INDIVIDUALISMO E HOLISMO
NA METODOLOGIA DAS CIÊNCIAS
SOCIAIS
Nildo
Viana*
As
ciências sociais, no decorrer de sua história, se viu dividida em dois
princípios metodológicos que se opõem e disputam o predomínio nas
universidades, publicações e institutos de pesquisa. Estes dois princípios
metodológicos são o holismo e o individualismo. O nosso objetivo, no presente
trabalho, é apresentar uma visão crítica e breve destes dois princípios
metodológicos e por fim observar a existência de uma alternativa à eles.
Por
isso, este trabalho será dividido em três partes: na primeira, será apresentado
o holismo metodológico com suas principais variantes nas ciências sociais e
procedimentos metodológicos; na segunda, será apresentado, da mesma forma, o
individualismo metodológico; na terceira e última, será realizada uma análise
crítica destes dois princípios tendo como referencial a teoria marxista da
sociedade.
A
escolha entre os diversos autores e representantes de cada concepção levou em
consideração o critério da importância
para a história das ciências sociais, buscando, dentro do possível, abordar o
maior número de autores em cada concepção. Sem dúvida, alguns pensadores
importantes, segundo o critério acima colocado, foram omitidos e outros foram
abordados de forma extremamente resumida, mas não poderia ser de outra forma,
levando-se em consideração a quantidade elevada de autores e os limites do
presente trabalho.
Cabe
observar que no presente estudo nos limitaremos a analisar o holismo e o
individualismo apenas no âmbito das ciências sociais. Isto significa, entre
outras coisas, que as abordagens holistas e individualistas existentes na
filosofia e nas ciências naturais serão deixadas de lado, pois sua extensão
foge aos limites impostos a este trabalho, embora, por vezes, possa aparecer
aqui e ali alguma referência à filosofia e às ciências naturais.
O HOLISMO METODOLÓGICO
O
nascimento da sociologia ocorreu concomitantemente com o surgimento do holismo
metodológico. A sociologia ganhou o seu nível mais elevado de sistematização e
de cientificidade a partir da obra de Émile Durkheim, As Regras do Método Sociológico. Sem dúvida, antes de Durkheim
havia uma “sociologia em estado embrionário” nas obras de Saint-Simon, Comte,
Tarde, Spencer, entre outros, mas é com ele que a sociologia torna-se
sistemática e científica. Também antes dele já existia um “holismo metodológico
embrionário”, tais como o de Comte e Spencer[1],
em muitos pensadores sociais, bem como em filósofos e cientistas naturais, mas
é com Durkheim que ele é sistematizado e ganha forma de uma metodologia
sociológica.
O
termo fundamental utilizado por Durkheim que deixa explícito o seu holismo
metodológico é o de fato social. Para Durkheim, os fatos sociais
são coisas exteriores que exercem coerção sobre os indivíduos[2].
Tal como colocou Anthony Giddens: “os fatos sociais são externos em relação aos
indivíduos e exercem coerção sobre eles. Em As
Regras, prosseguindo no tema do
caráter naturalístico da sociologia, Durkheim sugeriu que essas características
do fato social correspondem à externalidade do mundo físico e às coerções ou
resistências que ele oferece aos nossos atos - posição da qual mais tarde se
afastou em parte. Cada indivíduo nasce numa sociedade já organizada e que por
isso lhe modela o desenvolvimento pessoal: uma sociedade pode ter uma
organização estável, em aspectos discerníveis, no correr de vários séculos,
enquanto gerações de indivíduos vivem suas vidas e morrem. Um indivíduo,
portanto, é apenas um elemento de uma totalidade, uma unidade de um sistema
muito maior. As propriedades da totalidade não de deduzem das propriedades dos
indivíduos que se combinam para formá-la. Durkheim procurou mostrar que o
princípio envolvido nisso pode ser iluminado por analogia com a combinação de
entidades químicas. As propriedades do hidrogênio e do oxigênio, consideradas
isoladamente, são muito diferentes das propriedades que surgem quando eles se
combinam para formar a água”[3].
Assim
se vê em Durkheim uma oposição entre indivíduo e sociedade, em que há a primazia
da sociedade sobre o indivíduo. Aqui se encontra uma concepção de sociedade que
tem uma importante conseqüência para sua estruturação do método sociológico. A
idéia de que a sociedade molda o indivíduo é referente à realidade social, ou
seja, ela se refere a uma determinada concepção de sociedade ou de relação
entre indivíduo e sociedade. Esta concepção de sociedade possui ressonâncias
sobre a estruturação durkheimiana do método sociológico.
Desta
forma, ao considerar o papel proeminente da sociedade em relação ao indivíduo,
ao postular esta determinada concepção da realidade social, Durkheim deveria,
naturalmente, transferir esta concepção para o núcleo do seu método
sociológico. Sem dúvida, podemos dizer que foi isto que ocorreu.
O
método sociológico de Durkheim se estruturou como um holismo metodológico. Para
Durkheim, se a sociologia quiser o status de ciência, cujo modelo é o das
ciências naturais, deverá retratar os fatos sociais como eles são. Como eles
são? Eles são predominantes sobre os indivíduos, são coercitivos e objetivos.
As representações coletivas (o exemplo mais utilizado por Durkheim é o da
religião) e a educação são fatos sociais, sendo, portanto, predominantes sobre
os indivíduos, exercendo coerção sobre eles[4].
Se
a realidade dos fatos sociais demonstra que eles estão acima dos indivíduos e
exerce coerção sobre eles, então o método sociológico deve tomar isto como o
seu princípio metodológico básico. O objeto do conhecimento, assim concebido,
fornece a base empírica que fundamenta o método sociológico. Esta “base
empírica” fundamenta o método sociológico se transforma em um modelo a ser
utilizado pelo sujeito do conhecimento como instrumento para compreender a
realidade social. É por isso que o sociólogo deve tratar os fatos sociais como
coisas.
Cabe
ao sociólogo superar as pré-noções e os preconceitos e apreender a realidade de
forma objetiva. Isto significa que o sociólogo deve reconhecer o caráter
objetivo e coercitivo dos fatos sociais, ou em outras palavras, que o todo (a
sociedade) predomina sobre as partes (os indivíduos).
Como
se compreende, neste contexto, as ações individuais? Como sendo determinadas
socialmente, pois os padrões morais impostos pela sociedade são mobilizadores.
O ser humano tem, segundo Durkheim, uma dupla natureza: uma individual e outra
social. A primeira manifesta o seu lado egoísta que é superado pelo processo de
socialização ao qual o indivíduo é submetido desde sua infância.
Tal
como colocou Durkheim, ”toda educação
consiste num esforço contínuo para impor às crianças maneiras de ver, de sentir
e de agir às quais elas não chegariam espontaneamente, - observação que salta
aos olhos todas as vezes que os fatos são encarados tais quais são e tais quais
sempre foram. (...). Se, com o tempo, esta coerção deixa de ser sentida, é
porque pouco a pouco dá lugar a hábitos, a tendências internas que a tornam
inútil, mas que não a substituem senão porque dela derivam”[5].
Por
conseguinte, o holismo metodológico de Durkheim remete ao estudo da totalidade
da sociedade. As ações individuais existem mas são consideradas como sendo
produzidas socialmente. É por isso que o método sociológico de Durkheim
preconiza o estudo dos fatos sociais como coisas objetivas, exteriores e
coercitivas.
