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sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

O Capitalismo está em Crise?

O CAPITALISMO ESTÁ EM CRISE?
      
Nildo Viana

Professor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás; Doutor em Sociologia; Autor de diversos livros, entre os quais, O Capitalismo na Era da Acumulação Integral.

Revista Posição, 3, Ano 1, Vol. 1, num. 2, jul./set.  2014. 

O capitalismo está em crise? Essa é uma velha questão, pois desde que alguns intérpretes do pensamento de Karl Marx pensaram no processo social revolucionário e no desenvolvimento do capitalismo, sempre anunciaram a crise do capitalismo. Isso só é comparável em repetição com a chamada “crise do marxismo” (VIANA, 2008). No entanto, para entender se há mesmo uma crise do capitalismo, é necessário esclarecer o significado do termo crise e uma análise do capitalismo contemporâneo para ver se é possível tal entendimento. É o que faremos a seguir.

O termo crise já foi discutido e definido por diversas concepções. Os gramscianos reproduzem a ideia de Gramsci, segundo a qual a crise ocorre quando o velho está em decadência e o novo ainda não pode surgir. Uma concepção extremamente abstrata e que nada acrescenta para a compreensão do termo. A crise é um processo no qual um ser encontra dificuldades crescentes para realizar sua reprodução (VIANA, 2008), ou, mais exatamente, quando ocorre um momento em que se manifesta uma dificuldade radical para sua reprodução ou existência. Nesse sentido, a categoria crise remete ao momento em que se torna possível o fim de algo, quando sua reprodução é ameaçada e se for levada até ao fim, significa sua superação. Crise é uma categoria do pensamento e por isso não é exatamente um conceito (VIANA, 2007), pois é uma ferramenta intelectual para pensar a realidade, embora não exista em si mesma. Por isso, a crise é sempre de alguma coisa.  No caso do presente artigo, nos interessa a ideia de crise do capitalismo. Por isso é importante entender também o que é o capitalismo.

O capitalismo é um termo que pode expressar o modo de produção capitalista ou a sociedade capitalista. No primeiro caso, o termo remete ao modo de produção dominante na sociedade moderna, caracterizado pela produção de mais-valor, a forma de exploração específica dessa sociedade. No segundo caso, significa a sociedade na qual o modo de produção dominante é o capitalista, ou seja, o todo da sociedade moderna engendrado por esse modo de produção. Quando se aborda a crise do capitalismo se pensa geralmente nesses dois elementos, mas geralmente uma crise da sociedade moderna em conjunto, o que pressupõe a crise do modo de produção capitalista. O que significaria uma crise do capitalismo? Significaria que a sociedade capitalista passaria por um momento no qual sua existência estaria ameaçada, havendo o risco/possibilidade/tendência de sua superação.

A partir destes esclarecimentos podemos perguntar: o capitalismo está em crise? A pseudoesquerda partidária sempre lança a ideia de que o capitalismo está em crise. No entanto, o capitalismo é uma sociedade marcada por lutas de classes e diversas contradições derivadas, que possui como elemento fundamental a existência de inúmeros problemas sociais (fome, desemprego, disputas políticas, etc.). Uma crise do capitalismo significaria, no fundo, que as relações de produção capitalistas, que são o elemento definidor e fundamental do modo de produção capitalista, estariam com sua existência ameaçada. Ora, como a existência do modo de produção capitalista poderia ser ameaçada? Como tal modo de produção se caracteriza pela produção de mais-valor e esta é a relação estabelecida entre proletariado e burguesia, então temos que entender que uma crise dele significaria que tal relação estaria ameaçada, o que, por sua vez, ameaçaria a existência da sociedade capitalista como um todo. E como uma relação social, que é a existente na produção de mais-valor entre proletariado e burguesia, pode ser ameaçada? Ora, quando uma das duas classes que estão envolvidas nessa relação ameaça romper com ela. Ou seja, uma crise do modo de produção capitalista e, logo, da sociedade capitalista, só pode ocorrer se o proletariado ameaçar romper com tal relação.

Logo, não há nenhum motivo para se pensar em uma crise do capitalismo na atualidade. O proletariado, apesar de algumas greves, ações e manifestações em determinados países e situações, não está questionando as relações de produção capitalistas na atualidade. Isso ocorreu no caso argentino, no período de 1999-2002, durante a Revolução Russa de 1917, durante a Comuna de Paris, a Guerra Civil Espanhola, entre diversas outras experiências históricas. Nesse caso, uma crise do capitalismo só ocorre quando o proletariado passa de classe determinada pelo capital para classe autodeterminada (VIANA, 2012), ou seja, quando ao invés de reproduzir o capitalismo através de lutas cotidianas e reivindicativas, como salários e melhores condições de trabalho, passa a questionar a relação-capital, ou seja, as relações de produção capitalistas.

Obviamente que existem outras crises no capitalismo. Contudo, é preciso distinguir “crise do capitalismo” de “crise no capitalismo”. As crises no capitalismo ocorrem cotidianamente. As crises no capitalismo não são crises do modo de produção capitalista ou do conjunto da sociedade capitalista, mas de partes no seu interior. Esse é o caso da crise financeira de 2008, que foi uma crise localizada no âmbito do aparato financeiro. Da mesma forma, há crises de governos, de legitimidade, entre diversas outras possibilidades de crises no capitalismo.

Essas crises no capitalismo podem, e em alguns casos tendem, a gerar uma crise do capitalismo. A crise do regime de acumulação conjugado (também chamado “fordista” ou “intensivo-extensivo”) quase se tornou uma crise do capitalismo, principalmente no caso francês, bem como, em menor grau, na Itália, Alemanha e outros países e conviveu com outras crises em outros países. A ascensão das lutas operárias e estudantis num quadro de queda da taxa de lucro provocou esse processo.

No capitalismo contemporâneo, comandado pelo regime de acumulação integral, as relações sociais são modificadas no sentido de aumentar a pobreza, desemprego, precarização do trabalho, problemas sociais em geral, bem como violência, criminalidade, e, ainda, protestos, revoltas, lutas sociais mais radicalizadas. É nesse contexto que explodem diversas crises no capitalismo que tendem a se tornar uma crise do regime de acumulação integral. Essa, por sua vez, tende a possibilitar a crise do capitalismo. Uma crise do regime de acumulação integral, e todo regime de acumulação tem um período de nascimento, desenvolvimento e declínio, devido à própria dinâmica da acumulação capitalista, vinculada à tendência declinante da taxa de lucro, e aumento das lutas operárias e de outras classes e grupos no interior do capitalismo, tende a se tornar uma crise do capitalismo. Nesses momentos, o proletariado tende a ser constrangido a ir além das reinvindicações cotidianas e promover lutas mais radicalizadas e em muitos casos questionar as relações de produção capitalistas. É nesse momento que pode surgir uma crise do capitalismo. Para tanto, as crises no capitalismo, tal como a crise financeira de 2008 e suas consequências, que aceleraram as dificuldades de reprodução do regime de acumulação integral, já entrando em sua fase de declínio, e outras crises, como a crise de legitimidade da democracia burguesa no Brasil, aumentam a possibilidade e tendência de se transformar em crise do capitalismo.

