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quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

JUVENTUDE, TRABALHO E PROJETO DE VIDA


Juventude: anos 1980

JUVENTUDE, TRABALHO E PROJETO DE VIDA

 Nildo Viana


A relação entre juventude e trabalho é bastante complexa. O destino dos jovens, na sociedade moderna, é o trabalho. Essa, portanto, é uma das preocupações fundamentais dos jovens, bem como da psicologia e outras ciências. A questão da “escolha vocacional” é uma das mais constantes nas análises psicológicas da juventude. A relação dos jovens com o trabalho se manifesta nos dilemas existenciais, na vida psíquica e nas representações e concepções destes. A ideia de “projeto de vida” remete a uma questão fundamental que está intimamente relacionada com o trabalho e a escolha vocacional. Várias pesquisas apontam para a recusa do trabalho por parte dos jovens, desde as análises de Rousselet (1974) sobre a “alergia ao trabalho” até as análises mais recentes da posição da juventude diante da atividade laboral remunerada. Assim, para entender a posição da juventude diante do trabalho é necessário entender a dinâmica do trabalho na sociedade capitalista, a inserção da juventude nessa sociedade, objetivando entender a recusa do trabalho e os projetos de vida relacionados a ele ou que marcam a sua recusa.
O tema do trabalho alienado e das mutações nas relações de trabalho assume importância fundamental para compreender a posição da juventude diante da questão do projeto de vida e da atividade laboral remunerada. Os jovens ainda não inseridos no mercado de trabalho não tendem a sentir atrativo pelo mesmo devido seu caráter alienante e por isso a busca de evitar ou atrasar a entrada nas atividades laborais remuneradas. Por outro lado, a exigência social de trabalho e rendimentos força os jovens a buscar a inserção no mercado de trabalho. Para os jovens das classes exploradas, especialmente proletários e lumpemproletários, a experiência do trabalho precoce cria um diferencial em relação aos indivíduos jovens das demais classes sociais.  Nesse sentido, torna-se fundamental discutir a questão do projeto de vida para compreender melhor a relação entre juventude e trabalho, o que remete, também, ao processo de análise da juventude e do trabalho na sociedade contemporânea.
Projeto de Vida: Determinação e Liberdade
A discussão sobre juventude e projeto de vida é realizada por diversas abordagens na academia brasileira (MANDELLI, SOARES e LISBOA: 2011; DIB e CASTRO, 2010; LEÃO, DAYRREL e REIS, 2011; DIB, 2007; MAIA e MANCEBO, 2010). Contudo, a precisão conceitual em torno do que seja “projeto de vida” não se manifesta sob a forma adequada. Começaremos, portanto, com a discussão em torno do conceito de projeto de vida.
O termo projeto é, como quase todos, polissêmico. Antes de definirmos o conceito de projeto de vida, discutiremos o sentido da palavra projeto em geral. A sua origem remonta a formação da sociedade moderna e o seu uso é o mais variado possível, não somente no nível das representações cotidianas como das diversas áreas do saber especializado (arquitetura, pedagogia, filosofia, etc.) com sentidos e objetivos distintos. Há também variações dependendo do idioma em que se manifesta[1]. A sua origem remonta ao projectus, termo em latim, que significa algo que é lançado como um jato para frente, tal como no caso do projétil, em português. Um pesquisador francês assim define projeto:
[...] conceito dotado de propriedades lógicas a serem explicitadas em suas conexões com a ação a ser conduzida. Mas, ao mesmo tempo, o projeto aparece como figura que remete a um paradigma, simbolizando uma realidade que parece preexistir e escapar-nos: aquela de uma capacidade a ser criada, de uma mudança a ser operada. O projeto seria, então, o avatar individual e coletivo de um desejo primitivo de apropriação (Boutinet, 2002, p. 27).
Essa concepção possui alguns elementos que coincidem com outras definições, mas é demasiadamente descolada da realidade e por isso ao mesmo tempo não traz concreticidade e nem um caráter abstrato mais amplo para uso em diversos contextos. Como aqui não nos interessa as concepções de projetos de determinadas áreas especializadas do saber (arquitetura, pedagogia, etc.), então realizaremos uma discussão no âmbito da filosofia para depois avançarmos na definição de projeto de vida. Partiremos de dois pensadores para repensar o conceito de projeto: Sartre e Marx.