A
obra de Durkheim exerceu e continua exercendo uma grande influência sobre a
sociologia e a metodologia das ciências sociais. Além da sua influência sobre a
corrente funcionalista, da qual foi o primeiro representante, também
influenciou outras correntes e pensadores, tal como o seu sobrinho Marcel
Mauss. Este retoma de Durkheim o termo fato social e o altera inserindo-o no
interior de sua concepção que se diferencia da de Durkheim em alguns aspectos.
M.
Mauss se refere a fato social total: “os fatos que estudamos são todos, permita-se-nos a
expressão, fatos sociais totais ou,
se se quiser (...) gerais: quer dizer que eles põem em movimento, em certos
casos, a totalidade da sociedade e das suas instituições (...) e noutros casos,
apenas um enorme (muito grande) número de instituições em particular quando
estas trocas e contratos dizem respeito antes de mais a indivíduos”. Mauss
coloca enfaticamente que “o princípio e o fim da sociologia é perceber o grupo
inteiro e todo o seu comportamento”[6].
Este
holismo metodológico não é menos enfático do o de Durkheim no que se refere à
relação entre indivíduo e sociedade, pois esta última impõe até mesmo técnicas
corporais àquele e a recusa do indivíduo em acatar as regras sociais tem
efeitos até sobre sua saúde mental[7].
Após
Durkheim, o holismo metodológico também foi sistematizado pela abordagem
funcionalista em antropologia. Embora Durkheim seja considerado o fundador do
método funcionalista por muitos, o certo é que com Bronislaw Malinowski e A. R.
Radcliffe-Brown que ele se torna um método sistemático e o termo função ganha
um papel de primeira ordem. Posteriormente, esta abordagem exerceria uma
influência considerável na sociologia.
Para
Malinowski, a cultura (termo antropológico que é equivalente ao termo de
sociedade em sociologia) é uma totalidade integrada, ou seja, um todo orgânico.
Este “todo orgânico” possui um fim em si mesmo. Na sua clássica análise do
Kula, ele afirma que o “Kula não se
realiza sobre a pressão de quaisquer necessidades, visto que seu objetivo
principal é o de permuta de artigos que não têm nenhuma utilidade prática”[8].
Como não existe “pressão exterior” e o objetivo do Kula é a permuta de artigos e ele é esta própria permuta, então ele
tem como finalidade a sua própria reprodução.
Nesta
concepção, a cultura é um todo que funciona, tal como um organismo. Sendo
assim, tudo que é parte integrante da totalidade integrada tem uma função. Esta
função, por sua vez, tem como finalidade a reprodução do todo. Malinowski diz
que: “definindo o Kula como a
atividade primária e mais importante, e as demais como secundárias, quero fazer
ver que essa prioridade está implícita nas próprias instituições. Ao estudar o
comportamento dos nativos e todos os costumes em questão, vemos que o Kula constitui, sob todos os aspectos, o
objetivo principal: as datas são fixadas, as atividades preliminares
estabelecidas, as expedições organizadas, a organização social determinada, não
em função do comércio, mas sim em função do Kula.
A grande festa cerimonial ao iniciar-se uma expedição, refere-se ao Kula; a cerimonia final da avaliação e
contagem dos espólios refere-se ao Kula
e não aos objetos obtidos pelo comércio. Finalmente, a magia, que constitui um
dos principais elementos de todo esse processo, refere-se exclusivamente ao Kula e isto se abriga até mesmo ao
conjunto de mágicas com que se encantam as canoas. Alguns dos rituais mágicos
do ciclo são executados tendo por objetivo as próprias canoas; outros tem por
objetivo o Kula. A construção de
canoas está em conexão direta com uma expedição do Kula”[9].
Desta
forma, a relação entre indivíduo e cultura (sociedade) é marcada por uma
relação de subordinação. O indivíduo está subordinado à sociedade. Esta é uma
totalidade orgânica que tem a finalidade de se reproduzir e os indivíduos são
os agentes determinados desta finalidade. A realidade social confirma o método
funcionalista e holista.
A
escola funcionalista em antropologia foi desenvolvida por outro pesquisador que
assumiu grande importância na história desta disciplina científica. Trata-se de A. R. Radcliffe-Brown. Ele define
sua concepção de vida social comparando-a com a vida orgânica e assim define o
significado dos termos “totalidade” e “função”: “a vida de um organismo
concebe-se como sendo o funcionamento
da sua estrutura. É através de e por meio da continuidade desse funcionamento
que esta continuidade de estrutura se mantém. Se considerarmos uma parte
qualquer recorrente do processo vital, como por exemplo a respiração, a
digestão, etc., a sua função é o seu papel, ou seja, a sua contribuição para a
vida do organismo na sua totalidade”[10].
Assim,
observamos que o holismo metodológico de Radcliffe-Brown é idêntico ao de
Malinowski, apesar de algumas diferenças de pormenor. A sociedade é uma
totalidade. As partes componentes desta totalidade possuem como função realizar
a sua reprodução. Portanto, o holismo metodológico de Durkheim se desenvolveu e
se tornou mais sistemático com as obras de Mauss, Malinowski e Radcliffe-Brown.
Ocorre, porém, que uma nova forma de holismo metodológico veio a surgir e ocupar
grande parte do espaço antes ocupado pela abordagem funcionalista: o
estruturalismo.
O
método estrutural surge na lingüística através da obra de Ferdinand de
Saussure. Este cria, com sua lingüística estrutural, as distinções entre língua
e fala, sincronia e diacronia. O método estrutural focaliza os elementos
invariantes e permanentes da linguagem, ou seja, sua estrutura. Claude
Lévi-Strauss buscou transferir o método estrutural da lingüística para a
etnologia. Além da lingüística estrutural de Saussure, a fonologia de
Trubetzkoy lhe proporcionou muitos elementos metodológicos que ele incluiria em
sua antropologia estrutural, que seria uma nova forma de holismo metodológico[11].
O
método estruturalista de Lévi-Strauss se fundamenta sob o pressuposto da existência
de estruturas inconscientes. Entretanto, o termo inconsciente, aqui, não possui
o mesmo significado que se encontra na psicanálise freudiana, embora apresente
elementos comuns com a psicanálise estruturalista de Jacques Lacan, segundo a
qual “o inconsciente é a linguagem”[12].
Para
Lévi-Strauss, a atividade inconsciente do espírito, ou o espírito humano
invariante, se caracteriza por impor formas a um conteúdo. Essa formas são as
mesmas para todos os espíritos e isto
torna possível atingir a estrutura inconsciente que está na base de todas as
instituições. Isto quer dizer, entre outras coisas, que as estruturas
inconscientes são invariantes e universais.
Segundo
Jean Piaget, “antes de mais nada, é preciso constatar que se, nessa
perspectiva, tudo é ‘estruturável’, as ‘estruturas’ não corresponderão,
entretanto, senão a certas ‘formas de formas’ entre outras, obedecendo aos
critérios limitativos, porém especialmente compreensivos, de constituir
totalidades possuindo suas leis enquanto sistemas, de exigir que essas leis se
estribem em transformações e, sobretudo, de assegurar à estrutura sua autonomia
e sua auto-regulação”[13].
O
método estrutural busca explicar a totalidade do sistema e considera toda
estrutura como um feixe de relações, que são relações de oposição, em especial
de opositores binárias que revelam o seu caráter de complementaridade[14].
Qual
é o espaço reservado ao indivíduo nesta abordagem? Sem dúvida, a característica
mais polêmica do estruturalismo se encontra na sua tentativa de diluir o homem
nas estruturas. Tal como afirmou Lévi-Strauss: “o objetivo último das ciências
humanas não é constituir o homem, é dissolvê-lo”[15].