Contudo, isso ainda não ocorreu. Mas é uma tendência, não só nos países capitalistas em que o regime de acumulação integral está com dificuldades crescentes, especialmente os que tiveram que adotar políticas de austeridade, como em casos mais específicos marcados por outras crises, incluindo o caso da sociedade brasileira, apesar das diferenças e força de cada caso.

Em síntese, a resposta à questão apresentado no título deste artigo, é a de que não há, atualmente uma crise do capitalismo. Existem crises no capitalismo e a tendência, cada vez mais forte, para que se instaure uma crise do regime de acumulação integral, que, por sua vez, abre perspectivas para uma crise do capitalismo, o que significaria o ressurgimento de um forte movimento operário revolucionário que colocaria a autogestão social como algo a ser pensado e que ficaria na ordem do dia. Dessa forma, é necessário superar a mania da pseudoesquerda de anunciar eternamente a crise do capitalismo, bem como estar atento para as tendências e possibilidades de desenvolvimento da sociedade capitalista, inclusive sua dinâmica de acumulação e potencial transformador existente nas classes exploradas e grupos oprimidos.

No fundo, é preciso entender que as lutas atuais são determinações das lutas futuras e por isso o que acontecerá depende não de algo metafísico ou natural e sim das relações sociais presentes (tal como a dinâmica da acumulação capitalista) e das lutas sociais travadas nesse contexto, reforçando uma ou outra tendência. Quanto mais os trabalhadores se organizam hoje, realizam greves, manifestações, mais reforçam a tendência da emancipação humana, pois não só faz avançar as lutas sociais, a passagem de classe determinada pelo capital para classe autodeterminada, como também cria novas dificuldades de reprodução do capitalismo, pois traz novos obstáculos para a ampliação da exploração, da extração de mais-valor, o que atinge, novamente, a acumulação capitalista e o regime de acumulação integral.

Assim, não vivemos uma crise do capitalismo e sim convivemos com diversas crises no capitalismo, e essa pode gerar aquela. E nesse contexto, nossas ações no presente vão reforçar uma ou outra coisa, bem como a resolução da crise, que poderá ser um novo regime de acumulação que aumentaria mais ainda a exploração e pioraria as condições de vida, ou o fascismo e a guerra, que seriam resultados indesejáveis, ou a autogestão social, a emancipação humana.

REFERÊNCIAS

VIANA, Nildo. A Consciência da História – Ensaios Sobre o Materialismo Histórico-Dialético. 2ª edição, Rio de Janeiro: Achiamé, 2007.

VIANA, Nildo. A Teoria das Classes Sociais em Karl Marx. Florianópolis: Bookess, 2012.

VIANA, Nildo. O Capitalismo na Era da Acumulação Integral. São Paulo: Ideias e Letras, 2009.

VIANA, Nildo. O Fim do Marxismo e outros ensaios. São Paulo: Giz Editorial, 2008.


quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

IGNORÂNCIA, SUBMISSÃO E PRESUNÇÃO


IGNORÂNCIA, SUBMISSÃO E PRESUNÇÃO


Nildo Viana

Professor da Universidade Federal de Goiás e Doutor em Sociologia/UnB.

Artigo publicado originalmente em: Revista Posição. Ano 01, vol. 01, num. 02, abr./jun. de 2014.

A ignorância é uma palavra ambígua. Em certos casos, ela significa falta de saber, ignorar algo; em outros, significa “grosseria” ou desconsideração pela opinião alheia. O problema é que as palavras são geralmente descontextualizadas e retiradas da realidade social na qual se constituíram e ganham significado. Para compreender o real significado da ignorância é necessário analisar o seu significado, o que remete para outras questões, como sua inserção na totalidade da vida social, suas determinações e suas consequências.

A ignorância no sentido de “ignorar algo” ou “falta de consciência ou saber” sobre alguma coisa é extremamente comum. Nesse sentido, somos todos ignorantes, pois ninguém sabe tudo, por mais culto, erudito ou experiente que seja. E por isso não é nada ofensivo ou pejorativo considerar que alguém ignora algo. No entanto, existe uma diferença de grau. Alguns indivíduos ignoram muitas coisas e outros menos. Além dessa diferença quantitativa, há também a qualitativa: alguns ignoram coisas importantes e outros ignoram coisas supérfluas. Outra diferença é afirmar que alguém ignora algo, outra é dizer que ela é ignorante, pois no primeiro caso é um caso específico e no segundo é algo apresentado como sendo algo que caracteriza o indivíduo, a ignorância seria generalizada. Aqui estamos no reino das classificações mais abstratas, mas se inserirmos esta discussão no interior da vida social, podemos entender melhor o problema envolvido.

Ao levar a discussão para o contexto da sociedade, começamos a perceber que o sentido não pejorativo da palavra é muito pouco usado, tal como alguém que afirma que outra pessoa “ignorou o seu aviso”, pois remete a algo bem específico, nada tendo de ofensivo. O uso mais comum é quando se afirma que alguém é ignorante, ou seja, que ignora muita coisa ou as coisas mais importantes. Obviamente que esse tipo de afirmação não é necessariamente verdadeiro, pois numa sociedade fundada na competição social, a desqualificação do outro e seu discurso é algo comum, e sendo o outro ignorante, então há uma valoração daquele que faz tal afirmação, um sinal de distinção e superioridade.

No entanto, as pessoas consideradas na sociedade como mais ignorantes são justamente as pessoas das classes desprivilegiadas, e mais ainda seus estratos mais empobrecidos. Elas ignorariam uma maior quantidade de coisas e as mais importantes. Sem dúvida, isso não é totalmente falso, embora a generalização seja problemática, pois muitos indivíduos das classes privilegiadas também ignoram muitas coisas e a questão do que é ou não importante é valorativa, geralmente remetendo para os valores dominantes. Algumas pesquisas apontam para uma diferença entre um pesquisador médio, que possui um vocábulo em torno de duas mil palavras, enquanto as demais pessoas teriam um vocabulário de cerca de duzentas palavras. Por conseguinte, podemos afirmar que há uma tendência (logo, não é algo geral, inevitável, etc., não sendo generalização nem determinismo) de que as pessoas das classes desprivilegiadas possuam um vocabulário menor que as das classes privilegiadas (e no interior destas há também uma tendência à hierarquia, sendo que os intelectuais, devido sua profissão e atividades cotidianas, tenham um vocabulário mais extenso do que outras classes).

