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sexta-feira, 16 de junho de 2017

LULA OU BOLSONARO? A PESQUISA ELEITORAL E A ILUSÃO DA OPINIÃO


LULA OU BOLSONARO?
A PESQUISA ELEITORAL E A ILUSÃO DA OPINIÃO

Nildo Viana

O resultado da pesquisa eleitoral realizada pelo Instituto Paraná Pesquisas/RecordTV Goiás, pode ser, para muitos, surpreendente. Porém, é preciso compreender alguns aspectos da pesquisa eleitoral para entender o seu significado. Assim, vamos iniciar com uma discussão sobre pesquisa eleitoral e depois analisar o resultado dessa pesquisa, que apontou um empate técnico entre Lula e Bolsonaro na preferência do eleitorado goiano.

As pesquisas eleitorais são pesquisas de opinião. Isso traz um problema para tais pesquisas, pois opiniões não são convicções[1]. As opiniões são momentâneas, volúveis. As convicções são mais arraigadas e mudam com muito mais dificuldade. As preferências eleitorais são, em sua maioria, opiniões e, portanto, facilmente alteradas. Isso altera com o tempo. No contexto atual, o índice de eleitores que manifestam suas opiniões (em comparação com as convicções) é bem maior do que quando estivermos diante da disputa eleitoral, pois agora reina falta de informações, não começou a propaganda política (o que tende a alterar a imagem dos candidatos, os desconhecidos ficam um pouco mais conhecidos, os que estão na frente passam a ser mais criticados e atacados, etc.), entre outras questões.

Por isso, o resultado da pesquisa em questão é bastante superficial e dificilmente será o que veremos nas eleições do ano que vem, inclusive devido ao quadro caótico da política e sociedade brasileira atuais, o que torna o eleitorado ainda mais vulnerável para mudanças drásticas de opinião. O resultado da pesquisa aponta para três aspectos que chamam a atenção: os primeiros colocados, Lula e Bolsonaro, mais ainda o segundo e por sua posição de quase empate com o primeiro; os índices de votos de Lula junto à população de idade mais avançada, especialmente acima de 60 anos e o índice de Bolsonaro diante dos eleitores mais jovens; o alto índice de futuros eleitores que não votam em nenhum dos candidatos listados.


Os primeiros colocados na pesquisa são Lula e Bolsonaro. Essa é uma tendência nacional. Porém, uma tendência do momento e, além disso, numa situação política e social caótica que caracteriza a sociedade brasileira na atualidade. Com o desenvolvimento do processo social e político, incluindo o início das campanhas eleitorais, a tendência é ambos os candidatos perderem votos, pois na competição eleitoral, informações e denúncias, entre outros processos (além do surgimento e fortalecimento de outros candidatos), tendem a atingir especialmente estes dois candidatos.


A razão para isso é a oposição que a candidatura Lula teria para os setores que articularam o impeachment de Dilma Roussef, que aglutina não apenas diversos partidos, mas também setores da sociedade e poderosas instituições e organizações empresariais. A ala mais conservadora do bloco dominante[2] não somente evitará aliança com o PT (Partido dos Trabalhadores), tal como aconteceu no passado e permitiu a ascensão desse partido à burocracia governamental (Partido Liberal, Rede Globo, etc.), como agora tende a tentar evitar sua volta ao governo usando todos os recursos para isso. A campanha contra Lula tende a ser impiedosa e poderosa, do ponto de vista financeiro.

Além disso, Lula tem ampla rejeição de vários outros setores da sociedade, por outros motivos. Diversos setores da juventude e certos grupos e intelectuais, rejeitam Lula por causa de seus governos anteriores e não ter efetivado uma política voltada para mudanças sociais mais amplas. Outro setor que rejeita Lula é o daqueles que priorizam as questões morais, sendo que o vínculo do Partido dos Trabalhadores com certas políticas e discursos, como “gênero”, “homossexualidade”, “corrupção”, etc., tendem a criar forte rejeição nos meios populares.

Por outro lado, ele tem eleitores fiéis, como os petistas e simpatizantes, além de outros setores da esquerda, da burocracia e intelectualidade, bem como setores de movimentos sociais que foram cooptados pelos governos petistas.  No entanto, o peso eleitoral desses setores é bem pequeno e as eleições municipais de 2016 demonstraram isso.

A tendência, nesse contexto, é a de que Lula perca terreno durante a campanha eleitoral e sua posição atual seja explicada pelos elementos citados acima. O caso de Bolsonaro é diferente. Os seus índices eleitorais são mais surpreendentes. No entanto, também não é um candidato forte e está sendo beneficiado pela conjuntura e falta de outros candidatos mais expressivos. Bolsonaro tem setores da sociedade que são fiéis e manterão o voto, mas no conjunto, é percentualmente muito pequeno. O início da campanha deve gerar um candidato mais adequado para unir o bloco dominante e seus setores antipetistas. Muitos destes setores não gostam e não confiam em Bolsonaro. Seria muito difícil ele conseguir ser um segundo Collor. Isso só ocorreria se ele e Lula disputassem o segundo turno, sendo o candidato preferido do bloco dominante nesse contexto.

O início da campanha deve mostrar uma rejeição maior em relação ao atual deputado do PSC (Partido Social Cristão), da mesma forma que no caso de Lula. O seu alto grau de rejeição convive, ainda, com um partido pouco expressivo e sem grande estrutura e quadros políticos e recursos financeiros, o que significa que uma vez iniciada a campanha eleitoral tende a ficar atrás no processo de propaganda eleitoral generalizada.