O indivíduo é abolido no método estruturalista e em seu lugar emerge um holismo
metodológico sui generis, o das estruturas simbólicas.
Michel
Foucault utiliza uma perspectiva semelhante. Em seu estudo As Palavras e As Coisas,
ele toma como objeto de estudo o que ele chama de “disposições epistemológicas”
e não os seres humanos históricos-concretos[16].
A ausência do ser humano no objeto do conhecimento torna possível sua
“ausência” no sujeito do conhecimento. Este simplesmente deixa de existir. O
indivíduo é abolido no objeto do conhecimento e desta forma torna-se possível
declarar a “abolição do homem”. Isto é uma conseqüência lógica da análise
foucaultiana, pois, se as “disposições epistemológicas” dominam cada época
histórica, então a percepção de que as disposições epistemológicas desempenham
este papel é produto de uma nova disposição epistemológica que passa a dominar
a época atual e não de um sujeito do conhecimento que realiza descobertas sobre
a realidade.
O
que diferencia este holismo metodológico dos anteriores? Podemos distinguir
estas duas formas de holismo metodológico qualificando, para utilizar linguagem
filosófica tradicional, um como “materialismo mecanicista” (Durkheim e o
funcionalismo) e o outro como “idealismo objetivo” (Lévi-Strauss e o
estruturalismo). Ocorre, porém, que estas distinções não esclarecem a questão
da real diferença entre estas duas formas de holismo metodológico.
O
que realmente diferencia estas duas abordagens holistas é a concepção de
totalidade que se encontra por detrás de cada uma delas. A abordagem
durkheimiana e funcionalista compreende a totalidade como um “todo orgânico”,
que, sem dúvida, possui partes, mas que é mais do que a simples soma das
partes. É uma totalidade orgânica e esta analogia entre totalidade e organismo
permite considerar a primeira como sendo algo que possui a finalidade de se
reproduzir, ou seja, como algo que possui vida própria e acima das suas partes
componentes. Em resumo, é uma concepção nitidamente metafísica que se
fundamenta numa analogia entre o mundo social e o organismo subsumindo o
primeiro ao segundo.
A
abordagem estruturalista compreende a totalidade como um “todo estruturado de
forma hierárquica” cujo centro hierárquico reside no mundo simbólico (ou no
mundo das idéias ou da linguagem). Esta abordagem, que também não deixa de ser
metafísica, pois cria uma autonomização do simbólico em detrimento do real, se
fundamenta numa analogia entre linguagem e sociedade e esta última passa a ser
vista como uma “linguagem secundária”, ou seja, nesta abordagem realiza-se a
subsunção da sociedade à linguagem.
Entretanto,
existe duas coisas comuns à ambas as abordagens: elas são holistas e utilizam
como procedimento metodológico a analogia, em que a sociedade é considerada
análoga ao organismo ou à linguagem, o que significa que um e outro se tornam
modelos aos quais a sociedade é subsumida. O indivíduo, aqui, surge como uma
figura apagada, sem poder explicativo e, por conseguinte, valor metodológico.
Entretanto, o indivíduo seria recuperado por um outro tipo de abordagem: o
individualismo metodológico.
O INDIVIDUALISMO METODOLÓGICO
O
individualismo metodológico também nasce simultaneamente com a ciência
econômica. Adam Smith, com o seu elogio da divisão social do trabalho, ao
instaurar uma coincidência entre interesse individual e interesse geral, marca
o nascimento do individualismo metodológico nas ciências sociais[17].
Para
Adam Smith, o interesse geral é a soma dos interesses individuais e o indivíduo
perseguindo os seus fins egoístas e racionais acaba por servir ao bem estar
geral da população. Este “dado da realidade” torna-se um instrumento
metodológico que permite compreender esta mesma realidade. Embora Adam Smith
não tenha criado uma metodologia científica de forma sistemática e sob estes
pressupostos, isto é verificável em seu procedimento analítico e será o ponto
de partida para a elaboração do individualismo metodológico feito
posteriormente de forma sistematizada. Se o mercado baseado nas ações
individuais coloca em funcionamento a economia nacional, então torna-se
desnecessário qualquer regulação estatal desta. A análise, por conseguinte,
deve centralizar-se sobre as ações individuais que ocorrem na esfera do
mercado, que não passa de uma soma das ações individuais.
A
chamada economia neoclássica ou marginalista retomaria e aprofundaria tais
posições num sentido mais metodológico, privilegiando a “psicologia do consumidor”
como elemento explicativo da procura de produtos e serviço e os “elementos
qualitativos da atividade econômica”. Em contraposição à teoria marxista do
valor-trabalho, segundo a qual o valor de uma mercadoria é determinada pelo
tempo de trabalho socialmente necessário para produzi-la, ou seja, pelo
trabalho abstrato, que remete a categoria de totalidade, apresenta a teoria do
valor-utilidade, segundo a qual o valor de uma mercadoria é determinado pela
utilidade que ela possui para o comprador, o que nos leva ao jogo da oferta e
da procura na esfera do mercado, e a análise se desloca para o indivíduo e sua
“subjetividade”[18].
Segundo S. Latouche, “a análise neoclássica parte das preferências do
consumidor, isto é, do universo subjetivo das avaliações individuais. É a
procura que determina o preço (...)”[19].
Essas
abordagens individualistas logo passaram do domínio da economia política para o
domínio da sociologia. Georg Simmel seria um dos primeiros representantes do
individualismo metodológico em sociologia. Para ele, “a sociedade existe onde
quer que vários indivíduos entram em interação”[20]. Entretanto, é com Max Weber que o
individualismo metodológico passa a exercer uma forte influência sobre o
pensamento sociológico e ganha um nível de sistematicidade mais elevado.
Se
em Durkheim a sociologia é a ciência dos fatos sociais, em Weber ela é a
ciência da ação social. Isto deixa entrever que o termo fundamental da
sociologia weberiana é o de ação social. E o que vem a ser ação social? Para
Weber é “uma ação na qual o sentido sugerido pelo sujeito ou sujeitos refere-se
ao comportamento de outros e se orienta nela no que diz respeito ao seu
desenvolvimento”[21].
Deixando
de lado, por enquanto, a tipologia weberiana de ação social, o que interessa
ressaltar é que uma ação social é portadora de um sentido para o sujeito que a
executa. Aqui, segundo nosso ponto de vista, estão presentes o dois termos que
permitem compreender o individualismo metodológico de Max Weber: sujeito e
sentido.
Este
“sujeito” só pode ser o indivíduo. Segundo Weber, “se agora sou sociólogo então
é para pôr um fim nesse negócio de trabalhar com conceitos coletivos. Em outras
palavras, também a sociologia somente pode ser implementada tomando-se como
ponto de partida a ação do indivíduo ou de um número maior ou menor de
indivíduos, portanto de modo estritamente individualista quanto ao método”[22].
E
o sentido da ação social? Este varia de acordo com o tipo de ação social
executada pelo sujeito. Segundo Weber, a ação social pode ser orientada pela afetividade,
pela tradição, por uma racionalidade orientada com relação a valores ou por uma
racionalidade orientada em relação a fins. Independentemente do tipo de sentido
que orienta a ação social, podemos dizer que trata-se de um sentido subjetivo.
Este sentido, por sua vez, é fornecido pelo indivíduo que executa a ação e este
é, portanto, o fundamento do individualismo metodológico de Weber.
Outro
representante do individualismo metodológico em sociologia é Vilfredo Pareto.