A questão qualitativa já é mais difícil de ser abordada, pois ela remete aos valores dos indivíduos. Um pescador pode ignorar as tendências do mercado financeiro e do processo inflacionário, as políticas governamentais, o significado do capitalismo, a existência das classes sociais ou entender praticamente nada de arte, ciência e política institucional. Se ele ignora tudo isso, ao mesmo tempo ele tem um saber acumulado sobre pescaria, suas técnicas, localização mais adequada, e diversos outros aspectos envolvidos, bem como sobre sua tradição familiar, sobre sua vida cotidiana, entre inúmeras outras coisas. A sua ignorância é relativa, assim como o seu saber. E para os seus próprios valores, ele certamente irá considerar que ignora coisas sem importância e possui consciência das coisas que são relevantes. Sem dúvida, a pescaria é o seu meio de sobrevivência, e, portanto, é importante para ele. Contudo, não saber da inflação, das políticas governamentais, das relações entre as classes sociais, que afetam diretamente seus rendimentos e situação social, entre outras coisas relacionadas com a sua sobrevivência, demonstra que os seus valores são constituídos socialmente e que sua percepção do que é mais valoroso para ele é obstaculizado por sua consciência restrita da totalidade da vida social. Uma vez que ele não tenha consciência disso, sua ação e o desenvolvimento de sua consciência ficarão na dependência de outras pessoas e influências (meios oligopolistas de comunicação, intelectuais, pessoas de destaque do seu próprio meio, etc.). Nesse sentido, podemos dizer que a ignorância é mãe da submissão. Quanto mais ignorante for um indivíduo, maior é a tendência de ser submisso.

Contudo, a ignorância não atinge apenas indivíduos das classes desprivilegiadas. Muitos indivíduos das classes privilegiadas também possuem um alto grau de ignorância, seja em matéria de quantidade e/ou de qualidade. Um artista, por exemplo, pode ter um grande saber sobre técnicas artísticas e história da arte, assim como o pescador sabe da pescaria, mas pode entender muito pouco de política e questões sociais. É por isso que muitos artistas bem intencionados buscam fazer crítica social, mas ficam num nível elevado de superficialidade e não ultrapassam o moralismo. Além disso, o modo de vida fútil e os valores dominantes são aliados poderosos da ignorância de amplos setores das classes privilegiadas. Aliado a isso a preguiça[1] de diversas pessoas, temos um quadro no qual a ignorância não é um atributo de classe, pois se espalha por toda a sociedade, mesmo para aqueles que possuem recursos para superá-la, mas preferem comprar coisas inúteis e supérfluas, ou mesmo com certa utilidade (como uma lanterna que raramente será utilizada), do que um livro, ou então comprar uma revista de fofocas sobre a vida de artistas do que comprar uma obra literária.

A ignorância possui inúmeras determinações, desde os recursos financeiros, acesso à educação formal, cultura de origem, passando por valores e interesses, que estão intimamente relacionados com a totalidade da sociedade, o pertencimento de classe, a ação do Estado e dos meios oligopolistas de comunicação e do mercado, entre diversos outras. A sua principal consequência já foi colocada: a submissão. Obviamente que com variações e sofrendo outras determinações, ela é uma fiel acompanhante da ignorância.

No entanto, a ignorância é entendida também em outro sentido. O segundo sentido da palavra remete à questão da “grosseria” ou desconsideração ou desrespeito pelas posições e opiniões alheias. Não é possível pensar a ignorância como apenas grosseria. Nesse caso seria mera e pura grosseria. Quando se pensa a ignorância desta forma, ela tem um sentido bem próximo ao de desrespeito e desconsideração pelas ideias alheias. Isso é também relativamente comum. Muitas pessoas descartam, menosprezam, ridicularizam e zombam de ideias, opiniões, afirmações, de outros. Claro que aqui também atua a competição social, algo estrutural da sociedade capitalista, bem como a busca de vencê-la, colocando-se como superior, mais culto, distinto. Na verdade, isso é algo que não deve ser confundido com o caso no qual em um debate entre duas pessoas e um realmente possui maior saber sobre o assunto em questão e o outro demonstra ter menos saber, pois aí não há ignorância e sim grosseria, indelicadeza, etc., a não ser que provocado pela ignorância do oponente. Ou seja, aqui, nesse caso, a ignorância pode emergir apenas do lado daquele que sabe menos, pois este é o seu elemento definidor. O ignorante, nesse sentido, pensa saber mais do que os outros apesar de não ter realizado estudos, reflexões, pesquisas, para desenvolver sua consciência. Ele apenas nega e recusa o que o outro tem a dizer, mas não mostra saber realmente do assunto. É como uma pessoa que ao ouvir dizer que Descartes foi um grande filósofo, sem conhecer sua obra e ideias, simplesmente diz que ele é “idiota” ou qualquer outro adjetivo pejorativo. É comum, para tais pessoas, fazerem afirmações sobre coisas que desconhecem como se fosse verdade e querendo desqualificar opiniões e posições contrárias, apelando para agressividade, retórica, desqualificação. Também é constante recusar ideias e afirmações sem ter nenhuma informação ou consciência do que está em discussão. Isso caracteriza uma das características presentes nas pessoas que fazem isso, a presunção. Isso significa que a pessoa considera suas suposições não fundamentadas e sobre coisas que pouco conhece como superiores a ponto de desconsiderar ou descartar as demais posições e opiniões. Nesse sentido, a ignorância é mãe da presunção.

Essa forma de ignorância, associada à presunção, é gerada mais por pessoas que se apegam a tradições e doutrinas, gerando dogmatismos, ou por pessoas com uma formação psíquica que promove a presunção como mecanismo de defesa. Como fenômeno coletivo, é mais comum em grupos ligados a certas religiões, doutrinas políticas, geralmente atingindo as classes desprivilegiadas e determinados setores das classes privilegiadas. Também é constante com pessoas com preguiça mental, que buscam respostas imediatas e se apegam a elas quando as conseguem, por mais superficiais e pouco fundamentadas que sejam.

As consequências desse tipo de ignorância são conflitos e debates, desentendimentos desnecessários, quando são casos mais individuais, e, quando assume formas coletivas, o dogmatismo que gera intolerância política, religiosa, etc. e conflitos coletivos entre indivíduos e grupos. A formação de seitas e a proliferação do dogmatismo (e do anti-intelectualismo) são bastante comuns em grupos, formais ou não, que se aliam com esse processo. No plano individual significa não haver avanço intelectual e desenvolvimento da consciência e no plano coletivo significa uma lentidão no avanço das lutas sociais ou seu bloqueio em determinados setores.

Em síntese, a ignorância, seja ligada à submissão seja ligada à presunção, é sempre prejudicial para o projeto de emancipação humana e para o desenvolvimento da consciência, bem como elemento de estagnação intelectual dos indivíduos. A ignorância nunca foi aliada do processo de transformação social ou mesmo individual. Por conseguinte, a superação da ignorância deveria ser compromisso de todos. A luta contra a ignorância, a própria e a alheia, é fundamental para todos que lutam pela transformação social.

http://redelp.net/revistas/index.php/rpo/article/view/3viana2/49



[1] Aqui a palavra preguiça não tem a conotação falsa de ser algo inato e/ou inexplicável, significa tão somente falta ou pouca vontade, sendo um produto social e ligado ao problema fundamental da alienação na sociedade capitalista.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

MENTIRA E SOCIEDADE

MENTIRA E SOCIEDADE

Nildo Viana

Professor da Faculdade de Ciências Sociais/UFG

Artigo publicado originalmente em: Revista Posição, Ano 1, Vol. 1, num. 3, out./dez. 2014.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

A ESFERA CIENTÍFICA NO CINEMA

A ESFERA CIENTÍFICA NO CINEMA
Nildo Viana
Resumo:
A ciência e a produção científica são objetos de representações por elas mesmas e, de forma mais aprofundada, pela sociologia da ciência, filosofia da ciência e história da ciência. O cinema através de suas produções fílmicas também apresentam aspectos da ciência e de sua produção intelectual. O presente artigo objetiva analisar três filmes (A Fúria pela Honra; Óleo de Lorenzo; O Informante) e observar quais representações eles produzem a respeito da ciência, da esfera científica e da produção que esta realiza. A conclusão é que estes filmes revelam a dinâmica dominante na esfera científica, comandada pelo capital, burocracia e Estado, elementos complementares, além da dinâmica interna da mesma.
Palavras-chave: Esfera Científica, Cinema, Competição, Burocracia, Capital.

