma parte da
produção e não de sua totalidade.
As chamadas “fábricas recuperadas” são
empresas capitalistas falidas ou abandonadas que os trabalhadores passam a
gerir. Aqui nós temos o caso da cogestão, pois o processo de trabalho e o
conjunto da produção em determinada fábrica ou empresa passa a ser gerida pelos
trabalhadores. No entanto, isto não é autogestão, por mais que alguns insistam
em usar tal termo. É cogestão, pois autogestão pressupõe a gestão de todo o
processo, nos meios e fins, na forma e no conteúdo. A fábrica isolada está
submetida ao mercado, à necessidade de matérias-primas, tecnologia, máquinas em
geral, bem como o que produz é para o mercado e não para o autoconsumo. Nesse
sentido, a gestão é apenas do processo de produção local, ou seja, na unidade
de produção, sem haver autogestão das demais unidades de produção
(fornecedores, etc.), sem controle do que se produz e para quem se produz.
Trata-se de cogestão porque se define apenas o como se produz.
A última forma de ideologia
assimiladora da autogestão, que por sua vez pode assumir inúmeras outras
formas, é a do cooperativismo. As cooperativas são formas organizacionais que
trabalhadores utilizam para coletivamente produzir ou consumir. Elas parecem se
aproximar mais da autogestão, pois nelas a figura do capitalista inexiste. Mas,
tal como no caso das fábricas recuperadas, as cooperativas estão envolvidas na
divisão capitalista do trabalho e, portanto, decidem apenas o como produzir e
não os demais aspectos, é uma gestão de uma unidade de produção cercada pelo
modo de produção capitalista.
Todas essas concepções ideológicas de
autogestão se espalham pela sociedade e visam, na maioria dos casos,
simplesmente apagar da memória social a luta heroica do final dos anos 1960 e
as lutas revolucionárias do início do século 20, entre diversas outras, bem
como as teorias e concepções revolucionárias produzidas por Marx e diversos
outros. A autogestão é uma totalidade, é uma nova sociedade, como “anarquia”,
“comunismo”, sendo que o último nome também foi deformado e o primeiro está
ligado a uma corrente política com múltiplas subdivisões e, portanto,
definições.
A autogestão não somente é uma
totalidade, como não pode ser desligada da mesma e existir em outra. Por isso é
impossível autogestão no interior do capitalismo, a não ser em experiências
temporárias e esporádicas, existindo através do conflito permanente.
Dificilmente ela se prolonga por muito tempo. Nas melhores tentativas é uma
“autogestão imperfeita”, ou seja, é mais um objetivo do que uma realidade. E
existem diversos motivos para ser assim. Nas épocas de revolução social, a
autogestão se manifesta de forma mais desenvolvida e completa e caminha para
sua generalização, o que pode ser impedido pela contrarrevolução, o que
geralmente ocorreu na história das lutas revolucionárias. Em períodos
não-revolucionários, é impossível a autogestão em empresas. Para entender isso
é necessário entender o capitalismo, outra forma de sociedade, outra
totalidade.
No capitalismo, o capital predomina e o
mercado, o lugar das relações entre os capitais privados, acaba cercando tudo e
realizando o processo de mercantilização das relações sociais, bem como da
transformação de todas as formas de produção em capitalistas, semicapitalistas
ou subordinadas ao capitalismo[6].
O cálculo mercantil se torna predominante não apenas na produção capitalista,
mas em todas as formas de produção e distribuição da sociedade capitalista. As
empresas capitalistas são aquelas voltadas para a produção de mais-valor ou
para a sua reprodução/repartição, incluindo o capital industrial, comercial,
educacional, comunicacional, etc. Qualquer pequena empresa acaba tendo que se
submeter ao domínio do capital e optar por ser capitalista, semicapitalista ou
subordinado ao capitalismo. As cooperativas são semicapitalistas e o modo de
produção camponês subordinado ao capitalismo. Para entender esse processo
devemos reconstituir o processo de passagem do não-capitalismo para o
capitalismo.
A transição do feudalismo para o
capitalismo significou não somente a queda paulatina do modo de produção
feudal, mas o surgimento do modo de produção capitalista e diversos modos de
produção subordinados. O modo de produção camponês, por exemplo, emerge nesse
contexto histórico marcado pela subordinação ao capitalismo. No modo de
produção camponês há a produção de valores de uso e valores de troca, ou seja,
se produz para o autoconsumo e para o mercado, sendo que é neste último que se
concretiza a subordinação, bem como através da ação estatal.
