A
Concepção Junguiana de Inconsciente Coletivo*
Nildo Viana
Carl Gustav Jung foi o primeiro
psicanalista a desenvolver uma concepção sistemática de inconsciente coletivo.
Sem dúvida, Freud em alguns momentos fornece elementos que podem servir para
uma concepção do inconsciente coletivo, tal como veremos adiante, mas coube a
Jung o reconhecimento de sua existência e a elaboração de uma concepção
sistemática a seu respeito. Por isso começaremos nossa análise com a
contribuição de Jung.
A obra de Jung surge a partir da fundação da psicanálise por Freud. Freud
foi, paulatinamente, construindo a psicanálise a partir de seu afastamento da
medicina e das descobertas que proporcionaram a sua elaboração teórica. A
concepção de Freud é complexa e inclui inúmeros elementos que vão se
desenvolvendo e dando corpo à psicanálise. As suas teses sobre os instintos (ou
“pulsões”), da repressão e do inconsciente formam a base da concepção
freudiana. No entanto, Freud buscará compreender o “aparelho psíquico” a partir
de dois componentes (consciência e inconsciente) e, posteriormente, três (id,
ego e superego), entre outras alterações que ele provocou em sua concepção
original (a ideia de existência de um “instinto de morte” é outro exemplo, pois
ela só foi sustentada por ele na última fase de seu pensamento).
O grande mérito de Freud foi a descoberta do inconsciente. Freud
considerava que a mente humana, ou “aparelho psíquico”, não era composto apenas
pela consciência, pois possuía uma camada profunda que ele denominou inconsciente
(em sua concepção tripartite do aparelho psíquico – id, ego e superego – os
dois últimos elementos são conscientes e, portanto, a mudança na concepção não
desmente nossa exposição).
A origem do inconsciente se encontra na repressão dos instintos. Para
Freud, o ser humano possui dois conjuntos de instintos: os sexuais e os de
sobrevivência (mais tarde acrescentaria o instinto de morte), embora
focalizasse sua concepção principalmente nos instintos sexuais. Para ele, a
civilização, para garantir sua sobrevivência, deve coagir os seres humanos ao
trabalho e isto pressupõe a repressão dos instintos (sexuais). Esta repressão
dos desejos sexuais, que se inicia durante a infância, é externa, realizada
principalmente pelos pais. Com o passar do tempo, esta repressão é introjetada,
ou seja, o próprio indivíduo, através de sua consciência moral (“superego”) se
“reprime”, realizando o recalcamento, ou seja, apaga de sua consciência tais
desejos.
Os desejos reprimidos, no entanto, não deixam de existir, mas tão-somente
de serem conscientes. Eles ficam “escondidos” na mente humana, no inconsciente.
O inconsciente, por sua vez, sempre busca se manifestar. Ele se manifesta
quando a consciência fica enfraquecida, tal como durante os sonhos ou nas
fantasias, mas também em outros momentos, como nos atos falhos, chistes, etc. (FREUD,
1978).
Freud vai desenvolver sua concepção de problemas psíquicos a partir desta
elaboração. A neurose, por exemplo, seria produto da frustração produzida pelo
recalcamento. Desta forma, a civilização e suas necessidades produzem a
repressão, o recalcamento e o inconsciente (FREUD, 1978b).
Nasce, assim, a psicanálise e em torno de Freud se agruparam diversos
pesquisadores, dando origem à primeira Sociedade Psicanalítica. No entanto, pouco
depois da constituição da psicanálise apareceram as divergências. A concepção
freudiana começou a ser questionada e substituída por concepções rivais, embora
o freudismo ortodoxo continue forte até os dias atuais. A primeira grande
concepção alternativa foi a de Alfred Adler. Adler discordava da centralidade
fornecida por Freud aos instintos sexuais e em seu lugar iria colocar a
“vontade de poder” e daí derivar um conjunto de teses, sendo que algumas se
tornaram populares, tal como a do “complexo de inferioridade”, embora sua
concepção tenha se tornado marginal na história posterior da psicanálise. O
questionamento do “pansexualismo” de Freud realizado por Adler seria apenas o
primeiro de uma série, gerando algumas dissidências, incluindo a de Jung.