Resumé:
Des sciences et de la production scientifique sont des représentations d'objets par eux-mêmes et, plus en profondeur, la sociologie de la science, la philosophie de la science et de l'histoire de la science. Le film à travers ses productions filmiques comportent aussi des aspects de la science et de la production intellectuelle. Cet article vise à analyser trois films (Le Fury par honneur, Huile de Lorenzo, L'informateur.) et observer ce qu'ils produisent des représentations sur la science, la sphère scientifique de la production et que cette porte. La conclusion est que ces films révèlent la dynamique dominante dans le domaine scientifique de ses liens avec la capitale, et la bureaucratie d'Etat, étant complémentaires, puisque chaque concentre sur un aspect de ces relations.
Mots-clés: Sphère Scientifique, Cinéma, Competition, Bureaucratie, Capitale.

A ciência e a produção científica possuem diversas características analisadas pelas ciências humanas, especialmente a sociologia da ciência, e a historiografia, bem como também pela filosofia da ciência, entre outras disciplinas. As obras cinematográficas manifestam, muitas vezes, aspectos da ciência e produção científica. Os filmes de ficção científica são bons exemplos, apesar de geralmente ficarem na superficialidade, pelo menos na maioria dos casos. Alguns filmes de terror também mostram[1] questões sobre a ciência, inclusive os seus resultados mais negativos. Há também outras produções além dos filmes de ficção científica e terror que abordam questões relacionadas à ciência. Este é o caso de vários filmes, mas destacamos três para poder extrair uma análise crítica da esfera científica: A Fúria pela Honra, Shi-Zheng Chen (EUA, 2007); O Óleo de Lorenzo, George Miller (EUA, 1993) e O Informante, Michael Mann (EUA, 1999).

Antes de iniciar nossa análise, no entanto, observamos a necessidade de explicar o que significa o conceito de esfera científica. A esfera científica é uma das esferas sociais constituídas na sociedade capitalista, fruto da ampliação da divisão social do trabalho intelectual, e que possui um conjunto de indivíduos que são os seus agentes diretos, os cientistas, instituições, concepções e valores próprios, que possui um modus operandi próprio, entre outros aspectos[2]. Enfim, a esfera científica é um setor da divisão social do trabalho responsável pela produção da ciência e que é composta, principalmente, pelos cientistas.

Esfera científica, competição e academia em A Fúria pela Honra.

O filme A Fúria pela Honra é importante para compreender um aspecto fundamental da esfera científica: a produção científica e suas determinações. Uma das determinações da produção científica é o espaço onde ela se realiza: universidades, institutos de pesquisa, etc. Aqui temos a relação entre esfera científica e instituições. No caso do filme, a produção científica ocorre no interior de uma universidade. O personagem Liu Xing se transfere da China para os Estados Unidos para trabalhar sob a supervisão do renomado cientista Jacob Reiser. A relação entre ambos é de subserviência. O cientista explora o orientando com diversos trabalhos e devido sua competência vai ganhando espaço, ao lado dos demais orientandos, mas com certo destaque.

Assim, Liu Xing tem uma rápida ascensão. Ele tem uma grande ambição, o que está relacionado com as expectativas dos pais e sua vontade de ajudá-los, além dos seus próprios valores e desejo de reconhecimento na esfera científica, o que se percebe pela ideia de ganhar o prêmio Nobel devido a uma grande descoberta que pretende fazer. Um dos pontos fortes do filme é quando o cientista afirma ao estudante que um artigo famoso que ele publicou foi uma crítica ao seu orientador. O estudante retruca dizendo que na China isso não acontece, pois lá é preciso respeitar o orientador, não podendo criticá-lo. O cientista retruca dizendo que nos Estados Unidos ele pode criticar o orientador, inclusive Liu Xing poderia criticá-lo, embora, acrescenta, “ele sempre estaria certo”. Pouco depois, Jacob Reiser, em uma apresentação pública, é questionado pelo seu antecessor e ex-orientador. Reiser fica sem resposta e é salvo pelo orientando, Liu Xing, que meio atrapalhado e com muitos papéis, acaba lhe fornecendo a resposta.  

A partir daí Liu Xing amplia seus estudos e realiza uma descoberta, o que era sua grande ambição e passo necessário para o tão sonhado prêmio Nobel. O problema é que sua tese, embora seja de certa forma uma continuidade da do seu orientador, ia além e realizava uma crítica parcial da mesma. Isso lhe traz inúmeros problemas com as bancas que passa e a publicação de um artigo, sem a “autorização” do seu orientador[3] e possuindo caráter crítico (da mesma forma que ele fez no passado), acaba lhe rendendo uma reprovação através de subterfúgios por parte dos membros da banca, e isso acaba destruindo não somente seus grandes sonhos, mas também lhe fechando as portas e ele acaba como vendedor de cosméticos, uma ironia, já que era especialista em cosmologia, o que uma garota, uma garçonete que ele tinha ilusões de relação amorosa, havia confundido com cosmética no início do filme.

O que o filme mostra, no fundo, são algumas das características fundamentais da produção científica. Nem sempre as melhores ideias são aceitas e muito menos são reconhecidas publicamente. A produção científica é perpassada por relações de poder, aqueles que já possuem fama, posições nas universidades, etc., acabam determinando um processo de reprodução de suas ideias e/ou das concepções estabelecidas. Toda história mostra, também, a competição constante no interior da universidade e dos meios científicos. Nesta competição, há a oposição entre os velhos e os novos, os consagrados/estabelecidos[4] e os iniciantes, professores e estudantes. O conflito entre consagrados e/ou estabelecidos e iniciantes pode ocorrer pelo fato de existir, no último caso, muita pressa em reconhecimento – com ou sem mérito real, entrando em jogo questões psíquicas e outras – ou em destaque real por desenvolvimento de grande potencialidade, sendo que as duas coisas podem ocorrer simultaneamente no mesmo indivíduo, aumentando o potencial de conflito. Este é o caso de Liu Xing. Claro que nem sempre existe tal oposição, pois foi o caso do aluno excepcional que permitiu a superação da subserviência. A disputa entre os antigos professores, que viveram a situação de orientador e orientando, é uma competição de gerações que revelam disputas políticas e por reconhecimento. A nova luta é uma reprodução da antiga, com a diferença de que o cientista Jacob Reiser soube esperar o seu momento, ou seja, após muito tempo e depois de garantir seu espaço institucional é que combateu o seu antigo orientador. Este, no entanto, continua existindo e lhe combatendo. É por isso que Reiser diz que Liu Xing “não é um jogador”, ou seja, não sabe “jogar” e desconhece as regras do jogo, o modus operandi da esfera científica.