A concepção sartreana de projeto remete à sua concepção de liberdade. Obviamente que devemos distinguir o Sartre de antes da Segunda Guerra Mundial com o posterior (VIANA, 2008a), pois no primeiro caso a ideia de liberdade humana era sem limites e no segundo, com sua aproximação com o marxismo, passou a levar em consideração a questão da situação, dos grupos, etc., e ganhou não apenas mais concreticidade no nível analítico da realidade, mas também no sentido político e social. Nesse sentido, a concepção em O Ser e o Nada (SARTRE, 1998) difere da concepção em obras posteriores, principalmente em Crítica da Razão Dialética (SARTRE, 2002). Para Sartre, a liberdade significa “autonomia de escolha” (1998), posição que carregará com ele mesmo com as mudanças no seu pensamento[2]. Essa ideia de liberdade é que revela o significado do conceito de projeto em Sartre:
“[...] queremos dizer que o homem, antes de mais nada, existe, ou seja, o homem é, antes de mais nada, aquilo que se projeta num futuro, e que tem consciência de estar se projetando no futuro. De início, o homem é um projeto que se vive a si mesmo subjetivamente ao invés do musgo, podridão ou couve-flor; nada existe antes desse projeto; não há nenhuma inteligibilidade no céu, e o homem será apenas o que ele projetou ser” (SARTRE, 1987, p. 9).
Assim, Sartre, um grande pensador da liberdade, utilizando o conceito de projeto, se aproxima do marxismo, através do reconhecimento da situação (infância, classe social) e de que a escolha que manifesta a liberdade humana é uma escolha situada. O homem continua sendo livre, mas suas escolhas ocorrem em determinadas situações e havendo uma “hierarquia de mediações” se percebe este duplo processo de determinismo e liberdade (SARTRE, 2002; VIANA, 2008a).
Marx, por sua vez, é considerado por muitos, equivocadamente, como um pensador determinista. O ser humano, nessa interpretação equivocada, seria apenas um joguete das forças sociais coletivas (seja as forças produtivas, o “sistema” – termo que Marx nem sequer utilizava –, a economia, etc.). Para Marx, “a natureza humana é a liberdade” (MARX, 1980), afirmação pouco conhecida dos mal e não leitores deste autor. Mas o que significa dizer que a natureza humana é a liberdade? Afinal, a posição de Marx seria a mesma que a de Sartre? Na verdade, são concepções próximas, mas distintas.
Claro que Sartre era um tanto quanto contraditório ao colocar que “o homem está condenado a ser livre” e, ao mesmo tempo, dizer que não existe “natureza humana” (SARTRE, 1987). Marx concebia uma natureza humana e esta era caracterizada pela liberdade. Contudo, outra diferença reside na concepção de liberdade. A concepção sartreana coincide com a concepção liberal, o que permite o foco na questão da escolha. Marx concebia a liberdade como práxis, ação teleológica consciente (MARX, 1988). A construção da concepção marxista da natureza humana expressa a inseparabilidade entre ser humano e natureza. O próprio ser humano é parte da natureza. Por isso, ele está submetido às necessidades de seu organismo, tal como a de beber, comer, reproduzir, etc. Contudo, o ser humano é mais do que um animal e apesar de compartilhar tais necessidades com os demais seres vivos, ele possui sua especificidade, que é justamente os elementos fundamentais de sua natureza, sua essência.
Ele, para satisfazer tais necessidades básicas, cria novas necessidades, especificamente humanas, derivadas da forma como busca concretizar tal satisfação (MARX e ENGELS, 1991; VIANA, 2007). O trabalho e a cooperação constituem os elementos constitutivos da natureza humana e que, por sua vez, geram novas necessidades e nesse sentido o ser humano é um ser em constante desenvolvimento. Porém, há uma confusão nas interpretações dessa concepção. A natureza humana revela necessidades-potencialidades, mas que podem, e efetivamente são, negadas em determinadas relações sociais. É nesse sentido que Marx analisou a questão do trabalho alienado, que constitui uma negação da natureza humana. Isso se deve ao fato de que o trabalho que Marx concebe com sendo expressão da natureza humana é o teleológico consciente. Segundo Marx:
Pressupomos o trabalho numa forma em que pertence exclusivamente ao homem. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção de suas colmeias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador, e portanto idealmente. Ele não apenas efetua uma transformação da forma da matéria natural; realiza, ao mesmo tempo, na matéria natural seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, a espécie e o modo de sua atividade orientada a um fim, que se manifesta como atenção durante todo o tempo de trabalho, e isso tanto mais quanto menos esse trabalho, pelo próprio conteúdo e pela espécie e modo de sua execução, atrai o trabalhador, portanto, quanto menos ele o aproveita, como jogo de suas forças físicas e espirituais (MARX, 1988, p. 142-143).