Esse processo abre espaço para a
criação de modos de produção semicapitalistas, fundados em pequenas
propriedades sem uso de força de trabalho assalariada. Essas formas de produção
se assemelham ao modo de produção camponês e demais modos de produção
subordinados, mas com o diferencial de que produzem apenas valores de troca, ou
seja, produzem para o mercado e não produzem os valores de uso, para o
autoconsumo (o que não impede, em certos casos, de consumir coisas produzidas,
mas elas são processos nos quais o consumo é de mercadorias, ou seja, do que
foi produzido para venda e subtraído, entrando na contabilidade geral do
processo de produção e em quantidades limitadas para não comprometer o lucro e
sobrevivência da mesma).
Este é o caso do modo de produção
cooperativista. As cooperativas de produção[7] são
um modo de produção semicapitalista, pois não só estão totalmente subordinadas
à divisão capitalista do trabalho, como também realizam o processo de produção
exclusivo de mercadorias. A repartição do lucro é realizada sob duas formas, a
especificamente capitalista, salários e a forma cooperativa, rendimentos pela
propriedade coletiva. Ela é semelhante à cogestão das fábricas, pois nessas os
trabalhadores se tornam proprietários e recebem além do salário um outro
rendimento. Contudo, existem casos em que alguns ganham apenas rendimentos,
outros apenas salários, e casos em que recebem ambos. Na cooperativa, os
trabalhadores determinam o como produzir, mas não os demais aspectos. Claro que
em diversas experiências existe uma divisão entre proprietários e assalariados
e isso significa que a cooperativa se transformou numa empresa capitalista.
Esse processo de passagem de modo de
produção semicapitalista, cooperativista, para capitalista, é resultado do
sucesso das cooperativas no interior do modo de produção capitalista. Quanto
maior é o desenvolvimento das cooperativas, mais elas se integram no
capitalismo, e passam a criar obstáculos para entrada de novos sócios, buscam o
aumento do lucro e gerar a separação entre trabalhadores assalariados e
dirigentes/proprietários. Assim, há uma metamorfose nas cooperativas, tanto no
processo histórico que amplia sua integração no capitalismo, quanto pelas
formas capitalistas de apropriação delas, seja colocando-as como apêndices
lucrativos ou usando-as como fachadas para exploração capitalista disfarçada.
As cooperativas não possuem condições de assumir um papel revolucionário, pois
nascem e se desenvolvem na sociedade capitalista, subordinadas ao mercado, ou
seja, aos capitais individuais. Ou elas fracassam e falem, ou prosperam e se
tornam capitalistas.
Mas não é apenas a dinâmica capitalista
do mercado dominado pelos capitais individuais que corroem as cooperativas. O
Estado cumpre um papel fundamental nesse processo, sob as mais variadas formas:
legislação, impostos, taxas, etc. As cooperativas precisam ser legalizadas e
atender um conjunto de requisitos impostos pelo Estado, bem como dispêndios que
esse exige, tornando sua vida ainda mais difícil de autossustentação.
Outros elementos da sociedade capitalista
interferem e contribuem para o fracasso ou apropriação capitalista delas, tal
como a cultura, a mentalidade e os valores dominantes. No início do século 19
foi possível pensar um cooperativismo revolucionário, que logo foi superado
pelo reformista e pelo pragmático, até chegar à ideologia da economia solidária[8].
E os ideólogos e ideologias são outros obstáculos para as cooperativas, que se
tornaram apêndices do capitalismo. Por isso é importante analisar uma das mais
fortes ideologias que deturpam a ideia de autogestão hoje e que é uma forma
contemporânea de se pensar o cooperativismo, a chamada “economia solidária”.
A Ideologia da Economia Solidária
A chamada “economia solidária” é uma
nova versão ideológica de deformação do conceito de autogestão. O que se chama
“economia solidária” é, no fundo, uma forma de cooperativa degenerada. Na
verdade, a dita “economia solidária” não apresenta nada de muito novo em
relação às cooperativas pragmáticas, a não ser que em muitos casos fazem um
discurso pseudorrevolucionário, aliado a um atrelamento maior ao Estado
capitalista, e vive vegetando na sociedade capitalista ou realizando a passagem
para a forma capitalista de produção.