Isso revela os valores e interesses dentro da esfera artística. Obviamente que os cientistas, enquanto indivíduos que vivem numa sociedade capitalista, precisam de dinheiro para sobreviver e geralmente estão de acordo com os valores dominantes, que Liu Xing reproduz (veja afirmação de que queria ganhar o premio Nobel e se casar com uma loira americana). Contudo, a luta pelo reconhecimento é um dos elementos mais constantes da esfera científica e isso se faz através de várias formas, e no fundo se dá em torno do que cada um produz. A disputa entre Reiser e Liu Xing expressa justamente a tentativa de um garantir a manutenção do seu reconhecimento com sua descoberta que não poderia ser criticada e o outro tentando produzir algo inovador e original, o que acaba conseguindo, e que é rechaçado por ter entrando em contradição com a descoberta do orientador e, por conseguinte, por causa das relações de poder favorável ao primeiro.

O fracasso de Liu Xing mostra, também, que o compromisso com a verdade não é um valor fundamental na esfera científica, bem como que as ideias hegemônicas nesta esfera não são as melhores e mais fundamentadas. São o resultado de relações de poder num processo competitivo que não ganha o mais apto intelectualmente e sim o mais bem posicionado na esfera científica, com raras exceções. Os alunos de maior sucesso, mais “apto” (no fundo, mais adaptado), em grande parte das vezes, é o subserviente, tal como se percebe no caso do colega de Liu Xing que acabou ganhando a vaga que seria dele caso não houvesse o conflito, ou seja, se ele soubesse ou seguisse “as regras do jogo”, se fosse um jogador, humilde, subserviente.

Assim, a hierarquia acaba sendo uma determinação do processo de quais ideias científicas obterão êxito e reconhecimento e há uma luta constante entre os mais antigos, os consagrados e os estabelecidos, e entre estes e os estudantes, bem como acordos e alianças, tal como se percebe na banca instituída para avaliar o trabalho de Liu Xing. No caso de Liu Xing há uma luta por reconhecimento e ascensão social, o que o envolve numa competição com seu orientador, e com seus colegas, sendo que os demais são cooptados e conseguem se adaptar ao jogo apesar de menos competência.

O diferencial de Liu Xing é sua competência maior, o que lhe colocava em confronto com o orientador e sua persistência em dizer a verdade, não tanto pelo compromisso com a verdade, mas pelo seu interesse de reconhecimento e ascensão social. Em síntese, o filme mostra a competição na academia e na produção científica, demonstrando com a universidade como instituição e seus processos burocráticos e hierárquicos acabam sendo um obstáculo para o desenvolvimento do saber.

Esfera Científica, burocracia e interesses em Óleo de Lorenzo

O filme Óleo do Lorenzo oferece um quadro complementar ao primeiro filme analisado. Neste filme temos o caso de um casal preocupado com uma doença rara que acomete o filho e pai e mãe buscam de todas as formas encontrar uma cura para ela. Eles consultam médicos, organizam um simpósio científico, etc. até que passam, eles mesmos, a estudar medicina e buscar a cura por conta própria.

Nesse processo, baseado em uma história real, alguns elementos são mostrados a respeito da esfera científica. Um deles é o processo burocrático de formação. Apenas os diplomados (os estabelecidos) é que podem exercer medicina e isso é parte de sua formação. É necessário o diploma. Essa oposição é colocada em várias oportunidades no filme, no qual a percepção acrítica da especialização é acompanhada pela desqualificação do saber não especializado e institucionalizado. O saber real é menos importante do que o saber formal representado pelos diplomas, aliás, o que já estava teorizado por Weber (1971) ao destacar sua importância crescente na sociedade moderna e que é expressão do que Marx (1978) chamou “batismo burocrático do saber”, parte do processo de autolegitimação da esfera científica. Isso também reflete a oposição entre intelectuais profissionais, hegemônicos, e intelectuais amadores. Os consagrados e estabelecidos buscam constantemente desqualificar o saber dos amadores e aspirantes, reproduzindo a competição social e ao mesmo tempo realizando sua autolegitimação. Assim, tanto aqueles que são da esfera científica quanto aqueles que são externos e atuam sobre ela, são envolvidos nessa competição e os externos ou aspirantes internos são colocados como “inferiores”, mesmo que possuam uma real competência e contribuição intelectual.

Aqueles que possuem a hegemonia na esfera científica possuem, nessa competição, as instituições ao seu lado, pois seu saber é institucionalizado. Ele é sancionado pela instituição estatal (regularização jurídica) e pelas instituições específicas ligadas à esfera científica (universidade, institutos de pesquisa, associações profissionais). O saber institucionalizado possui não só hegemonia, mas os seus “detentores” possuem o poder de censurar, reprimir, desqualificar, o saber não institucionalizado, tal como ocorre com o casal. E para tanto existem diversos argumentos, que podem ser observados no filme, desde o argumento de autoridade, passando pela necessidade de institucionalização, necessidade de reconhecimento pela esfera científica, etc.

Outro elemento importante da esfera científica apresentada no filme é sua relação com o capital e Estado, o que está intimamente ligado ao ponto anterior. Essa ligação perpassa o processo de formação, principalmente, mas não unicamente, no caso do Estado. Contudo, a interferência estatal na esfera científica não ocorre apenas através da formação, mas também através do financiamento, da regularização jurídica, da regulamentação da profissão, etc. É nesse contexto que novamente emerge a competição e a burocracia na esfera científica. Esse processo não só deixa vagaroso qualquer avanço, como tornam os cientistas extremamente moderados, o que é mais forte em algumas áreas da produção científica. Além disso, devido aos interesses próprios dos cientistas, constituídos na esfera, não se pode ser “ousado” demais e não se deve adotar novas linhas de pensamento ou assumir descobertas e propostas inovadoras. É uma forte tendência da esfera científica, mesmo para os estabelecidos, e até para alguns consagrados, o medo da ousadia, da inovação, da transformação.

Um elemento fundamental do filme é mostrar a força dos interesses e a sua relação com a verdade. Os profissionais da esfera científica possuem interesses próprios e estes limitam suas ações e processos de descoberta, inovação, assimilação de saberes externos, etc. Os interesses próprios constituídos na esfera científica entram em contradição com o compromisso com a verdade.

A ciência submetida ao capital em O Informante

O filme O Informante se passa noutro contexto de produção científica. O filme mostra, baseado em fatos reais, a situação de Jeffrey Wigand, um cientista, doutor em bioquímica, empregado no capital tabaqueiro (ou “indústria do tabaco”), que é despedido e ameaçado por ter informações sigilosas da empresa e, ao mesmo tempo, é procurado por um jornalista, Lowell Bergman, para expor a história na rede de televisão norte-americana CBS. Ao conceder a entrevista, ele sofre as consequências, perda de benefícios advindos da rescisão contratual, ameaça de morte, perseguição, divórcio, e acaba terminando modestamente como professor de química.