Assim, é possível perceber, pela pesquisa, que a maioria dos eleitores de Lula são de escolaridade inferior e acima de 60 anos, o que nos aponta para a hipótese de que sua força está mais, além de suas bases próprias, nos setores mais empobrecidos da população e mais velhos, nos quais a relativa “melhoria” durante os dois governos de Lula seja motivação para votar nele novamente. Sem dúvida, é um setor da população que vincula a estabilidade política e financeira relativa existente nos dois mandatos de Lula com o indivíduo que ocupou a presidência, desconsiderando as bases criadas pelos governos anteriores e desconhecendo a dinâmica da acumulação de capital que permitiu um período de aceleramento da acumulação.

No entanto, entre a juventude, a sua popularidade é baixa, tanto em relação aos votos mais conservadores que estão migrando para Bolsonaro e outros, quanto os setores mais descontentes, que migram para o voto nulo e abstenção (o que pode ser deduzido da opinião de não votar em nenhum dos sete candidatos apontados pela pesquisa)[3]. Os votos de Bolsonaro junto à juventude é especialmente em relação a certos setores dessa, majoritariamente os homens. Aqui temos outra divisão: Lula tem mais votos femininos e Bolsonaro mais votos masculinos. Bolsonaro tem uma grande rejeição entre as mulheres, por razões óbvias (seu discurso sexista, por exemplo). No entanto, o quadro eleitoral geral, a partir da pesquisa, mostra que Lula tem mais votos em certos setores da sociedade, mas mesmo nesse caso está longe de ser unanimidade, não consegue chegar nem a um terço. O caso de Bolsonaro é um pouco inferior. O fato de Bolsonaro ter conseguido ficar em segundo lugar e com uma votação expressiva é explicado pela distância do processo eleitoral, pela falta de opções e informações, bem como pela rejeição de Lula que em grande parte vai migrar para o segundo lugar ou para o seu antagonista no plano moral.

No entanto, a disputa eleitoral pode avançar num sentido no qual nenhum dos dois candidatos melhor posicionados chegue ao segundo turno, tanto pela rejeição e problemas de ambos, que serão exaustivamente explorados na campanha eleitoral, quanto pela situação conturbada que vive o país. No caso de Bolsonaro, outro elemento é a fragilidade de sua sigla partidária e no caso de Lula há o elemento adicional do enfraquecimento drástico do PT.


Um terceiro elemento que chama atenção na pesquisa é o número elevado de pessoas que afirmam não votar em nenhum dos sete candidatos listados (15%) e um percentual razoável de “indecisos” (5%). Os eleitores que não votam em ninguém ficam em terceiro lugar na pesquisa. Isso significa, que mesmo numa pesquisa estimulada e que busca avaliar opinião (e não convicção) eleitoral, o índice de recusa de todos os setes candidatos é alto e o número de indecisos é razoável e dentro do esperado. Esse processo tende a fortalecer o número de votos nulos, votos brancos e abstenções.


Por outro lado, essas informações mostram que parte da população rejeita todos os candidatos e que a força de Bolsonaro entre a juventude é pequena, embora significativa eleitoralmente, mas que tende a diminuir. Da mesma forma, os que não votam em ninguém mostram os descontentes e que eles se concentram nos setores mais empobrecidos e nos setores mais intelectualizados, sendo que o índice menor de recusa se encontra nos setores intermediários, tanto no plano da renda quanto da educação. Isso significa que os dois setores em que Lula teria mais força, há um maior número de descontentes. E isso tende a aumentar com a campanha eleitoral. Ou seja, além do número significativo de eleitores que rejeitam todos os candidatos, há uma tendência para eles aumentarem e enfraquecerem justamente os dois primeiros colocados na pesquisa.

Em síntese, a pesquisa mostra um momento de predominância de determinadas opiniões eleitorais que tende a se alterar com o desenvolvimento da campanha eleitoral e da situação do país. Esse momento não deve iludir as pessoas pensando que teremos um segundo turno com Lula e Bolsonaro. Os candidatos que estarão no segundo turno são ainda imprevisíveis e uma das possibilidades é que nenhum dos dois que hoje ficam nos primeiros lugares das pesquisas eleitorais chegue ao segundo turno.





[1] Sobre isso, cf. VIANA, Nildo. A Pesquisa em Representações Cotidianas. Lisboa: Chiado, 2016; VIANA, Nildo. Representações Cotidianas e Correntes de Opinião. Revista Espaço Livre. Vol. 10, num. 19, 2015. Disponível em: http://redelp.net/revistas/index.php/rel/article/view/293/227

[2] Para compreender os blocos sociais, cf. VIANA, Nildo. Blocos Sociais e Luta de Classes. Revista Enfrentamento, ano 10, N. 17, jan/jun. 2015. Disponível em: http://enfrentamento.net/enf17.pdf e em: http://informecritica.blogspot.com.br/2016/03/blocos-sociais-e-luta-de-classes.html

[3] Os sete candidatos que aparecem na pesquisa são: Lula, Bolsonaro, João Dória/Geraldo Alckmin, Marina Silva, Ciro Gomes, Joaquim Barbosa, Álvaro Dias. A pesquisa apresentou duas possibilidades de candidatura do PSDB, João Dória e Geraldo Alckmin e a mudança de candidato não altera significativamente o quadro eleitoral.

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