Quais são as reais diferenças entre a
economia solidária e as cooperativas pragmáticas? No fundo, as diferenças
concretas, reais, da economia solidária em relação às cooperativas pragmáticas
são: a) o discurso pseudorrevolucionário que apela para “solidariedade”[9]
e que se coloca como um modo de produção intersticial que caminha para o socialismo;
b) a sua constituição no contexto cultural e social do capitalismo
contemporâneo, marcado pelo regime de acumulação integral, com seu Estado
neoliberal e suas políticas de redução de gastos estatais e responsabilização
da sociedade civil, aliado ao aumento do desemprego e nesse contexto as
cooperativas chamadas solidárias servem como estratégia de sobrevivência e
atraem desempregados e subempregados; c) o seu atrelamento ao Estado, através
do SENAES – Secretaria Nacional de Economia Solidária, FBES – Fórum Brasileiro
de Economia Solidária, entre outras instituições estatais, incluindo as
universidades[10].
O financiamento estatal e do capital
bancário é apenas a forma do capital assimilar tais experiências. Enquanto o
cooperativismo revolucionário do século 19 era produção dos próprios
trabalhadores, o cooperativismo estatista, chamado “economia solidária”, pode
emergir a partir de iniciativas estatais ou dos próprios trabalhadores, mas que
são assimiladas e coordenadas pelos governos ou suas instituições. O primeiro
processo ocorre por incentivo e iniciativa do governo e o segundo quando a
iniciativa é de setores da população que o Estado passa a coordenar em sua rede
de instituições, supostamente de apoio, mas, no fundo, de atrelamento.
O interesse estatal na economia
solidária é fundamentalmente diminuir os conflitos sociais e desemprego, graças
aos seus efeitos problemáticos para a governabilidade, bem como cooptar
diversos setores da sociedade, principalmente os mais beneficiados com a
cooperativas estatistas[11].
O discurso ideológico da economia
solidária se manifesta sob várias formas e não é nosso objetivo analisá-lo aqui
em sua totalidade. No fundo, as iniciativas de economia solidária são ou formas
de manifestação do modo de produção cooperativista, logo, semicapitalista, ou
formas capitalistas disfarçadas. Logo, não tem nada a ver com autogestão.
Obviamente que um dos aspectos de sua concepção ideológica reside justamente em
usar o termo autogestão. Claro está que o uso da palavra autogestão na economia
solidária é ideológico e também limitado, ou seja, não tem o caráter
totalizante de autogestão do processo de produção e do conjunto das relações
sociais. Nem sequer se coloca como autogestão das cooperativas. A autogestão
nas empresas de economia solidária refere-se a apenas um dos seus aspectos, o
administrativo[12].
Nesse caso, a relação entre economia solidária e autogestão é apenas
imaginária, uma ficção que serve aos interesses do capital e do Estado e dos
cooptados por ela.
As empresas cooperativas estatistas,
chamadas de “economia solidária”, estão submetidas ao capital e ao Estado, como
todas as cooperativas, só que, no caso do aparato estatal, de forma mais
intensa. Em suas formas mais desenvolvidas e consolidadas, são empresas
capitalistas disfarçadas e em suas formas mais precárias, são formas de
disfarçar o trabalho precarizado e estratégia de diminuição do desemprego.
Nesse sentido, economia solidária nada tem a ver com o projeto autogestionário
e o tratamento que os seus ideólogos dão a essa palavra é apenas mais uma
deformação ideológica do seu significado.
A ideologia que afirma tratar-se de um
modo de produção intersticial, ou seja, um espaço de produção não-capitalista
dentro do capitalismo, que poderia se generalizar, superando o capitalismo, tal
como sugerido por Paul Singer (2002), é absolutamente falsa. Ela é falsa por vários
motivos. Um deles remete ao fato de que o modo de produção cooperativista é
semicapitalista e vegeta no capitalismo. Ele não constitui alternativa ao
capitalismo e nem tem capacidade de se generalizar, pois sua prosperidade,
enquanto empresa cooperativa particular, significa sua passagem para se tornar
uma empresa capitalista e seu fracasso significa a falência. Da mesma forma, a
ampliação do número de cooperativas só seria possível se fossem as prósperas,
que já não são mais cooperativas propriamente ditas e sim empresas
capitalistas. A ampliação de cooperativas que fracassam e são precárias é algo tão
fantástico e fantasioso que só no mundo ilusório da ideologia isso poderia
ocorrer. Um modo de produção semicapitalista ao se desenvolver se torna
capitalista e ao não se desenvolver, entra em colapso e deixa de existir.