O que o filme mostra é a submissão do cientista na situação de trabalhador para empresas privadas. O capital tabaqueiro contrata cientistas, financia pesquisas, e usa isso para seus interesses. O seu interesse é, obviamente, o lucro. Os cientistas, nesse caso, são pagos para produzir aquilo que remete aos seus interesses. No caso do filme, o interesse é afirmar que não sabe que a nicotina possui característica de viciar e outros segredos da produção desta empresa capitalista. Contudo, Wigand revela não apenas que a empresa sabia das características viciantes da nicotina como, ainda, adicionavam aditivos químicos para reforçar tal característica. Obviamente, isso faz parte da necessidade do capital de promover, junto com a produção cada vez maior de suas mercadorias, uma reprodução ampliada do mercado consumidor (VIANA, 2009).

Os cientistas empregados em empresas capitalistas como estas estão totalmente submetidos ao capital. A sua produção científica e suas pesquisas são voltadas para os interesses do capital, mesmo que isso signifique prejudicar, o que geralmente ocorre, a população. É uma situação pior do que a dos cientistas empregados em universidades e outras instituições, pois sua margem de liberdade é muito menor. Isso revela um elemento interessante da esfera científica: ela está submetida ao capital. Isso não só se manifesta no caso das instituições de ensino e pesquisa financiadas e controladas pelo capital, mas também por empresas capitalistas que diretamente usam e financiam pesquisas. Desta forma, a esfera científica possui graus distintos de determinação de sua produção e pesquisa pelo capital, e para aqueles empregados em grandes empresas capitalistas, sua autonomia e liberdade são mínimas. Ou é livre para servir ao capital.

Obviamente que existe a possibilidade de romper com tais empresas. O que o filme mostra, nesse caso, é que devido ao sigilo necessário, a ruptura seria traumática e poderia colocar em risco a própria vida do cientista. As ameaças, a vigilância, se dão simplesmente por sua saída da empresa. Quando resolve expor o que sabia para a imprensa, a pressão aumenta e a vida de Wigand se torna um verdadeiro inferno. Até mesmo o grande capital comunicacional, no caso a CBS, é ameaçado e colocado em questão, o que gera problemas para o jornalista Bergman e toda equipe, sendo este o único que decide comprar a briga. Isso demonstra o poder do capital e como os cientistas (e não só eles, mas também os jornalistas) estão submetidos e podem pagar muito caro por não seguir suas diretrizes.

O processo de pressão começa com os contratos e a burocracia, avança para ameaças e uso do poder financeiro, chega, no momento da denúncia e processo, a vasculhar a vida privada de Wigand, na qual pequenos deslizes e detalhes são utilizados contra ele e ganhando grandes proporções, e as ações do capital tabaqueiro são minimizadas. A ameaça de morte e perseguição à família é apenas um capítulo desse processo de ataque do capital ao cientista. Por conseguinte, há uma grande pressão sobre os cientistas, que ficam acorrentados ao capital. Se o cientista tenta se desvencilhar, sabe que perderá seus privilégios e sua vida tende a ser destruída. Nesse sentido, a esfera científica não possui autonomia absoluta, mas tão-somente relativa, mas isso é variável de acordo com a situação específica e certos setores da esfera científica possuem uma autonomia muito restrita, alguns chegando a não ter autonomia praticamente nenhuma. A proeminência do poder financeiro em certos setores da produção científica é evidente e o filme mostra o seu de tal poder não apenas para financiar, mas para controlar, censurar e reprimir a verdade.

O filme revela, ainda, a dificuldade em dizer a verdade, aspecto já tematizado por Bertolt Brecht, sendo a coragem a primeira delas:
É evidente que o escritor deve dizer a verdade, não a calar nem a abafar, e nada escrever contra ela. É sua obrigação evitar rebaixar-se diante dos poderosos, não enganar os fracos, naturalmente, assim como resistir à tentação do lucro que advém de enganar os fracos. Desagradar aos que tudo possuem equivale a renunciar seja o que for. Renunciar ao salário do seu trabalho equivale por vezes a não poder trabalhar, e recusar ser célebre entre os poderosos é muitas vezes recusar qualquer espécie de celebridade. Para isso precisa-se de coragem (BRECHT, 1982, p. 36).
Assim, O Informante complementa o processo de mostrar o funcionamento da esfera científica e revela sua ligação com o capital e sua reprodução. A saga de Jeffrey Wigand é a que foi seguida por poucos e evitada por milhares, revelando que os discursos sobre a ciência, geralmente produzido pelos próprios cientistas, nem sempre colocam aquilo que deveria colocar a imagem heroica do cientista, que existe e se manifesta em alguns casos, é mais exceção do que a regra, pois sair das regras, além de não ser desejável para quem compartilha os valores dominantes da nossa sociedade, tem consequências prejudiciais para os indivíduos.

Considerações finais

Os filmes aqui comentados são complementares, pois juntos oferecem uma percepção, ainda que longe de ser completa, mais geral da esfera científica. Eles mostram como a esfera científica está envolvida com as instituições (tal como a academia), a burocracia/governos e empresas capitalistas, especialmente manifestando a questão dos interesses constituídos a partir dela pelos cientistas.

Esses interesses, muito longe de beneficiarem o compromisso com a verdade, na maioria dos casos, são obstáculos. O objetivo que predomina na produção científica não é o bem estar da população, nem supostamente a verdade e sim a satisfação de determinados interesses que vão contra ambos. Aqui temos o mesmo caso que na ideologia, um sistema de pensamento ilusório que contribui para o reforço da dominação. Ilusão e dominação se complementam, ao contrário do que afirmam alguns[5]. Esse processo, que ocorre na vida real, na qual os intelectuais, devido suas posições na divisão social do trabalho e na esfera científica mais especificamente, assumem determinados posicionamentos, e assim acabam reproduzindo a sociedade capitalista tanto em suas produções científicas (ideologias, técnicas, tecnologias, etc.), quanto em suas práticas cotidianas.

Os interesses dos consagrados e estabelecidos geralmente é, embora não seja o caso de todos os indivíduos nessa situação, a reprodução da esfera científica e de sua posição privilegiada (quando a tem, quando não a tem, o interesse é adquiri-la)[6], o que pressupõe reproduzir as estruturas burocráticas das instituições e as regras do jogo. Da mesma forma, o interesse do reconhecimento, retorno financeiro, entre outros existem e silenciam milhares de cientistas. Ambos são elementos da sociedade capitalista reforçados por sua sociabilidade e mentalidade dominantes.

Isso é o que ocorre na vida real e é reproduzido no universo ficcional da produção fílmica. Quando se baseiam em “fatos reais” a proximidade, intencional ou não, da equipe de produção, com a realidade, é maior. Estes filmes mostram, através da ficção, a realidade concreta da esfera científica e de seus laços indissolúveis com o capital e o poder.

Nesse sentido, os três filmes aqui apresentados são interessantes para despertar a reflexão crítica sobre a ciência e a esfera científica, com focos diferentes e que, com a sua reunião, possibilitam uma análise mais global desta esfera social e sua dinâmica de funcionamento e envolvido com a sociedade capitalista.

Referências

BOURDIEU Pierre. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Difel, 1989.

BOURDIEU, Pierre. O Campo Científico. In: ORTIZ, Renato (org.). Bourdieu. São Paulo: Ática, 1994.