Para este autor, a ação social pode ser fruto de uma conduta lógica ou de uma
conduta não-lógica, sendo que só esta última é relevante para a pesquisa
sociológica. A conduta não-lógica do indivíduo é comandada pelo que Pareto
chama de resíduos ou então por interesses (que, no entanto, não passam de tipos
particulares de resíduos). O que são resíduos? Eles “são modificações e
refinamentos do instinto, formados pela experiência; assim, a sexualidade é um
instinto, mas as proibições do incesto e o ascetismo sexual são resíduos”[23].
As ações sociais, como condutas não-lógicas, são predominantes e são dirigidas
por sentimentos, interesses e/ou resíduos. Estas ações são executadas,
obviamente, por indivíduos.
Nas
ciências sociais contemporâneas, o individualismo metodológico ressurge não só
através da metodologia weberiana mas também a partir de novas correntes de
pensamento. Entre estas correntes, se destacam: de um lado, a chamada
“pós-modernidade”, tal como proposta, entre outros representantes, por Michel
Maffesoli[24];
de outro, pela etnometodologia[25]
e pelo “marxismo analítico”.
É
interessante ressaltar a relação do chamado “marxismo analítico” como o
individualismo metodológico, já que Marx não foi incluído como um representante
do holismo metodológico e nem do individualismo. A posição de Marx, ao nosso
ver, tal como procuraremos demonstrar adiante, é oposta tanto ao individualismo
quanto ao holismo. Porém, alguns auto-intitulados “marxistas” defendem com
afinco o individualismo metodológico (assim como outros defendem o holismo,
embora não explicitamente).
O
chamado “marxismo analítico” ou “marxismo de escolha racional” buscam
“reformular” a teoria marxista com a adoção do individualismo metodológico[26].
Embora alguns representantes desta corrente façam algumas ressalvas ao
individualismo, este é sem dúvida o traço distintivo desta forma de “marxismo”.
Os “marxistas analíticos” questionam três aspectos da teoria marxista clássica
e consideram que somente a substituição destes aspectos pela contribuição de
elementos da filosofia analítica e da ciência social positivista poderão
salvá-lo.
Quais
são estes três aspectos? São o holismo metodológico, a explicação funcional e a
dedução dialética. Deixaremos de lado estes aspectos por três motivos: em
primeiro lugar, tais aspectos, ao nosso ver, não estão presentes no marxismo
original (Marx) e sim em algumas correntes pretensamente marxistas; em segundo
lugar, eles podem ser resumidos a um só termo: holismo metodológico, ao qual o
individualismo busca refutar e substituir, sendo isto será tratado mais adiante;
em terceiro lugar, por não ser relevante de acordo com os objetivos aqui
propostos.
Jon
Elster, um dos principais representantes desta corrente (que inclui também Adam
Przeworski, Roemer, G. Cohen, entre outros), define o individualismo
metodológico como sendo “a posição segundo a qual todas as instituições,
padrões de comportamento e processos sociais só podem ser em princípio
explicados em termos de indivíduos: suas ações, propriedades e relações. É um
forma de reducionismo, o que quer dizer que nos leva a explicar fenômenos
complexos em termos de seus componentes mais simples”[27].
Desta
forma, torna-se necessário, então, fornecer micro-fundamentos que complementem
a teoria marxista. Estes micro-fundamentos são as ações individuais motivadas
por escolhas racionais. Tais escolhas significam que se escolhe a melhor ação
dentro de um conjunto de alternativas viáveis.
Portanto,
o individualismo metodológico invade também o campo marxista. Ele defende que a
análise da ação individual é fundamental para explicar a relação entre
indivíduo e sociedade. Isto porque os adeptos desta concepção consideram que é
o indivíduo em relação com os demais indivíduos que dão vida e forma à
sociedade. Instaura-se, assim, a primazia do indivíduo sobre a sociedade.
Estamos, aqui, no extremo oposto do holismo metodológico.
O
objeto do conhecimento deixa de ser o “todo metafísico” do holismo metodológico
e passa a ser as suas partes constituintes, que são os indivíduos. Se na
concepção de sociedade se sustenta que esta se caracteriza pela soma das ações
individuais, então isto deve ser integrado no plano metodológico através da
adoção de uma postura individualista. Aliás, a idéia de soma possui uma
presença constante neste tipo de abordagem quando se refere à sociedade.
O
sujeito do conhecimento, por sua vez, também não deve se submeter a nenhuma
concepção “holista”, “coletiva” ou “abstrata” que sirva de mediação entre ele e
o seu objeto. Daí a vocação empiricista do individualismo metodológico. Existe
uma negação de qualquer tentativa de generalização mais ampla, pois não se pode
fugir do caráter não generalizador da realidade social vista sob uma
perspectiva individualista.
Esta
metodologia, entretanto, está longe de ser unitária. Afinal de contas, figuras
tão diferentes como Weber, Pareto, A. Smith, K. Popper, J. Elster, Maffesoli,
Garfinkel, Simmel, entre outros, não poderiam defender exatamente o mesmo ponto
de vista. Assim como existe mais de um holismo metodológico, também existe
diferenças internas no interior do individualismo metodológico.
Qual
é esta diferença? Se a grande diferença no interior do holismo metodológico se
encontra no seu termo fundamental, que é o de totalidade, então a grande
diferença no interior do individualismo metodológico deve se encontra, também,
no seu termo fundamental, que é o de indivíduo.
Para
alguns adeptos do individualismo metodológico, o indivíduo é um ser racional. As motivações dos indivíduos
são racionais, bem como sua conduta. O indivíduo se move e age de acordo com o
que lhe é vantajoso e benéfico e esta ação é produto de um planejamento
racional do indivíduo. Esta é a posição de A. Smith, da economia neoclássica e
do chamado “marxismo analítico”.
Para
outros adeptos do individualismo metodológico, o indivíduo é um ser passional ou irracional. Embora este último termo possa parecer muito forte, é o
único que pode unir perspectivas diferentes, tais como a de Weber, Simmel,
Maffesoli, Pareto. O indivíduo, neste caso, teria suas ações motivadas por
elementos “não-lógicos” (Pareto, Simmel, Maffesoli) ou por elementos
“valorativos” (Weber), embora o “não-lógico” e o “valorativo” estejam
intimamente ligados.
Entretanto,
pode parecer estranho a qualificação de Weber como “irracionalista”. Podemos
recordar que Weber trabalhou com a idéia de ação racional e por isto não se
poderia dizer que para ele o indivíduo é um ser irracional. Contudo, podemos
sustentar que em seus quatro tipos de ação social subsiste um substrato
irracional.
Isto
é facilmente comprovado quando se trata de dois tipos: a ação social afetiva e
a ação social tradicional. Essas duas formas de ação, sem dúvida, não formas de
ação consideradas “racionais”. Isto é colocado explicitamente por Weber. Mas
resta explicar como ocorre a irrupção do irracional nas demais formas de ação
social presentes na tipologia weberiana.
Segundo
Weber, “a ação orientada racionalmente com relação a valores distingue-se da
ação afetiva pela elaboração consciente dos princípios últimos da ação e por
orientar-se por eles de maneira conseqüentemente planejada. Por outro lado,
ambas tem em comum o fato de que o sentido da ação não reside no resultado, que
já se encontra fora dela, mas na própria ação em sua peculiaridade”. Além
disso, “age de modo estritamente racional com relação a valores quem, sem
considerar as conseqüências previsíveis, se comporta segundo as suas convicções
sobre ou referente ao que é o dever, a dignidade, a beleza, a sabedoria
religiosa, a piedade ou a importância de uma ‘causa’, qualquer que seja o seu
gênero”[28].