O modo de produção cooperativista, por
ser um modo de produção semicapitalista, não tem como ser uma alternativa ao
capitalismo. Ele nasce dentro do capitalismo e segue a dinâmica do mercado e a
regularização do Estado, reproduzindo internamente a dinâmica de um modo de
produção semicapitalista. A sua dinâmica é a mesma das pequenas propriedades[13]
no interior do capitalismo. Assim, a sua comparação, novamente, como modo de
produção camponês e o modo de produção das pequenas propriedades no capitalismo
ajudam a entender sua dinâmica.
O modo de produção capitalista tem sua
dinâmica centrada na acumulação de capital, no qual o investimento em dinheiro
permite a produção de mercadorias e exploração do trabalho do proletário, que
gera mais dinheiro, sendo este reinvestido, aumentando a produção/exploração e
o lucro e, por conseguinte, o dinheiro, e assim sucessivamente. O seu movimento
pode ser esquematizado da seguinte forma: D-M-D’-M-D’’-M-D’’’[14]
e assim sucessivamente, representando a reprodução ampliada do capital, o que
gera a concentração e centralização do mesmo.
O modo de produção camponês tem outra
dinâmica. Ele produz parte do que é consumido e devido sua subordinação ao
capitalismo, não consegue acumular capital. A sua dinâmica pode ser
esquematizada assim: M-D-M, ou seja, produz mercadoria para a venda no mercado
e com isso adquire o dinheiro para comprar mercadorias que não produz, o que é
possível porque além de produzir mercadorias produz produtos para autoconsumo,
valores de uso, e só compra o que não consegue produzir.
O modo de produção das pequenas
empresas, ou “pequeno-burguês”, possui outra dinâmica. Embora possa consumir
alguns itens que produz, é algo muito restrito, pois sua inserção no mercado e
o tipo de produção é voltada para atender ao consumo alheio. Ele produz mercadorias
exclusivamente ao contrário do modo de produção camponês. Isso não só lhe torna
mais dependente do mercado como também gera outra dinâmica. Essa é a dinâmica
da produção que se autossustenta e obtém um lucro mínimo, o que faz com que sua
reprodução seja problemática. Tal como no caso do campesinato, sua propriedade
é nominal, é mais posse do que propriedade, pois os meios de produção que
constituem o capital fixo (terra, instalações, máquinas, etc.) são pagos em
longo prazo, ou são hipotecados, etc., e sua manutenção é sempre difícil. Eles
estão, como os camponeses, subordinados à força do grande capital comercial e
das outras formas do grande capital e da regularização do Estado burguês. A sua
dinâmica pode ser assim esquematizada: D-M-D’-M-D’-M-D’’-M-D’, ou seja, a sua
acumulação é lenta e pode regredir, falindo ou tornando-se presa fácil para as
empresas capitalistas, cuja concentração e centralização destroem as empresas
menores (mesmo capitalistas e com lucratividade elevada).
Essa é a mesma dinâmica do modo de
produção cooperativista e da sua versão ideológica denominada “economia
solidária”, que tem uma maior possibilidade de existir e talvez se manter
graças ao seu caráter estatista, pois o apoio do Estado (financeiro, técnico,
etc.) faz com que as falências demorem mais ou ajudam na prosperidade daqueles
que abandonam o caráter cooperativo para assumir a forma capitalista.
Isso significa que a produção
cooperativista, e a “economia solidária” mais especificamente, não são um modo
de produção “intersticial” que possa ser alternativa ao capitalismo. Trata-se
de um modo de produção semicapitalista, voltado para a produção de mercadorias
e subordinado ao mercado e ao Estado, sem a menor possibilidade de se opor ao
capitalismo ou de superá-lo.
Esse processo, no entanto, está ligado
ao problema mais geral de que o comunismo ou a autogestão social não pode
emergir dentro do capitalismo, já que é engolido pelo movimento do capital. Se
o capitalismo emerge no interior do feudalismo em crise, é devido ao fato de
que ele nasce da propriedade privada burguesa[15], a
sua superação não pode ocorrer no seu interior, graças à sua dinâmica que
destrói qualquer concorrente, pois a reprodução ampliada do capital, como diz o
nome, é insuperável por outras formas de produção. É por isso que a autogestão
não surge como modo de produção dentro do capitalismo, ou, como diriam outros,
“economicamente”.