BRECHT, Bertolt. As Cinco Dificuldades em Dizer a Verdade. In: Sobre a Verdade. Lisboa: Nova Aurora, 1982.

MARX, Karl. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Lisboa, Presença, 1978.

ROUANET, Sérgio Paulo. Imaginário e Dominação. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978.

VIANA, Nildo. A Esfera Artística. Marx, Weber, Bourdieu e a Sociologia da Arte. Porto Alegre: Zouk, 2007.

VIANA, Nildo. A Esfera Científica. Florianópolis: Bookess, 2014b.

VIANA, Nildo. As Esferas Sociais. Curitiba: CRV, 2014a.

VIANA, Nildo. Cinema e Mensagem. Análise e Assimilação. Porto Alegre: Asterisco, 2012.

VIANA, Nildo. Imaginário e Ideologia: As Ilusões nas Representações Cotidianas e no Pensamento Complexo. Revista Espaço Livre, v. 08, num. 15, jan./jun. de 2013. Acessado em 10 de Junho de 2013. Disponível em: http://revistaespacolivre.net/el15.pdf

VIANA, Nildo. O Capitalismo na Era da Acumulação Integral. São Paulo, Idéias e Letras, 2009.

WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. Rio de Janeiro, Zahar, 1971.




[1] Aqui deixamos claro que essa mostração não é a mesma coisa que uma mensagem intencional, mas ao reproduzir acontecimentos reais ou mesmo ficções cuja inspiração tem origem na realidade, se mostra a realidade e, ao fazê-lo, permite que aquele que assiste ao filme possa ir além do que o próprio filme coloca e possibilita sua assimilação no sentido crítico e de apoio para objetivos educacionais, psicanalíticos, políticos, etc. (VIANA, 2012).

[2] Uma definição mais detalhada de esferas sociais (VIANA, 2014a) e esfera científica (VIANA, 2014b) seria útil, mas ultrapassaria nossos objetivos e a consulta à bibliografia citada resolve essa lacuna. Claro está que tal concepção tem semelhanças com a concepção de Bourdieu a respeito do “campo científico” (1994) e sua teoria geral dos campos (BOURDIEU, 1989), ou, ainda, com a ideia de esfera especializada em Weber (1971), mas se distingue de ambas em diversos aspectos, incluindo sua não autonomização demasiada, o reconhecimento de sua relação com a luta de classes, etc.

[3] Coisa que no Brasil, em alguns casos, os orientadores querem controlar, e tem casos em que vão mais longe, inclusive até que disciplinas os orientandos devem cursar em pós-graduação, o que é ainda manifesto no regimento de alguns cursos.

[4] Os consagrados são aqueles que já possuem status e fama, enquanto que os estabelecidos são aqueles que apenas possuem posição institucional (são professores estáveis, por exemplo), inclusive há uma hierarquia entre eles, tal como se pode ver no próprio filme na banca, na qual Jacob Reiser, um consagrado, acaba se impondo aos demais, os estabelecidos, mesmo quando um, numa determinada oportunidade, tenta argumentar em favor do aluno. Claro que nem sempre isso ocorre, pois existem outras determinações que podem constituir processos diferenciados. Esse processo de competição é comum tanto na esfera científica (VIANA, 2014b; BOURDIEU, 1994) quanto na esfera artística (VIANA, 2007).

[5] Rouanet (1978) afirma que se a ideologia é ilusão, não pode servir para a dominação, o que é um equívoco grave (VIANA, 2013), pois o processo de produção de representações ilusórias serve para ocultar a realidade e realizar interesses de reprodução do capitalismo, sendo que, as representações verdadeiras, as teorias, são elementos de contradição e luta. Um elemento interessante a se destacar é que as ideologias e representações cotidianas ilusórias não são apenas falsidade, pois possuem momentos de verdade, o que, no entanto, não abole sua essência de pensamento ilusório. Um pensamento totalmente ilusório não teria eficácia, seria considerado pura “ficção”. No entanto, a ideologia é um sistema de pensamento ilusório, pois predomina nela o que é falso, e embora isso entre em contradição com a realidade, acaba mantendo unidade com determinados interesses, valores, concepções e setores da sociedade, e, ainda, é reforçada pelo fato de que vive no mundo das aparências ou do formalismo, sendo que atingir a verdade exige um esforço teórico mais profundo e assim aparentam expressar o real, quando, na verdade, o deformam.

[6] Essa é uma das diferenças entre nossa análise e a de Bourdieu, cuja concepção mostra uma incompreensão da existência de indivíduos fora ou contra o campo. O nosso foco aqui, no entanto, foi a reprodução da esfera científica e os intelectuais marginais (amadores, engajados) ficaram de fora da análise.
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Publicado originalmente em:
VIANA, Nildo. A Esfera Científica no Cinema. Revista Alceu. vol. 15, num. 31, jul./dez. de 2015.
http://revistaalceu.com.puc-rio.br/media/alceu%2031%20pp%2089-98.pdf




Alceu 31

A esfera científica no cinema
Por: Nildo Viana


 ResumoA ciência e a produção científica são objetos de representações por elas mesmas e, de forma mais aprofundada, pela sociologia da ciência, filosofia da ciência e história da ciência. O cinema através de suas produções fílmicas também apresentam aspectos da ciência e de suaprodução intelectual. O presente artigo objetiva analisar três filmes (A fúria pela honra; Óleo de Lorenzo; O informante) e observar quais representações eles produzem a respeito da ciência, da esfera científica e da produção que esta realiza. A conclusão é que esses filmes revelam adinâmica dominante do campo científico e suas ligações complementares com o capital e o Estado burocrático, cada um concentrando-se sobre um aspecto destas relações.
Palavras-chave
Esfera científica. Cinema. Competição. Burocracia. Capital.

 Résumé
Des sciences et de la production scientifique sont des représentations d’objets par eux-mêmes et, plus en profondeur, la sociologie de la science, la philosophie de la science et de l’histoirede la science. Le film à travers ses productions filmiques comportent aussi des aspects de la science et de la production intellectuelle. Cet article vise à analyser trois films (Le fury parhonneur, Huile de Lorenzo, L’informateur) et observer ce qu’ils produisent des représentations sur la science, la sphère scientifique de la production et que cette porte. La conclusion est que ces films révèlent la dynamique dominante dans le domaine scientifique de ses liensavec la capitale, et la bureaucratie d’Etat, étant complémentaires, puisque chaque concentre sur un aspect de ces relations.
Mots-clé
Sphère scientifique. Cinéma. Competition. Bureaucratie. Capitale.

A esfera científica no cinema 

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Entrevista sobre Movimentos Sociais Contemporâneos - Revista Café com Sociologia

Movimentos Sociais, Partidos Políticos e Ações Coletivas: entrevista ao professor e pesquisador Dr. Nildo Viana

Cristiano das Neves Bodart

Resumo


Nildo Viana é graduado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Goiás (1992), mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Goiás (1995), Mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília (1999) e doutor em Sociologia por essa mesma universidade. Atualmente é professor da Universidade Federal de Goiás. Autor de diversos livros e artigos em revistas especializadas e coordenador da Coleção Biblioteca Universitária Autêntica, Série Ciências Sociais, da Editora Autêntica, tendo se destacado como um dos principais contemporâneos brasileiros estudiosos do marxismo.