O
que isto significa? Significa que a “ação orientada racionalmente com relação a
valores” tem como motivação estes últimos e a racionalidade cumpre meramente
uma função mediadora. Em outras palavras, os elementos racionais deste tipo de
ação social apenas realizam uma mediação entre o substrato irracional que a
motiva e a sua concretização efetiva. O elemento fundamental aqui é o
irracional e não o racional.
Resta
apenas um tipo de ação social, que é a ação racionalmente orientada para fins.
Segundo Weber, “age racionalmente com relação a fins aquele que orienta sua
ação conforme o fim, meios e conseqüências implicadas nela e nisso avalia
racionalmente os meios relativamente aos fins, os fins com relação às
conseqüências implicadas e os diferentes fins possíveis entre si. Em qualquer
caso, pois, é aquele que não age afetivamente (sobretudo emotivamente) nem com
relação à tradição. Por outro lado, a decisão entre os diferentes fins e
conseqüências concorrentes e conflitantes pode ser racional com relação a
valores. Neste caso, a ação é racional com relação a fins somente nos seus meios” [29].
Neste
último caso, não está descartado o aspecto irracional da ação, pois sua
“racionalidade” pode ser apenas um meio para execução de fins valorativos. Isto
tudo significa que permanece a existência de um substrato irracional também
neste tipo de ação social. Desta forma, em todos os tipos de ação social pode
estar presente o fundamento “irracional” que acompanha os indivíduos. Existe a
possibilidade, segundo Weber, de haver uma ação puramente racional, porém, este
seria um “caso limite”.
Desta
forma, não há uma determinação nas ações sociais, pois o sujeito apresenta-se
como indeterminado. Tal como colocou Paul Hirst: “o sujeito humano como ser
livre para projetar significados e buscar fins está na base da sociologia geral
de Weber. A natureza do objeto da sociologia deriva dos atributos desse sujeito
humano livre”[30].
Somando-se
a isto o fato de que os tipos de ação social são tipos ideais nunca presentes
em estado puro na realidade[31],
a racionalidade da ação social deve ser considerada um elemento marginal.
Do
ponto de vista histórico, a ação racional direcionada para fins é equivalente a
dominação burocrático-legal[32],
o que significa que ela está ligada à burocratização e ao cálculo econômico
capitalista. Esta “racionalidade instrumental”, para a sociologia romântica de
Max Weber, aparece como um “desencantamento do mundo”. Na concepção weberiana
de racionalidade, ela é um instrumento cada vez mais utilizado para servir a
fins irracionais. Ocorre, porém, que o problema não se encontra nos fins e sim
nos meios, ou, em outras palavras, o problema se revela quando os meios se
tornam fins em si mesmos e é isto que produz o desencantamento do mundo.
Portanto,
as duas concepções de individualismo metodológico se distinguem por uma ser
“racionalista” e a outra “irracionalista”, o que significa que uma aceita a
união, embora de forma limitada, entre o indivíduo e a sociedade num nível de
elaboração metodológica e outra recusa tal possibilidade, negando a existência
de leis e a possibilidade de união entre as ciências sociais e as ciências
naturais e, por conseguinte, qualquer tentativa de generalização.
HOLISMO E INDIVIDUALISMO DIANTE DO MÉTODO DIALÉTICO
O
método dialético desenvolvido por Karl Marx se distingue tanto do
individualismo quanto do holismo. Em oposição ao individualismo, a dialética
apresenta outra concepção de indivíduo; em oposição ao holismo, apresenta outra
concepção de totalidade; em oposição a ambos, apresenta outra concepção sobre a
relação entre indivíduo e sociedade. Neste sentido, o método dialético é
radicalmente diferente destas duas abordagens metodológicas.
Mas
antes de tudo cabe esclarecer que aqui se trata do método dialético tal como
apresentado por Marx e por um número restrito de continuadores de sua obra
(especialmente, Karl Korsch), pois a maior parte do que se apresenta como
“marxismo” é, na verdade, uma forma de holismo metodológico (ou, em casos mais
raros, de individualismo metodológico).
A
concepção marxista de indivíduo difere radicalmente da concepção expressa pelo
individualismo metodológico. O indivíduo é uma forma concreta de manifestação
da natureza humana. Esta, por sua vez, se caracteriza pelas necessidades de que
ela é portadora. Por necessidade entendemos todo e qualquer impulso orientado
para algum objetivo, ou seja, não se refere apenas a carências mas também a
potencialidades.
Essas
necessidades radicais que caracterizam a natureza humana são de duas ordens: as
necessidades primárias, tais como comer, beber, dormir, amar, etc.; e as
necessidades secundárias, que são a criatividade e a sociabilidade. Existe um
terceiro tipo de necessidades e estas são produzidas socialmente. Se tais
necessidades estiverem em concordância com as anteriores, elas podem ser consideradas
autênticas, e se estiverem em discordância, inautênticas.
O
ser humano para realizar suas necessidades primárias instaura uma relação com a
natureza mediada pelo trabalho e pela cooperação com outros seres humanos[33].
Esta satisfação de necessidades cria novas necessidades. O ser humano ao
transformar o meio ambiente não faz isto gratuitamente, pois ele tem como
finalidade satisfazer suas necessidades primárias. Assim, desde o início, ele
coloca uma finalidade no seu trabalho e por isso pode ser considerado uma
animal teleológico.
Uma
vez satisfeita suas necessidades primárias, surgem novas necessidades baseadas
no próprio ato de satisfação. O trabalho e a cooperação tornam-se necessidades
humanas. Mas não se trata do trabalho como alienação, que é uma negação da
natureza humana, e sim do trabalho como objetivação. Neste último, que se
encontra em concordância com a natureza humana, o ser humano desenvolve suas
potencialidades e sua criatividade, pois assim realiza o processo de
humanização do mundo. O ser humano, entretanto, só pode fazer isso no interior
de uma associação com outros seres humanos. É nesta associação que ele
desenvolve sua consciência e sua criatividade.
Entretanto,
em cada forma histórica e concreta de sociedade a natureza humana se manifesta
de maneira diferente, pois as relações sociais podem reprimir o desenvolvimento
das necessidades humanas e é isto o que ocorre nas sociedades marcadas pela
divisão de classes. O surgimento das classes sociais significa o nascimento da
dominação e da exploração.
Neste
sentido, a concepção marxista do indivíduo é bastante diferente da concepção
apresentada pelo individualismo metodológico. Uma das versões do individualismo
apresenta o indivíduo como um ser racional indeterminado e a outra como um ser passional
indeterminado. A concepção marxista, ao contrário, reconhece que o indivíduo
humano é um ser social e só pode existir no interior de uma associação com
outros seres humanos.
Além
disso, devemos acrescentar que esta associação realiza uma determinação sobre
suas idéias e comportamentos, assim com na constituição de sua racionalidade,
valores, sentimentos, etc. Outra determinação que o ser humano possui são as
suas necessidades primárias. Em uma sociedade repressiva, tal como são todas as
sociedades classistas, a repressão a algumas destas necessidades, em especial a
repressão aos desejos sexuais, cria um conjunto de processos psíquicos que
exercem grande influência sobre o comportamento do indivíduo[34].
Por
conseguinte, o indivíduo é um ser social e isto quer dizer que ele não é um ser
racional indeterminado, nem um ser passional indeterminado. A razão dos
indivíduos é condicionada pelo contexto social e pela forma como eles se
inserem neste contexto e o mesmo ocorre com suas “paixões”. Além disso, o
indivíduo não pode ser definido como “passional” ou como “racional”, pois ele é
as duas coisas ao mesmo tempo. Na concepção marxista, razão e sentimentos
(incluindo aqui o que se chama “valores”, “instintos”, etc.) são inseparáveis[35].
