O Julgamento de Lula e
o Verdadeiro Significado da Política Institucional
Nildo Viana
O julgamento de Lula no dia de hoje serve para ilustrar o
verdadeiro significado da política institucional. Se Lula estivesse sendo
julgado pelo mensalão ou por outros motivos, que provavelmente não faltam,
seria algo juridicamente correto. No entanto, o motivo ser coisas como o tríplex
e outras coisas superficiais é de causar estranhamento. O estranhamento, no
entanto, só pode surgir a partir do desconhecimento do real significado da
política institucional.
Mas não se trata de golpe, como dizem os petistas. Não se
trata de ameaça à democracia, como repetem os partidários de Lula e seu
neopopulismo. Também não se trata de justiça ou combate à corrupção, como dizem
muitos antipetistas. Trata-se de um casuísmo[1].
Esse casuísmo é explicado pela dinâmica da política institucional. A política
institucional é burocrática e perpassada por competição partidária e que é
afetada pelos conflitos na sociedade civil, mas que é regida pela “lei do mais
forte”. A classe capitalista é a mais forte e sempre ganha, mesmo quando parece
perder. A burguesia ganhou com as vitórias petistas em quatro eleições e foi
somente quando os governos do PT passaram a se tornar problemas para a
continuidade do ritmo de acumulação de capital é que passou a ser alvo de
ataques poderosos (a oposição aos governos petistas eram fracas e sem
eficácia). Assim como o impeachment, o julgamento de Lula apenas mostra que a
política institucional é regida pela lei do mais forte.
Geralmente não acontece situações em que isso fica
explícito. Isso é algo extraordinário. Um conjunto de determinações permitiu
que isso ocorresse. A eleição de um governo neopopulista, que não pôde realizar
as políticas necessárias quando houve desaceleração da acumulação capitalista
(o chamado “crescimento econômico”) por causa de seu caráter, é uma dessas
determinações. O neopopulismo petista depende do processo eleitoral e por isso
não pôde efetivar mais amplamente políticas governamentais consideradas
impopulares. Mas também não pode deixar de fazer isso, mesmo que de forma um
pouco mais lenta, o que gerou sua ambiguidade e indecisão. Isto, aliado com sua
inoperância e agravamento dos problemas da acumulação capitalista (e suas
consequências, tais como desemprego, inflação, etc.), e reforçado pela falta de
competência e criatividade (o que se revelou claramente no governo Dilma), mostra
a impossibilidade de superação desse dilema[2].
Logo, a situação ficou insustentável e gerou o impeachment e a convicção na classe dominante de que o PT não pode
voltar ao governo, o que gera o julgamento de Lula.
Esses dois casuísmos (impeachment
e provável condenação de Lula) são apenas uma demonstração da lei do mais
forte. Não se trata de golpe e sim de uma prática política comum na democracia
burguesa e que já ocorreu com outros políticos e não houve nenhuma comoção de
parte da população. Esse foi o caso do impeachment
de Fernando Collor, outro casuísmo, que, aliás, foi apoiado pelos
pseudomoralistas do PT e “defensores da democracia”.
E aqui encontramos não só o verdadeiro significado da
política institucional, mas a desmoralização total da democracia burguesa e
também da esquerda brasileira. A desmoralização da democracia representativa
ocorre por tornar muito explícito o que era para ficar pouco perceptível e os
casuísmos explicitaram, apesar de toda tentativa de justificar e legitimar esse
processo pelos antipetistas. A desmoralização da esquerda ocorre por ela
denunciar o jogo e as regras do jogo do qual ela faz parte e que também, até
nas suas expressões mais extremistas, não hesita em apelar para outras formas
de casuísmo[3].
Nesse contexto, no qual a democracia burguesa e a esquerda
mostram que são uma farsa, é o momento de abandonar as polêmicas infindáveis
sobre quem governará para a classe dominante e lutar pelo desenvolvimento da
formação intelectual e organizações autárquicas (auto-organização) a partir de
um projeto autogestionário. Somente assim a farsa da democracia e os falsos
representantes dos trabalhadores serão superados e a autogestão social
concretizará o reino da liberdade.
[1]
Casuísmo é quando se cria um “caso de exceção” por oportunismo e nos demais
casos se mantém a regra, lei, etc.
[2]
Veja uma análise mais aprofundada sobre isso vários artigos nesse blog: https://informecritica.blogspot.com.br/2016/03/ascensao-e-queda-do-pt.html
; https://informecritica.blogspot.com.br/2015/12/a-luta-de-classes-no-brasil-2013-2015.html
;
[3]
Não deixa de ser patético a defesa do PCO – Partido da Causa Operária de abolir
a lei da “ficha limpa”, com o slogan “pelo direito da população escolher seus
próprios candidatos”, que, no caso, é um casuísmo de esquerda que poderia ser
melhor expresso com o slogan “pelo direito da população escolher seus próprios
corruptos” (veja: http://www.causaoperaria.org.br/blog/2018/01/23/abaixo-lei-da-ficha-limpa/
).
PARA A CLASSE DOMINANTE, NÃO INTERESSA QUE O PT SUCUMBE TOTALMENTE, POIS ESTE FAZ A POLÍTICA INSTITUCIONAL, OU SEJA : ABOLIU AS LUTAS DE CLASSES PELO BUROCRÁTICO PARLAMENTO.
ResponderExcluirOlá, Carlos Alberto! Como vai? Bom, para a classe dominante interessa que o PT seja destruído sim. Existem dois motivos pelos quais a classe capitalista pode atacar e buscar destruir uma organização: 1) quando ela é revolucionária (e, nesse caso, não é um partido político, já que os partidos são organizações burocráticas que não visam a revolução, mesmo quando faz este discurso) ou 2) quando prejudica o processo de reprodução ampliada do capital (acumulação capitalista). O PT se encontra nesse último caso, ele com o seu neopopulismo prejudica a burguesia ao atrapalhar a acumulação capitalista para conseguir ter vitórias eleitorais. O PT, por sua vez, nunca foi revolucionário e nunca defendeu a luta de classes como princípio básico, nem mesmo no período de seu surgimento, quanto tinha discurso mais radical e maior número de trabalhadores com espaço no partido (tirando as tendências, sempre minoritárias e sem força dentro do partido). Por isso ele não aboliu o discurso da luta de classes, simplesmente nunca o defendeu. O que ele mudou era o seu "público-alvo", os trabalhadores, por outros "públicos" e manteve sua política de organização burocrática e a tornou uma política de luta e manutenção do governo, abandonando qualquer ideia de defender os interesses dos trabalhadores. abs.
ExcluirEsclarecedor, como de costume, e um convite, óbvio, à reflexão. Abs, Nildo.
ResponderExcluirGrato, Leonardo! Que bom que gostou! abs.
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