A autogestão como processo de domínio
coletivo dos seres humanos associados sobre o seu destino e o processo de
produção e do conjunto das relações sociais, é totalizante, mas se inicia na
luta, na negação do capitalismo e afirmação de si, que é afirmação da
auto-organização e autoformação. Não é no mercado e com propriedades, pequenas
ou não, supostamente coletivas ou não, que a autogestão se coloca como
possibilidade. A sua possibilidade pressupõe a superação do capitalismo e esta
não é feita por concorrentes (sejam pequenos empresários ou cooperativas) e sim
por dentro, pelo próprio proletariado que é explorado e pode destruir as
relações de produção capitalistas e construir as relações de produção
comunistas e isso pode se iniciar nas fábricas, empresas, lojas, mas tem que se
generalizar para toda a sociedade, não apenas no campo da produção, mas também
em todas as formas sociais (abolindo o Estado, o mercado, o dinheiro, gerando
novas relações sociais de produção do saber, etc., todos sob o signo da
autogestão).
A autogestão, como processo de domínio
consciente dos indivíduos sobre suas vidas, emerge quando a luta expressa isso
e, portanto exige organização coletiva autogerida e consciência desenvolvida
desse processo, não só do presente (um conselho de fábrica que consegue
perceber e realizar a autogestão de sua luta), mas do futuro, colocando a
necessidade de realização do projeto autogestionário, que é a generalização da
autogestão, o que implica, por sua vez, a superação da totalidade do
capitalismo (capital, estado, etc.). Logo, nada mais ilusório do que o discurso
ideológico da “economia solidária”, inclusive com o agravante de pensar que o
Estado capitalista – com apoio de instituições burguesas e empresas
capitalistas – incentivaria, como é o caso, o anticapitalismo dentro do
capitalismo. No máximo, a economia solidária é um concorrente e pobre do
capital, que tão logo se amplia, se transforma nele. É um sócio menor que quer
ser como o maior. A autogestão é sua negação total e nasce das lutas
autogeridas e não de empresas semicapitalistas.
Referências
ARVON, Henry. La Autogestion. 2ª edição, México: Fondo de Cultura Económica,
1982.
DALLEMAGNE, Jean-Luc. Autogestão ou Ditadura do Proletariado.
Lisboa, Socicultur, 1977.
DURKHEIM,
Emile. Da Divisão do Trabalho Social.
São Paulo, Martins Fontes, 1995.
LABRIOLA, Antonio. La Concepcion Materialista de la História. Madrid, Era, 1979.
LOJKINE, Jean.
Novas Políticas de Integração Patronal ou Premissas Autogestionárias? In:
SOARES, Rosa Maria (org.). Gestão da
Empresa, Automação e Competitividade: Novos Padrões de Organização e de
Relações de Trabalho. Brasília: IPEA, 1990.
PLEKHANOV, G. A Concepção Materialista da História. 4ª edição, Rio de Janeiro,
Paz e Terra, 1974.
ROSANVALLON, Pierre, La autogestión. Madrid, Fundamentos, 1979.
SINGER, Paul. Introdução à Economia
Solidária. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo, 2002.
VIANA, Nildo. A Consciência da
História – Ensaios sobre o materialismo histórico-dialético. 2ª edição, Rio
de Janeiro: Achiamé, 2007.
VIANA,
Nildo. Cérebro e ideologia. Jundiaí:
Paco Editorial, 2010.
VIANA,
Nildo. O Capitalismo na era da acumulação integral. São Paulo: Idéias e
Letras, 2009
* Nildo Viana é sociólogo e filósofo.
[1]
Para maiores detalhes sobre ideologia, veja Viana, 2011.
[2] A
origem do conteúdo remete ao movimento revolucionário do século 19 e antecede a
origem formal que foi no maio de 1968 em Paris.
[3]
Isso foi antecedido pelo uso do termo na antiga Iugoslávia, sendo adotado na
França e ganhando significado distinto e revolucionário (ARVON, 1982).
[4] O
termo pós-estruturalismo é utilizado por que essas ideologias surgem depois do
modismo estruturalista nas ciências humanas e filosofia nos meios acadêmicos,
superado pela própria luta de classes. O termo pós-modernismo é muito mais
ambicioso, quer romper com o modernismo (toda produção cultural do período
moderno, ou seja, capitalista) e é por isso que grande parte dos ideólogos
também defende a ideia de que a sociedade capitalista foi substituída por uma
sociedade pós-moderna.