O trabalho alienado anula a possibilidade da intencionalidade, da finalidade e plano atribuído ao trabalho. Ao fazer isso, nega a natureza humana e, não só isso, mas também degrada as relações sociais, pois o trabalho alienado é uma relação social na qual alguns indivíduos dirigem as atividades de outros indivíduos e ao fazê-lo passa a dirigir o produto do seu trabalho e constituir a degradação das relações sociais, pois a cooperação é substituída pelas relações de dominação, exploração e, por conseguinte, pela luta. Esse é o processo que ocorre nas sociedades de classes. Assim, a liberdade (a essência humana) do ser humano se autoproduzir na história é negada. Ela se vê reduzida à luta pela liberdade, o único momento de liberdade que resta ao ser humano. Assim se compreende a aparente contradição de Marx ao postular uma natureza humana e ao mesmo tempo colocar o ser humano como um ser histórico e social que muda com as transformações sociais. Segundo Marx:
O modo pelo qual os homens produzem seus meio de vida depende, antes de tudo, da natureza dos meios de vida já encontrados e que têm que reproduzir. Não se deve considerar tal modo de produção de um único ponto de vista, a saber: a reprodução da existência física dos indivíduos. Trata-se, muito mais, de uma determinada forma de atividade dos indivíduos, determinada forma de manifestar sua vida, determinado modo de vida dos mesmos. Tal como os indivíduos manifestam sua vida, assim são eles. O que eles são coincide, portanto, com sua produção, tanto com o que produzem, como com o modo como produzem. O que os indivíduos são, portanto, depende das condições materiais de sua produção” (MARX e ENGELS, 1991, p. 28).
Os seres humanos são o que fazem e como fazem, mas isso não abole o que eles necessitam (o que está expresso na mesma obra, a respeito do trabalho e da cooperação). Ou seja, há a existência humana, que mostra o que os seres humanos são concretamente, mas há também sua essência, aquilo que revela suas necessidades (satisfeitas ou não satisfeitas) e potencialidades. A satisfação de suas necessidades, a realização de suas múltiplas potencialidades, o desenvolvimento de suas forças físicas e mentais, é a liberdade, que está limitada por relações sociais limitadas, constituídas a partir da alienação, da exploração de classes, e tudo que deriva daí.
Nesse sentido, para Marx, a liberdade humana é muito mais restrita, mas tal restrição é constituída histórica e socialmente, assim como pode ser abolida e sua superação se dá com a constituição do comunismo ou da “livre associação dos produtores”. Dessa forma, podemos dizer que Sartre coloca um peso maior na liberdade (de escolha) e Marx um peso maior no processo de subjugação dos seres humanos, mas a diferença é de grau e não de qualidade[3]. Contudo, ambos apontam para a necessidade da libertação humana, para uma liberdade mais ampla ou plena.
Essas duas concepções nos permitem pensar o conceito de projeto de vida. O projeto, palavra que Marx não utilizou, embora tenha utilizado outras palavras com sentido semelhante, ao afirmar o caráter teleológico consciente do ser humano, é intencionalidade, finalidade, produzida na mente para depois se transformar em ação. Para Sartre, o projeto é fundamentalmente o querer. Assim, apesar uma certa nuance, assumem significados próximos.
Desta forma, podemos definir o conceito de projeto (que vai além da palavra de uso comum em seus diversos sentidos) como o que os indivíduos querem realizar, seus planos para desenvolver suas atividades. O projeto é o querer e a intencionalidade dos indivíduos na realização de suas atividades e ações em geral. O projeto de vida, por conseguinte, é aquilo que os indivíduos querem e intencionam fazer com suas vidas. Aqui o significado é mais profundo, pois tem a ver como uma opção de vida, uma intencionalidade não para realizar uma tarefa determinada por pressões sociais ou por necessidades impostas do exterior. Trata-se de uma determinada forma de pensar sua existência num sentido ideal (uma intencionalidade ou querer que revela uma reflexão e consciência sobre o que quer realizar e como fazê-lo) que se busca concretizar, no sentido mais amplo em relação à sua vida como um todo. Isto se assemelha à ideia do primeiro Sartre de “escolha original” ou “projeto original”, que é o fundamento de todas as escolhas e que no segundo Sartre será uma “escolha situada”. Essa concepção também expressa o que em Marx pode ser chamado de práxis, o trabalho como objetivação, manifestação ou autorrealização do ser humano, processo pelo qual ele se autorreproduz, ou seja, se reproduz de forma teleológica e consciente.