Portanto,
a concepção marxista de indivíduo se opõe a uma versão do individualismo ao
afirmar que ele não é predominantemente (e muito menos “unicamente”) racional e
se opõe à outra ao colocar que ele também não é predominantemente passional e
contra ambas as versões deixa claro que ele não é indeterminado.
A
partir desta concepção de indivíduo fica evidente que não se pode tomar a
relação entre indivíduo e sociedade tal como apresentada pelo individualismo
metodológico e que existe, no marxismo, uma concepção alternativa. Entretanto,
cabe, antes de tratar desta relação, esclarecer qual é a concepção marxista da
totalidade, pois ela também é radicalmente diferente da concepção holista.
Existem
várias concepções de totalidade na filosofia e nas diversas ciências. Ocorre,
porém, que iremos tratar aqui apenas das duas concepções existentes no interior
do holismo metodológico anteriormente tratadas e da concepção marxista.
Para
a dialética materialista, a totalidade assim como todas as categorias
utilizadas por ela, são recursos heurísticos[36].
A categoria de totalidade, desta forma, não é um modelo ao qual a realidade
deva ser encaixada e sim um conjunto de proposições que sugerem a existência de
determinadas relações em um ser (entendido aqui como “um todo”). Tal categoria
foi extraída de situações reais e deve sempre ser confrontada com elas e quando
não houver correspondência deve ser alterada.
A
concepção marxista da sociedade a considera como uma forma de totalidade. Como
o marxismo distingue de forma radical dois tipos de sociedade, as
não-classistas e as classistas, a sua concepção de totalidade apresenta duas
variantes, que possuem elementos comuns e elementos diferenciados. Os elementos
comuns se encontram no fato de que toda sociedade tem como determinação
fundamental[37] o
seu modo de produção. Este é o conceito fundamental da teoria marxista da
sociedade. Podemos dizer que os elementos diferenciados se encontram no fato de
que o movimento da sociedade sem classes é provocado pela forma de relação
entre sociedade e meio ambiente e o movimento das sociedades classistas é
provocado pela luta de classes.
A
partir disto podemos constatar, em primeiro lugar, que a concepção dialética de
totalidade não é a de um “todo orgânico” ou “homogêneo”. As sociedades simples
(pré-históricas e indígenas, que são sociedades não-classistas) são
relativamente homogêneas, mas as sociedades classistas não possuem esta
homogeneidade. Desta forma, a categoria de totalidade não sustenta uma falsa
idéia de homogeneidade, pois esta homogeneidade é inexistente na realidade.
Aqui
cabe abrir um parêntesis para recordar que o método funcionalista, uma variante
do holismo metodológico, se desenvolve num campo de estudos que é o da
antropologia, ou seja, voltado mais para o estudo das sociedades simples, que
apresentam um grau maior de homogeneidade. O funcionalismo de Malinowski,
Radcliffe-Brown, entre outros, demonstram que é nas sociedades simples que se
pode utilizar este método e conseguir um relativo sucesso. Claro que tal
sucesso é apenas “relativo”, pois este método não consegue dar conta nem da
realidade destas sociedades, devido à suas deficiências. Ocorre, porém, que
este “relativo sucesso” acaba “confirmando” o método funcionalista e logo ele
ganha uma justificativa para sua transposição para o estudo das sociedades
classistas, o que é um procedimento ideológico. Aqui fechamos os parêntesis.
Entretanto,
é necessário apresentar aqui a concepção marxista da sociedade classista em
contraposição às concepções do holismo metodológico. A sociedade, segundo este
ponto de vista, não é um “todo metafísico” que possui a finalidade de se
reproduzir. Sem dúvida, as sociedades de classes se reproduzem mas esta não é
uma finalidade sua, pois uma “sociedade” não possui “finalidades”. Este é um
atributo dos seres humanos.
As
sociedades classistas possuem, na verdade, é uma tendência para se reproduzir e esta tendência é provocada pela
supremacia da classe dominante e pelo apoio de suas classes auxiliares. Essa
tendência de reprodução se realiza cotidianamente mas nada garante que ela
continuará se realizando, pois, simultaneamente, existe uma tendência contrária
apontada para a transformação social e que é impulsionada pela luta das classes
exploradas. Neste sentido, as sociedades de classes são totalidades contraditórias,
marcadas pela luta de classes. Não existe nada mais distante disso do que a
concepção holista de “todo orgânico” ou “harmonioso”. Além disso, a visão
marxista também rompe com o teleologismo da totalidade, que se caracteriza por
reificar a sociedade e lhe atribuir uma metafísica finalidade de se reproduzir,
pois somente os seres humanos possuem finalidades.
Neste
ponto, sem dúvida, o individualismo metodológico está correto: a finalidade é
um atributo do indivíduo. Ocorre, porém, que, ao contrário do que diz a
concepção individualista, o indivíduo não é um ser indeterminado. O indivíduo é
determinado por sua natureza e por sua condição social. Como a natureza humana
é a mesma em todos os indivíduos, então a mesma condição social tende a
produzir os mesmos interesses e, por conseguinte, as mesmas finalidades.
Portanto, as classes sociais, que são grandes agrupamentos de indivíduos
definidos por sua posição na divisão social do trabalho (condição social),
possuem finalidades, que são as finalidades dos indivíduos que a compõe.
É
claro que muitas vezes as finalidades dos indivíduos que compõem uma classe não
são as mesmas, mas isto decorre da influência das demais classes sociais e do
conjunto das relações sociais. No caso das classes exploradas isto é mais importante,
pois a classe dominante, para manter sua hegemonia, precisa desarticular o
desenvolvimento da consciência de classe das classes opostas. Se há esta
dissonância entre consciência individual e consciência de classe, isto
significa que não se construiu ainda uma unidade entre indivíduo e classe. No
caso das classes exploradas, tal dissonância é que sustenta a dominação da
classe exploradora. A unidade entre as múltiplas consciências individuais e a
consciência de classe significa a radicalização das lutas de classes e por
conseguinte o reforço desta unidade e a possibilidade efetiva de transformação
social. Tal problema foi bastante debatido na tradição de pensamento que tem
como referencial o marxismo e sua expressão mais famosa ficou conhecida como a
discussão, ainda em linguagem hegeliana, sobre a passagem da “classe-em-si” à
“classe-para-si” — discussão que iniciou-se com Marx e desenvolveu-se com as
obras de Lukács (19 ) e Lênin (19 ), entre outros.
Uma
sociedade dividida em classes sociais também não pode ser considerada um “todo
estruturado de forma hierárquica”, pois ela se fundamenta não sob uma
hierarquia entre os seus aspectos componentes e sim na luta de classes. Por
conseguinte, nenhum desses pretensos “aspectos componentes” pode ser o seu
centro hierárquico.
Por
fim, a concepção dialética da totalidade não utiliza o procedimento positivista
de extrair um aspecto da totalidade (natural ou social) e erigi-lo como modelo ao qual a sociedade é
subsumida. A totalidade, segundo a concepção dialética, é concreta, pois, tal
como colocaram Marx e Engels, “estas abstrações, separadas da história real,
não possuem valor algum. Podem servir apenas para facilitar a ordenação do
material histórico, para indicar a seqüência de suas camadas singulares. Mas de
forma alguma dão, como a filosofia, uma receita ou um esquema onde as épocas
podem ser enquadradas”[38].