[5]
A crítica da ideologia dos fatores é antiga, e seus pioneiros foram Plekhanov
(1974) e Labriola (1979). Veja também Viana, 2007.
[6]
Para um aprofundamento sobre isso, confira meu livro A Mercantilização das Relações Sociais – Modo de Produção Capitalista e
Formas Sociais Burguesas.
[7] As
cooperativas de crédito e de consumo, como expressam relações de distribuição
capitalistas, e se encontram na imbricação entre modo de produção e formas sociais
de regularização, são, então, capitalistas, já que seu papel é possibilitar a
reprodução do capitalismo.
[8] A
história do cooperativismo acompanha a história do desenvolvimento capitalista
e dos regimes de acumulação e por isso é possível observar que o cooperativismo
revolucionário é da época da acumulação extensiva, o cooperativismo reformista
da acumulação intensiva, o cooperativismo pragmático da acumulação conjugada e
o cooperativismo estatista da acumulação integral.
[9] A
solidariedade é um valor universal, autêntico. No entanto, os valores
autênticos são deformados se inseridos numa proposta de valores dominantes,
axiológicos. Por conseguinte, defender a solidariedade pode parecer
revolucionário numa sociedade competitiva como a capitalista, mas isso depende
do conjunto do discurso. Um exemplo ilustra essa questão: o sociólogo
conservador e moralista, Émile Durkheim, colocou a solidariedade como um dos
pilares do seu edifício ideológico e axiológico (DURKHEIM, 1995). Ele postulava
a existência de uma solidariedade na sociedade moderna (capitalista) e por isso
negava a existência da luta de classes e da necessidade de transformação social
radical. Da mesma forma, a questão da solidariedade, pode ser usada para
sustentar e reproduzir os valores dominantes e a sociedade capitalista.
[10] E
complementarmente instituições privadas e as chamadas ONGs e Terceiro Setor.
[11]
Não é sem motivo que tal iniciativa emerge no governo neoliberal de Lula,
visando cooptar setores da sociedade civil para garantir a manutenção do
Partido dos Trabalhadores no poder. O seu caráter estatista é pouco percebido
graças ao próprio discurso da economia solidária e sua estratégia ideológica de
assimilar outras experiências históricas, como as do cooperativismo
revolucionário.
[12]
Isso pode ser visto na obra de seu principal ideólogo, Paul Singer (2002), tal
como se vê no livrinho Introdução à
Economia Solidária (publicado pela Fundação Perseu Abramo, do Partido dos
Trabalhadores), no qual seria mais “democrática” e nas empresas maiores, mesmo estas
tendo hierarquias, partiriam de “baixo para cima”. Obviamente que isso é apenas
discurso, e falso, que não parte das relações sociais concretas, mas mesmo se
fosse assim, no caso das pequenas empresas “solidárias”, não seria autogestão e
sim, no máximo, cogestão. Nas grandes empresas “solidárias” nem cogestão
existe, pois os trabalhadores estão separados da direção e esta concretamente
toma as decisões e possuem as informações e outros meios de administração que
os trabalhadores não possuem.
[13]
As pequenas propriedades são geralmente aquelas empresas que possuem apenas o
trabalho familiar ou agregado de poucos assalariados que ocupam espaços em que
o capital ainda não tomou conta ou que o fez de forma incompleta, deixando
formas marginais de produção. Trata-se do que alguns chamam de
“pequeno-burguês”, mas que a diferença em relação ao modo de produção
capitalista não é apenas de quantidade, mas também de qualidade e que dá margem
para a confusão da classe dos pequenos proprietários com a dos capitalistas por
causa do nome “burguês”.
[14]
D = dinheiro; M = mercadoria; D’ = mais dinheiro que D; D’’ = mais dinheiro que
D’.
[15]
Ou pequeno-burguesa, como alguns diriam, sendo que o sucesso desta está ligado
ao processo histórico, no qual a existência de poucas grandes empresas permitia
que as pequenas prosperassem e se tornassem grandes, o que ocorreu e no momento
histórico posterior, essas ex-pequenas empresas que agora são grandes impedem o
desenvolvimento de novas pequenas empresas.
------------------------------------------------------------------------------------------
Publicado originalmente em:
Nenhum comentário:
Postar um comentário