A obra de Jung também é bastante complexa e nasce a partir das
contribuições de Freud e Adler, que ele julga importantes, mas “unilaterais”.
Jung era extremamente conservador, ao contrário de Adler, que se autodeclarava
socialista. O conservadorismo de Jung era maior do que o de Freud e está
relacionado com o fato de que o último tinha como preocupação fundamental a
resolução de problemas individuais enquanto que o primeiro dedicava especial
atenção aos problemas sociais. Daí sua consideração pela obra de Adler, que se
dedicou a explicar o indivíduo pelo social.
Jung discorda de várias teses de Freud, tal como a universalidade do
incesto e a primazia do “erótico-sexual”. Segundo ele, os instintos sexuais não
formam a totalidade da natureza humana, embora seja um de seus aspectos
principais. O erro de Freud, para ele, se encontra na sua visão “unilateral” e
“exclusivista” oriunda de sua teoria sexual. Adler substituiu os instintos
sexuais pelo princípio de poder, apresentando, segundo Jung, uma concepção tão
unilateral e exclusivista quanto a de Freud. Jung diz que esta tese também
possui um momento de verdade, tal como a de Freud, mas que elas são
inconciliáveis. É preciso, segundo Jung, partir de um ponto de vista superior a
elas para poder unificá-las. Para Jung, “ambas contêm verdades fundamentais” e
“uma não exclui a outra”, sendo “certas, porém unilaterais” (1989, p. 33).
Jung explicará a diferença entre Freud e Adler por uma “diferença de
temperamento”. Trata-se de uma diferença entre “dois tipos de espírito humano”,
o tipo introvertido (Adler) e o extrovertido (Freud), tal como se encontra em
sua tipologia psicológica[1].
Assim, segundo Jung, o problema é que estas duas teorias são verdadeiras, mas
se aplicam apenas a casos especiais e transformá-las em “teoria global da
essência” é que é o grande erro. É a partir desta “ruptura” com Freud e Adler,
e ao mesmo tempo da conservação de algumas de suas teses, consideradas de “uso
tópico”, que Jung elaborará sua própria concepção.
A concepção de Jung tem como momento inicial a libido. Para Freud a
libido é energia sexual, concepção considerada por Jung como sendo restrita.
Segundo Nise da Silveira,
enquanto
Freud atribui à libido significação exclusivamente sexual, Jung denomina libido
à energia psíquica tomada num sentido amplo. Energia psíquica e libido são
sinônimos. Libido é apetite, é instinto permanente de vida que se manifesta
pela fome, sede, sexualidade, agressividade, necessidades e interesses os mais
diversos. Tudo isso está compreendido no conceito de libido (SILVEIRA, 1981, p.
41).
A energia psíquica, portanto, possui diversas manifestações. Para Jung, a
mente humana é um
sistema
energético relativamente fechado, possuidor de um potencial que permanece o
mesmo em quantidade através de suas múltiplas manifestações, durando toda a
vida de cada indivíduo. Isto vale dizer que, se a energia psíquica abandona um
de seus investimentos virá reaparecer sob outra forma. No sistema psíquico a
quantidade de energia é constante, varia apenas sua distribuição (SILVEIRA,
1981, p. 44).
A libido, diz Jung, “já possui seu objeto no inconsciente”, e o seu rumo
não pode ser decidido pela nossa vontade, seguindo seu fluxo. Assim, a libido,
seguindo seu curso natural, encontra “o caminho para o objeto que lhe é
destinado”, o que só não ocorre por interferência da vontade ou por elementos
externos.
Jung vai relacionar sua concepção de libido com a questão do
inconsciente. Para ele, o inconsciente possui duas camadas, uma pessoal
(individual) e outra coletiva.
A
camada pessoal termina com as recordações infantis mais remotas; o inconsciente
coletivo, porém, contém o tempo pré-infantil, isto é, os restos da vida dos
antepassados. As imagens das recordações do inconsciente coletivo são imagens
não preenchidas, por serem formas não vividas pessoalmente pelo indivíduo.
Quando, porém, a regressão da energia psíquica ultrapassa o próprio tempo da
primeira infância, penetrando nas pegadas ou na herança da vida ancestral, aí
despertam os quadros mitológicos: os arquétipos (JUNG, 1989, p. 69).