Observamos,
assim, que a dialética marxista possui a concepção de indivíduo e de totalidade
diferenciada do individualismo e do holismo, respectivamente. Mas resta saber
como o método dialético concebe, então, a relação indivíduo-sociedade? É disto
que iremos tratar a partir de agora.
Para
Marx, o indivíduo possui uma autonomia
relativa perante a sociedade.
Acontece que essa autonomia varia de acordo com o tipo de sociedade. Isto quer
dizer que não é possível transpor para a metodologia uma posição sobre o grau
de autonomia do indivíduo, pois este grau de autonomia não pode ser definido a priori mas somente a posteriori, ou seja, após a pesquisa.
Os
indivíduos, nas sociedades sem classes, não se encontram em contradição com a
sociedade. Isto é válido para todas as sociedades não-classistas mas com
proporções diferenciadas. Em sociedades não-classistas onde a dependência em
relação ao meio ambiente é grande (sociedades pré-históricas e indígenas), há
uma coerção sobre os indivíduos muito maior do que em sociedades não-classistas
mais avançadas, ou seja, numa hipotética sociedade pós-capitalista fundamentada
na autogestão social. Nesta última, podemos supor que não haverá nenhum tipo de
coerção. Uma sociedade condizente com a natureza humana marca a unidade entre
indivíduo e sociedade.
Para
a concepção dialética materialista, não se pode criar um método universal, seja
holista ou individualista, pois é a realidade que determina o método e não o
contrário. Por conseguinte, somente uma análise concreta de uma sociedade
concreta pode responder a questão da relação entre indivíduo e a sociedade. No
caso da sociedade capitalista, o indivíduo possui uma autonomia relativa muito
restrita. Isto quer dizer que para analisar esta sociedade, o ponto de vista
mais adequado é o holismo? Não, pois a concepção de totalidade do holismo
metodológico, tal como foi colocado anteriormente, é insatisfatória. Ao invés
de um todo homogêneo ou hierárquico, o que se vê, no capitalismo, é um todo
contraditório marcado pela antagonismo da luta de classes, ou seja, a
totalidade é a totalidade antagônica de classes sociais em luta. Isto quer
dizer que o método dialético rompe tanto com o individualismo quanto com o
holismo.
A
totalidade, segundo a concepção dialética, é composta pelas relações de classes
existentes, sendo que o elemento determinante se encontra nas duas classes
sociais fundamentais constituídas no modo de produção dominante, embora a
análise deva incluir também as demais classes sociais, tanto as produzidas nas
formas de regularização (“superestrutura”, tal como é o conjunto de
trabalhadores improdutivos) quanto as produzidas nos modos de produção
subordinados (no caso as sociedades em que eles existam, tal como no caso do
campesinato na sociedade capitalista).
O
indivíduo sofre, inicialmente, uma determinação de classe. Entretanto, um
indivíduo não se relaciona apenas com os demais indivíduos que pertencem à sua
classe mas também com os pertencentes a todas as outras classes. Neste sentido,
podemos falar em relação entre indivíduo e sociedade, compreendendo por esta o
conjunto das relações de classes existentes.
As
ações individuais possuem múltiplas determinações (a da natureza humana, a da
situação de classe, a da ação das demais classes sociais, a das demais divisões
sociais, tal como as divisões culturais, raciais, sexuais, determinadas pela
divisão de classe, etc.) e é devido a isto que existe uma autonomia relativa
dos indivíduos. A determinação fundamental, porém, é a determinação de classe.
A este respeito cumpre lembrar a possibilidade de dissonância entre o discurso
e a prática dos indivíduos, o que significa que o pertencimento a uma classe
produz práticas determinadas pelas relações de classes e uma dinâmica
contraditória no desenvolvimento da consciência de classe, no caso das classes
exploradas.
No
estudo da sociedade, do ponto de vista da dialética materialista, a focalização
teórica incide sobre as classes sociais. Estas não são as “unidades últimas” da
análise, mas é sua “unidade fundamental”, que pode ser enriquecida por uma
análise das ações individuais, embora estas últimas nunca sejam determinantes e
sim determinadas.
Outro
elemento de discordância entre marxismo e as concepções holistas e
individualistas se encontra no que se refere às condições de possibilidade do
saber. Tanto o holismo quanto o individualismo, ambos seguindo aqui, de forma
diferente, o postulado básico do positivismo, buscam garantir a “objetividade”
através da “neutralidade”, seja através da subsunção do sujeito ao objeto do
conhecimento (holismo), seja através da subsunção do objeto ao sujeito do
conhecimento (individualismo).
Para
o método dialético, ao contrário, existe uma unidade e uma inseparabilidade
entre ser e consciência e numa sociedade de classes existem classes que têm o
interesse em manter uma falsa consciência sobre a realidade e outras que têm
interesse em superá-la. Por conseguinte, o “sujeito do conhecimento” não pode
ser neutro e para conseguir atingir uma consciência correta da realidade é
preciso partir do ponto de vista da classe revolucionária em sua sociedade. No
capitalismo, esta classe é o proletariado. Isto significa, entre outras coisas,
que esta tarefa é facilitada para os indivíduos provenientes desta classe e
dificultada para os indivíduos oriundos de outras classes sociais.
De
qualquer forma, a grande diferença entre o marxismo, por um lado, e holismo e
individualismo, por outro, reside no fato do primeiro negar a possibilidade de
neutralidade enquanto que as demais abordagens a consideram possível. Outra
diferença é que o método dialético não só considera impossível a neutralidade
como não considera que os valores e sentimentos sejam necessariamente prejudiciais
ao desenvolvimento de uma consciência correta da realidade, tal como afirma o
positivismo expresso tanto na concepção individualista quanto holista. O que
interessa é quais são estes valores e sentimentos, ou seja, a interesse de que
classe social eles correspondem. Por conseguinte, a condição de possibilidade
do saber na sociedade contemporânea é, para o método dialético, partir do ponto
de vista do proletariado, e do ponto de vista positivista (tanto o holismo
quanto o individualismo) é a neutralidade.
Por
fim, esperamos ter contribuído para o reconhecimento das diferenças entre
marxismo e as abordagens holistas e individualistas no campo das ciências
sociais e do fato de que o marxismo não se confunde com estas abordagens e se
apresenta como uma alternativa a elas.
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*
Sociólogo, Mestre em Filosofia e Mestre em Sociologia; Doutorando em Sociologia
na UNB; Professor na Universidade Católica de Goiás e na Universidade Estadual
de Goiás.
[1]Veja:
Cohen, Percy. Teoria Social Moderna. 2a edição, Rio de Janeiro: Zahar, 1976.
[4]A
abordagem durkheimiana mais detalhada sobre as representações coletivas
encontra-se em: Durkheim, É. As Formas Elementares da Vida Religiosa.
São Paulo, Edições Paulinas, s/d; sobre educação: Durkheim, É. Educação
e Sociologia. 11a
edição, São Paulo, Melhoramentos, 1978.
[7]
“A saúde do espírito individual implica a participação na vida social, assim
como a recusa de a ela se prestar (mas ainda segundo modalidades que ela impõe)
corresponde ao aparecimento de perturbações mentais” (Lévi-Strauss, Claude. Introdução
à Obra de Marcel Mauss. In: Mauss,
M. ob. cit., p.19).
[8]Malinowski, Bronislaw. Argonautas do Pacífico Ocidental. In:
col. Os Pensadores. 2a
edição, São Paulo, Abril Cultural, 1978, p. 73.
[10]Radcliffe-Brown, A. R. Estrutura e Função nas Sociedades Primitivas.