Para Ler a Entrevista completa, clique aqui.

Os Movimentos Sociais durante o Capitalismo Oligopolista Transnacional



Os Movimentos Sociais durante o Capitalismo Oligopolista Transnacional 
Nildo Viana

Resumo

Os movimentos sociais seguem a dinâmica do capitalismo, sendo que emergiram na sociedade moderna, possuindo um desenvolvimento marcado por sua inserção particular na mesma. O nosso objetivo é analisar alguns dos elementos básicos dos movimentos sociais durante o capitalismo oligopolista transnacional, caracterizado pela vigência do regime de acumulação conjugado, e mostra que sua dinâmica é marcada tanto por um recuo do movimento operário convivendo com a emergência do aparecimento de um novo contexto para os movimentos sociais e sua radicalização no final dos anos 1960, época da crise do regime de acumulação conjugado.

Para ler o texto completo, clique aqui.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Os Valores Natalinos são Axiológicos




nata


 Os valores natalinos são axiológicos


Nildo Viana


Natal é uma festa cristã realizada no dia 25 de dezembro, data em que se comemora o nascimento de Jesus Cristo. No entanto, é visível a mudança do significado do natal no decorrer da história. A sua origem está ligada a uma festa pagã que antecedeu o cristianismo e foi adaptada pelos valores e concepções cristãs, transformando-se com o passar do tempo. Após isto, ganhou um significado religioso e os símbolos pagãos, bem como a forma da festividade, mudaram.
O natal cristão foi, inicialmente, a partir do século, uma festa religiosa. Inspirado na mitologia babilônica, a figura de Papai Noel – inspirada em Nicolau, Bispo de Mira, século 05  – representava a solidariedade, já que era uma pessoa que presenteava três crianças de família pobre. Posteriormente, Papai Noel foi transformado em um indivíduo que dá presentes para crianças, que os pedem através de cartas. Já não se trata de solidariedade e de crianças pobres e sim do ato de exigir presentes (as crianças, da forma como são socializadas na atualidade) e oferecer presentes, inclusive os usando para disfarçar as dificuldades de afetividade, sendo um oferecimento de uma satisfação substituta a quem é presenteado. Muitos, inclusive, se não forem presenteados (e não só as crianças), pensam que não são amados (VIANA, 2002).
A religiosidade e seus valores acabam sendo substituídos por outros valores e interesses. O natal deixa de ser festa religiosa comemorativa para se tornar festa mundana consumista. Na sociedade capitalista, onde tudo é paulatinamente transformado em mercadoria, temos a mercantilização do natal. O significado mercantil do natal substitui o seu antigo significado religioso. O natal é transformado numa festa consumista, na qual a publicidade e o mercado buscam aumentar o consumo geral e isso é efetivado todos os anos, como comprovam as estatísticas. Ocorre a generalização da troca de presentes, compras de artigos natalinos e o Papai Noel passa a ser o maior símbolo desta festa em substituição à Jesus Cristo. As crianças nascem e são socializadas nesse contexto e por isso tendem a naturalizar, inclusive quando adultos, tal consumismo e percepção do natal.
Desta forma, há uma manipulação de sentimentos e produção de valores visando aumentar o mercado consumidor. Alguns setores específicos ganham mais com este processo e se criam costumes, desejos, fabricados para esta época, como a “ceia natal”, brinquedos, decoração, determinados alimentos (panetone, peru, castanhas, etc.). Isso produz uma euforia e falsa sensação de alegria em uns, insatisfação e conflitos para outros (os que não possuem dinheiro para consumir). Assim, o natal passa a ter um significado predominantemente mercantil na sociedade contemporânea e de nada adianta apelos para a recuperação de seu sentido religioso, pois estes só possuem ecos em círculos restritos, nos quais a religiosidade ainda é importante e se tornam matéria para produção de novas mercadorias e mais consumo (também símbolos natalinos, como presépios etc.) (VIANA, 2002).
Os valores dominantes de cada época tomam as manifestações culturais em geral. Os valores natalinos são apenas mais uma versão dos valores axiológicos, dominantes. Sem dúvida, a palavra “valores” é muito utilizada, mas poucos a definem e, por isso, falta clareza em seu uso em muitos casos. Nós entendemos que os valores são aquilo que é importante e significativo para os indivíduos e que existem valores autênticos, tais como a liberdade e a criatividade, e valores histórico-particularistas, ligados aos interesses da classe dominante, os valores axiológicos (VIANA, 2007). Os valores natalinos, em sua atual configuração, aparentemente são axionômicos (autênticos), pois pregam a solidariedade e fraternidade, tornando-os valores. Contudo, em uma análise mais profunda, no contexto da sociedade capitalista, o discurso da solidariedade e fraternidade apenas disfarça um mundo competitivo (no qual quem vai fazer mais compras e realizar o consumo dos bens mais caros e desejados ganha) e marcado por conflitos sociais diversos, tornando tais palavras a manifestação de pseudovalores, pois estão subordinados e apagados pelos valores dominantes. A existência de pseudovalores apenas mostra a hipocrisia reinante na sociedade moderna.
A solidariedade, ou fraternidade, é um valor axionômico, autêntico, pois o ser humano, enquanto ser social, tem a necessidade psíquica de associação com outros seres humanos, não somente no sentido de estar junto, mas também através de uma comunidade na qual haja relações sociais harmônicas. No período natalino, muitos afirmam a solidariedade como valor e alguns até buscam praticá-la, seja apenas no restrito círculo familiar, seja através da caridade, entre outras formas. No entanto, isso é apenas um dia por ano, cumprindo um papel de reforçar o resto do ano marcado pela competição e conflito. Ou seja, a sua manifestação ocorre no interior de determinadas relações, que são conflituosas e competitivas, e apenas uma vez ao ano, servindo para renovar as práticas comuns ao invés de realmente questioná-las e isso mostra que são subordinadas a outros valores, que são permanentes e dominantes, fazendo com que essa manifestação esporádica de solidariedade seja um reforço da axiologia.
A literatura, o cinema, bem como outras formas de arte, são veículos da reprodução destes pseudovalores. Claro que, na época ou para seus produtores, poderia ser realmente manifestação de seus valores, mas este não é o caso de grande parte das pessoas na atualidade. Desde o clássico “Conto de Natal” de Charles Dickens e suas diversas adaptações cinematográficas até os filmes de Frank Capra, especialmente “A Felicidade não se compra”, o dinheiro e a avareza são apresentados como desvalores ou como valores secundários diante da família, dos amigos, da solidariedade.
A superação dessa festividade mercantil e consumista pressupõe mudanças sociais radicais, nas quais o mundo da mercadoria seja substituído pelo mundo dos seres humanos e os valores axiológicos sejam substituídos por valores axionômicos.
Referências
DICKENS, Charles. Conto de Natal. Rio de Janeiro: Ediouro, 2009.
VIANA, Nildo. O Significado do Natal. In: Capitalismo, Psicanálise e Cotidiano. Goiânia: Edições Germinal, 2002.
 VIANA, Nildo. Os Valores na Sociedade Moderna. Brasília: Thesaurus, 2007.


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