Para Jung, tal como colocamos anteriormente, a libido já possui seu
objeto no inconsciente (pessoal). Mas além desse inconsciente pessoal, existem
“as imagens primordiais”, isto é,
a
aptidão hereditária da ação humana de ser como era nos primórdios. Essa
hereditariedade explica o fenômeno, no fundo surpreendente, de alguns temas e
motivos de lendas se repetirem no mundo inteiro e em formas idênticas, além de
explicar porque os nossos doentes mentais podem reproduzir exatamente as mesmas
imagens e associações dos textos antigos (JUNG, 1989, p. 57).
Jung esclarece que tais imagens não são hereditárias. O que é realmente
hereditário é a capacidade de tê-las. Jung denomina estas imagens universais e
originárias como “arquétipos”. Esta camada mais profunda do inconsciente, o
inconsciente coletivo, não chega à tona facilmente. Somente através de um
processo de “regressão” é que ele surge na mente individual. O que provoca tal
“regressão”? Ela é produto da repressão[2].
Para ele, a cultura ocidental racional nega o irracional. No entanto, “o homem
não é apenas racional, não pode e nunca vai sê-lo” (JUNG, 1989, p. 64). “O
irracional não deve e não pode ser extirpado. Os deuses não podem e não devem
morrer” (JUNG, 1989, p. 64).
Assim, Jung encontra no racionalismo da cultura ocidental a chave para
explicar a regressão. Se lembrarmos que para ele a libido é um conjunto
múltiplo de necessidades, então o desenvolvimento unilateral do ser
humano provoca a regressão. Segundo Jung, existe um impulso ou complexo que
concentra em si a maior parte da energia psíquica e obriga o eu a ficar sob seu
comando.
Habitualmente,
é tão intensa a força de atração exercida por este foco de energia sobre o eu
que este se identifica com ele, passando a acreditar que fora e além dele não
existe outro desejo ou necessidade. É assim que se forma uma mania, monomania,
possessão ou uma tremenda unilateralidade que compromete gravemente o
equilíbrio psicológico. O poder de concentrar toda a capacidade num ponto só é
sem dúvida algumas o segredo de certos êxitos, razão porque a civilização se
esforça ao máximo em cultivar especializações (JUNG, 1989, p. 64).
Para Jung, o ser humano tem o direito de considerar sua razão “bela e
perfeita”, mas ela é apenas uma das “funções espirituais possíveis”, sendo uma
ilha rodeada por todos os lados pelo irracional. A religião é uma expressão
irracional que faz parte da totalidade psíquica humana. “O conceito de Deus é
simplesmente uma função psicológica necessária, de natureza irracional, que
absolutamente nada tem a ver com a questão da existência de Deus” (JUNG, 1989,
p. 63). Assim, ele diz: “estou plenamente convencido da extraordinária
importância do dogma e dos ritos, pelo menos enquanto métodos de higiene” (JUNG,
1987, p. 49).
Assim, a “receita de Jung” é aceitar as funções psíquicas irracionais da
mente e, visando evitar a regressão, devemos nos entregar à “experiência
religiosa”. Mas por qual motivo Jung quer evitar a regressão ao inconsciente
coletivo? O que ele busca evitar é que a libido retire seu objeto dos conteúdos
do inconsciente coletivo. As imagens primordiais contidas no inconsciente
coletivo
contém
não só o que há de mais belo e grandioso no pensamento e sentimento humanos,
mas também as piores infâmias e os atos mais diabólicos que a humanidade foi
capaz de cometer. Graças a sua energia específica (pois comportam-se como
centros autônomos carregados de energia) exercem um efeito fascinante e
comovente sobre o consciente e, consequentemente, podem provocar grandes
alterações no sujeito. Isso é constatado nas conversões religiosas, em
influências por sugestão, e, muito especialmente, na eclosão de certas formas
de esquizofrenia (JUNG, 1989, p. 62).
Consideramos que estes elementos são suficientes para compreender a
concepção junguiana de inconsciente coletivo e por isso deixaremos de lado
outros termos e teses relacionados. Realizaremos, a partir de agora, uma
avaliação crítica de sua concepção para, posteriormente, retomar os elementos
que contribuem para a elaboração de uma teoria do inconsciente coletivo na
perspectiva do materialismo histórico.