Lisboa, Edições 70, 1989, p. 265.
[11]
“Comparando a fonologia e a antiga lingüística, Trubetzkoy define a primeira
como um ‘estruturalismo e um universalismo sistemático’, que opõe ao
individualismo e o ‘atomismo’ das escolas anteriores” (Lévi-Strauss, C. Antropologia
Estrutural. 2a edição, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro,
1970, p. 51).
[12]Cf.
Deschamps, Jean. Psicanálise e Estruturalismo. In: Ballet, René e outros. Estruturalismo e Marxismo. Rio de
Janeiro, Zahar, 1968; Lacan,
Jacques. Escritos. São Paulo,
Perspectiva, s/d.
[15]Cit. por: Anderson,
Perry. A Crise
da Crise do Marxismo. 3a edição, São Paulo, Brasiliense, 1987, p. 43.
Tal posição também foi expressa sobre outra forma: “não pretendemos mostrar
como os homens pensam os mitos mas como os mitos se pensam nos homens e à sua
revelia” (cit. por: Leach, Edmund.
As Idéias de Lévi-Strauss. 2a edição, São Paulo, Cultrix, s/d., p. 51).
Esta concepção “holista” e “anti-humanista” se espalhou pelas ciências humanas,
influenciando a psicanálise (Lacan), a filosofia (Foucault), o marxismo
(Althusser), a teoria da literatura (Barthes), etc.
[16]Foucault, M. As Palavras e as Coisas. 4a
edição, São Paulo, Martins Fontes, 1987. Para uma crítica da obra de Foucault,
veja-se: Viana, Nildo. Foucault: Filosofia ou Fetichismo? In:
Revista Teoria Crítica da Sociedade. Ano 1, No 1, Dezembro de 1994.
[17]Cf.
Smith, Adam. Investigação Sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações.
Col. Os Pensadores, 3a edição, São Paulo, Abril Cultural,
1984.
[18]Cf.
Hugon, Paul. História das Doutrinas Econômicas. 13a edição,
São Paulo, Atlas, 1976; Huberman,
Leo. História da Riqueza do Homem. 16a
edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1980.
[19]Latouche, Serge. Análise Econômica e Materialismo Histórico.
Rio de Janeiro, Zahar, 1977, p. 25.
[20]Simmel, Georg. O Problema da Sociologia. In: Moraes
Filho, E. (Org.). Simmel. São Paulo, Ática, 1983, p. 59.
[22]Cit. por: Cohn,
Gabriel. (Org.). Weber. 3a
edição, São Paulo, Ática, 1986, p. 25-26. Pode-se acrescentar aqui que “não
obstante, a ação humana é cognoscível, em certa medida, que mais não seja pelo
fato também de sermos humanos. Este é o primeiro passo da sociologia de Weber.
O segundo é a identificação da unidade básica do social - a que o próprio Weber
chamaria de ‘átomo’, uma palavra, que segundo creio, não tinha para ele o
significado contemporâneo de átomos como complexos de partículas mais
fundamentais e singularmente probabilísticas, mas traduzia, outrossim, a idéia
de irredutibilidade final, de minúscula e impenetrável essência. Essa unidade
atômica do social é a ação singular e deliberada do indivíduo, dirigida no
molde a afetar o comportamento de uma ou mais pessoas. (...). A sociedade é a
soma de atos sociais unitários mas, evidentemente, a sociedade não é o caos” (MacRae, Donald. As Idéias de Weber.
2a edição, São Paulo, Cultrix, 1985, p. 68).
[24]Cf.
Maffesoli, M. O Conhecimento Comum. São Paulo, Brasiliense, 1988.
[26]Cf.
Elster, Jon. Marx Hoje. Rio de
Janeiro, Paz e Terra, 1989; Wright,
Erik e outros. Reconstruindo o Marxismo.
Petrópolis, Vozes, 1993; para uma crítica, embora apresentando uma visão ao
nosso ver equivocada do marxismo: Weldes,
Jutta. Marxismo e Individualismo Metodológico: Uma Crítica. In: Revista
Presença. No 16, abril de 1991.
[31]
“Raras vezes a ação, especialmente a ação social, está exclusivamente orientada
por uma ou por outra destas modalidades. Tampouco essas formas de orientação
podem ser consideradas como uma classificação exaustiva, mas sim como tipos
conceituais puros, construído para os fins da pesquisa sociológica, com relação
aos quais a ação real se aproxima mais ou menos, ou, o que é mais freqüente,
composta por uma mescla” (Weber,
M. ob. cit., p. 418).
[32]Tragtenberg, Maurício. Burocracia e Ideologia. São Paulo,
Ática, 1985. Podemos dizer também que a racionalidade capitalista da qual Weber
tratou em A Ética Protestante e o
Espiríto do Capitalismo é orientada para fins “irracionais”, tal como o
ascetismo (Weber, Max. A Ética Protestante e o Espírito do
Capitalismo. 5a
edição, São Paulo, Pioneira, 1987).
[33]Esta
parte está baseada em: Marx, Karl.
O Capital. Vol. 1, 3a
edição, São Paulo, Nova Cultural, 1988; Marx,
Karl. Manuscritos Econômicos-Filosóficos.
In: Fromm, Erich. Conceito Marxista do Homem. 8a
edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1983; Marx,
Karl e Engels, Friedrich. A Ideologia Alemã (Feuerbach). 3a
edição, São Paulo, Ciências Humanas, 1982.
[34]Embora
possamos encontrar alguns apontamentos em Marx sobre a repressão da natureza
humana, tal aspecto foi desenvolvido principalmente pela psicanálise freudiana
e pelo chamado “freudo-marxismo” (cf. Freud,
Sigmund. O Futuro de Uma Ilusão. 2a
edição, Col. Os Pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1978; Fromm, E. Psicanálise da Sociedade Contemporânea. 8a
edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1976; Fromm,
E. Análise do Homem. 2a
edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1962; Schneider,
Michael. Neurose e Classes Sociais - Uma
Síntese Freudiano-Marxista. Rio de Janeiro, Zahar, 1977; Reich, Wilhelm. O Que é Consciência de Classe? Lisboa, Textos Exemplares, 1976; Andreani, T. Marxismo e Ciências do Homem. Lisboa, Rés, s/d).
[37]A
expressão “determinação fundamental”, utilizada por Hegel, apresenta aqui o
sentido de que é a determinação que fornece a razão de ser do fenômeno, ou
seja, é a determinação que é constituinte do fenômeno. Isto não quer dizer que
seja a única determinação, pois se assim o fosse não seria necessário o
qualificativo de “fundamental”. Tal como Hegel e Marx colocaram, o “concreto é
o resultado de suas múltiplas determinações”. Ocorre, porém, que as
determinações do concreto não possuem estatuto equivalente. Uma determinação
fundamental é tanto o que constitui o fenômeno quanto o que condiciona as
outras determinações. No caso da teoria marxista da sociedade, a determinação
fundamental (que é o modo de produção) é o que constitui a sociedade, ou seja,
a sociedade é a manifestação concreta e histórica de um determinado modo de
produção e esta manifestação significa que os elementos derivados dele
constituem um conjunto de fenômenos que o ultrapassa. Entretanto, isto não quer
dizer que o modo de produção não tenha existência real, que seja, como alguns
pretendem, que ele seja uma “abstração”, um “tipo ideal”. Isto significa
tão-somente que ele possui existência concreta e que para existir necessita
criar um conjunto de relações sociais complementares e é por isso que ele é sua
“determinação fundamental”.
Sobre isto veja, Viana (1997; 1998).
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