APRESENTAÇÃO
Nildo Viana
A questão dos valores é um tema antigo mas marginal. Alguns pensadores desenvolveram análises sobre os valores, dando-lhes grande importância, embora, para muitos, não contivesse nenhuma relevância, o que, por si só, já demonstra diferenças de valores. Sociólogos, psicólogos e fi lósofos abordaram sob formas diferentes a questão dos valores. Abordaremos a questão dos valores numa perspectiva marxista, o que significa, entre outras coisas, que utilizaremos determinados valores como ponto de partida em nossa análise.
Vivemos num mundo valorativo, que é o mundo humano, e somente numa fantasiosa ideologia da neutralidade científica ou autonomia da arte é que se poderia pensar em estar "livre de valores". O ser humano é um ser valorativo. Esta é uma das teses que trabalharemos aqui. Mas, além desta tese, há a idéia complementar que os valores não são igualmente válidos. Não cedemos, em nenhum momento, ao canto de sereia do relativismo, um produto ideológico que surge de acordo com determinados interesses e valores. Existem valores universais e valores particularistas, valores autênticos e inautênticos. Logo, os valores não são equivalentes e por isso podemos e devemos optar por determinados valores em detrimento de outros. Os valores dominantes são justamente os particularistas e inautênticos, pois eles são os valores da classe dominante e/ou de suas classes auxiliares. Estes formam a axiologia e o seu par antagônico é a axionomia, conceitos que iremos desenvolver no presente livro.
O mundo em que vivemos é um mundo axiológico, conclusão lógica do que foi dito anteriormente, mas existe, marginalmente, um mundo axionômico. Este mundo axiológico se manifesta em todas as esferas da vida social, no âmbito da ciência, da arte, da política, do cotidiano, dos objetos de uso pessoal, de utensílios domésticos. Ele domina amplamente e por isso cria uma cultura asfixiante. Os valores são constituídos socialmente. A axiologia é formada socialmente. O mesmo vale para a axionomia. Na constituição dos valores intervém a consciência. Muitos conflitos de valores em determinados indivíduos são derivados da falta de percepção das raízes dos seus valores, do seu significado e de sua importância social. Os valores autênticos e universais são marginais, mas existem. Os valores dominantes, porém, são fetichistas, inumanos e desumanos. O indivíduo, ao adquirir consciência disso, poderá avançar e superar os seus valores inautênticos e particularistas. Assim, a consciência tem um papel importante na constituição de um mundo axionômico em oposição ao mundo axiológico dominante. O presente livro se insere numa tentativa de fortalecer a axionomia contra a axiologia. É isto que o justifica.
Seguimos o seguinte trajeto: iniciamos com a necessária definição do conceito de valores (capítulo 01) e dos conceitos de axiologia e axionomia (capítulo 02), para depois trabalharmos a relação entre valores, sentimentos e consciência (capítulo 03) e a formação social dos valores (capítulo 04). Após isto, começamos a analisar as manifestações da axiologia na sociedade moderna, principalmente na esfera da ciência e da técnica (capítulo 05), da arte, do brinquedo e dos objetos (capítulo 06), para discutir a categoria de qualidade e sua relação com os valores (capítulo 07), tomando a idéia de qualidade no âmbito das obras artísticas como principal parâmetro e concluímos com uma breve discussão sobre valores e hegemonia (capítulo 08). Este trajeto, por mais insufi ciente que seja, fornece uma visão geral da questão dos valores na sociedade moderna e aponta para o reconhecimento do caráter dominante da axiologia e da urgência do despertar da axionomia, cumprindo o seu papel e objetivo, mesmo que de forma breve.
VIANA, Nildo. Os Valores na Sociedade Moderna. Brasília, Thesaurus, 2007.
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