A preocupação fundamental expressa nos textos de Jung é com a irrupção do
lado obscuro da mente humana. Sua grande preocupação é com as “piores infâmias
e os atos mais diabólicos que a humanidade pôde cometer”. De onde surgiu tal
preocupação? Como está explícito em suas obras, sua origem se revela na
ocorrência da Primeira Guerra Mundial (reforçada pela Segunda Guerra Mundial) e
no temor do fascismo e do bolchevismo.
A base da preocupação junguiana com a guerra e os fanatismos políticos,
no entanto, reside em outro lugar. Sem dúvida, a questão das guerras mundiais e
da ascensão do nazifascismo produziram uma preocupação em diversos
pesquisadores sobre como tal barbarismo pode ocorrer. Contudo, a resposta
específica fornecida por cada pesquisador e o grau de importância fornecido a
estes fenômenos decorrem da mentalidade de cada um deles. Erich Fromm e Theodor
Adorno, para citar apenas dois exemplos, desenvolveram outras teses e assumiram
outras posições sobre tal fenômeno.
Sem dúvida, a posição de Jung foi o resultado de um complexo
entrelaçamento de determinações. A primeira e fundamental reside no conservadorismo
de Jung, já aludido anteriormente. Embora ele consiga identificar alguns
problemas da “civilização ocidental” (sociedade capitalista), o seu
conservadorismo não lhe permite descobrir o processo de constituição das
relações sociais fundadas no antagonismo de classes. Isto se vê, por exemplo,
na sua afirmação ingênua de que a especialização é incentivada pela civilização
porque é “o segredo de certos êxitos”. O processo de desenvolvimento social
fundado no processo de produção da vida material produz a divisão social do
trabalho e, no capitalismo, isto se amplia numa escala extremamente elevada. A
especialização de Jung na psicanálise e seu desconhecimento e desconsideração
do marxismo, da sociologia, etc., possibilitam sua explicação unilateral da
força da especialização na sociedade capitalista. A unilateralidade intelectual
é um problema que Jung não percebeu, bem como o fato dela ser um produto de uma
subespecialização.
Mas além desta determinação, podemos dizer que a sua experiência psíquica
e seu envolvimento na primeira guerra mundial contribuiu com isto. Ele “serviu
durante a primeira guerra mundial como comandante do campo de prisioneiros de
Chateau D’Oex” (SILVEIRA, 1981, p. 18). Se a guerra impressiona pessoas
distantes dela, o seu efeito é muito maior naqueles que a presenciam,
provocando, em muitos casos, processos traumáticos. Foi neste período que ele
teve “intensas experiências interiores”, “sonhos impressionantes”, “visões”.
Assim,
pareceu-lhe
que a melhor solução seria esforçar-se por decifrar-lhes o sentido, mantendo a
consciência sempre vigilante e não perdendo o contato com a realidade exterior
(SILVEIRA, 1981, p. 17).
Percebemos que Jung se encontrou numa encruzilhada, no qual corria o
risco de “perder o contato com a realidade exterior”, o que significa que ele
passou por uma forte experiência de conflitos psíquicos que poderiam ter
desembocado em uma neurose. No entanto, ele arranjou forças para superar tais
conflitos e o risco que correu lhe proporcionou um medo intenso de “cair nas trevas”.
A solução que ele deu foi considerar este “lado sombrio” como um não-eu, tal
como ele concebe o inconsciente coletivo.
Assim, este medo intenso que Jung tinha de si mesmo
foi projetado para fora, para o inconsciente coletivo. É por isso que ele fornece
esta receita para as demais pessoas e também concebe à religião um papel tão
importante, pois ela pode canalizar a energia psíquica e impedir que “o mal”
venha à tona. O medo de si mesmo é transferido para a humanidade e é por isso
que as guerras mundiais, o fascismo e o bolchevismo se tornam suas grandes
preocupações. O seu conservadorismo pessoal e o conservadorismo social se
reforçam reciprocamente.
Até aqui explicamos a gênese da concepção junguiana do inconsciente
coletivo. Mas ainda resta a tarefa de realizar a sua crítica. Jung critica
Freud e Adler por produzirem “teorias redutivas” com pretensão de globalidade e
não percebe que ele produz uma concepção reducionista com igual pretensão
globalizante. O reducionismo se encontra em sua explicação unilateral dos
fenômenos se fundamentando apenas nas forças psíquicas, deixando de lado toda a
complexa totalidade e as múltiplas determinações dos fenômenos. É o que se vê,
por exemplo, na sua interpretação do nazismo, considerado por ele um “fenômeno
patológico”, uma “irrupção do inconsciente coletivo”. Segundo Silveira, para
Jung,
Wotan
havia tomado posse da alma do povo alemão. E que é Wotan? É o Deus pagão dos
germânicos, um Deus das tempestades e da efervescência, desencadeia paixões e
apetites combativos’. Num ensaio publicado em 1936, Jung traça o paralelo entre
Wotan redivivo e o fenômeno nazista. Wotan é uma personificação de forças
psíquicas – corresponde a ‘uma qualidade, um caráter fundamental da alma alemã,
um ‘fator psíquico de natureza irracional, um ciclone que anula e varre para
longe a zona calma onde reina a cultura’. Os fatores econômicos e políticos
pareceram a Jung insuficientes para explicar todos os espantosos fenômenos que
estavam ocorrendo na Alemanha. Wotan reativado no fundo do inconsciente. Waton
invasor, seria a explicação mais pertinente (SILVEIRA, 1981, p. 23).
O reducionismo de Jung não é nem um
pouco melhor do que o de Freud e Adler. Isto se torna mais perceptível quando
notamos que o seu fundamento é metafísico. Por qual motivo “Wotan foi
reativado”? Isto só pode ser explicado pelo complexo processo social ocorrido
na sociedade alemã (a derrota na primeira guerra mundial, as tentativas de
revolução socialista, as dificuldades de reprodução da acumulação capitalista,
a fome etc.). No entanto, Jung desconsidera o processo social e se refugia em
“arquétipos” imutáveis e universais.
As “provas” que ele apresenta para a
existência de tais arquétipos não provam nada, pois os mitos, contos de fada,
lendas, etc. por mais que possuam semelhanças, não significa que expressam
“imagens primordiais”, além do fato de que grande parte das semelhanças são
produtos da interpretação de Jung. Da mesma forma que um matemático pode
encontrar “elementos matemáticos” na base de toda construção humana (ciência, arte
etc.), um maniqueísta pode ver a “luta do bem contra o mal” em tudo que existe,
um darwinista pode ver a “luta pela existência” e a “sobrevivência dos mais
aptos” em todas as esferas da vida, um pseudomarxista pode ver “causa
econômica” em tudo que existe, Jung pode encontrar o inconsciente coletivo em
todas as manifestações culturais. Contudo, todas estas concepções são
reducionistas e produtos de mentes engenhosas, mas que não passam de modelos
mentais, nos quais a realidade é encaixada à força, e servem muito mais para
ocultá-la do que para revelá-la.
Desta forma, Jung apresenta uma
concepção igualmente reducionista, tal como acusava em Freud e Adler. No
entanto, existem alguns “momentos de verdade” na concepção junguiana (da mesma
forma que ele afirmou existir nas concepções de Freud e Adler). Essa breve
análise da concepção junguiana do inconsciente coletivo é importante para
adiante podermos resgatarmos os seus momentos de verdade.
[1] Jung
dedica uma de suas principais obras ao problema dos tipos psicológicos (JUNG,
1976).
[2] “Como é
sabido, o processo cultural consiste na repressão progressiva do que há de
animal no homem; é um processo de domesticação que não pode ser levado a efeito
sem que se insurja a natureza animal, sedenta de liberdade” (JUNG, 1989, p.
11). Ele acrescenta que hoje sabe-se que não é só a natureza instintiva que é
atingida pela coerção cultural mas também “novas ideias”, as paixões políticas
e a religião.
* VIANA, Nildo. A Concepção Junguiana de Inconsciente Coletivo. In: VIANA, Nildo. Inconsciente Coletivo e Materialismo Histórico. 2ª edição, Revista e Ampliada. Florianópolis, Bookess,
2015.