Contudo, se projeto de vida é práxis, projeto inaugural, é preciso reconhecer os seus limites na “situação”, que, precisa ser melhor compreendida e isso foi abordado de forma muito mais profunda e complexa por Marx. Nesse sentido, temos que distinguir entre existência e essência humana. A existência humana pode e efetivamente nega a essência humana, inclusive a elaboração de um projeto de vida. Na sociedade capitalista, mais especificamente, os indivíduos estão submetidos ao processo de alienação, exploração, dominação, opressão que perpassa todas as suas relações sociais, a começar pelo trabalho alienado que manifesta dominação e exploração simultânea, bem como sua ressonância no conjunto das demais relações sociais e o processo de dominação geral (desde a formação estatal até as diversas organizações burocráticas que o indivíduo tem que se submeter). Tudo isto se fundamenta no trabalho alienado que ocorre em todas as formas de trabalho existentes na sociedade, mas cuja origem e papel fundamental deriva de sua existência no trabalho produtivo, que é onde se constitui as duas classes sociais fundamentais do capitalismo, o proletariado e a burguesia. Logo, esse processo é acompanhado pela resistência e luta e envolve todos os outros setores da sociedade. Entretanto, não poderemos aqui desenvolver mais essa questão, pois demandaria muito espaço e já foi amplamente discutido em diversas obras (MARX, 1988; MARX e ENGELS, 1991; MARX, 1987; VIANA, 2009; VIANA, 2007; VIANA, 2008b; PANNEKOEK, 2011).
Nesse contexto, a elaboração de um projeto de vida é, para milhares de seres humanos, uma impossibilidade. Isso se deve ao fato de que estão preocupados com a sobrevivência, em primeiro lugar, e não resta tempo, possibilidade ou mesmo expectativa para ir além disso. Esse é o caso dos indivíduos pertencentes ao lumpemproletariado ou, em grande parte, ao proletariado[4]. Logo, as condições sociais impedem a elaboração de um projeto de vida. Além disso, essas condições desfavoráveis também permite a elaboração de projetos de vida sob o signo da alienação, o que significa o uso da liberdade para a não-liberdade. Se somos o que fazemos (Marx), então o que queremos (Sartre) pode ser derivado disso. O projeto de vida pode ser produzido a partir da essência humana e, portanto, negação do que somos e do que vivemos, ou pode ser produzido a partir da existência humana, e aí significa reafirmação do que somos e vivemos ou apenas escolha entre as formas existentes de ser e viver[5].
Isso significa que o projeto de vida pode ser uma janela para a liberdade, se for constituído a partir da essência humana, ou seja, das necessidades radicais do ser humano que entra em flagrante contradição com a sociedade capitalista, ou pode ser apenas uma reprodução da alienação, na qual a “servidão voluntária”, para usar expressão de La Boétie (1980), significa que o indivíduo aceita o que vive e apenas o reproduz e busca fazê-lo sob condições um pouco melhores. Assim, podemos falar em projeto de vida alienado e projeto de vida libertário. O primeiro significa uma busca de conformação do indivíduo à sociedade capitalista, buscando apenas melhores condições no seu interior e o segundo significa uma luta pela liberdade e autorrealização que entra em confronto com a totalidade da vida social burguesa e que se manifesta mais na própria luta do que na existência cotidiana, que, no entanto, também é um espaço de luta. O segundo significa algo mais raro e manifesta uma luta pela liberdade e pela autorrealização, que se mescla com a busca da sobrevivência, num equilíbrio que pode pender para um lado ou outro, dependendo do indivíduo, seus valores, representações, sentimentos, condições de vida, etc.
Juventude e Trabalho: Afirmação e Negação
Na sociedade capitalista, o destino dos jovens das classes exploradas e também dos pertencentes às classes privilegiadas, remete ao problema da relação com o trabalho e seu futuro na divisão social do trabalho, e por isso os projetos de vida instituídos pela juventude é de suma importância para analisar sua posição diante do mesmo.
A juventude é um grupo social caracterizado pela ressocialização (VIANA, 2004), também chamada de “socialização secundária” (BERGER e BERGER, 1978). A ressocialização é uma nova socialização após a que ocorre durante a infância e visa preparar o indivíduo para o trabalho e as responsabilidades sociais, ou seja, para o mercado de trabalho e para as demais atividades sociais necessárias, tal como as “cívicas”, como diria Durkheim (1978), casamento (produção e reprodução da força de trabalho), etc., incluindo um vasto campo de atividades, algumas consideradas da vida privada (casamento), outros da vida “social” (por exemplo: “o exercício da cidadania”). Para tanto, há o processo de escolarização, a principal instância de ressocialização e instituição caracterizadora da juventude (VIANA, 2004; AVANZINI, 1980).
No entanto, existem outras instâncias de ressocialização, desde o trabalho informal (estágios, “aprendizagem”, trabalho precoce no caso das classes exploradas, etc.), atividades “recreativas” ou em outras instituições (religiosas, etc.). O papel proeminente pertence à escola. Para indivíduos do lumpemproletariado, então é a própria vida no desemprego, mendicância, prostituição, subemprego, etc., que consiste em seu “modo de ressocialização”, que é um processo precário e que não prepara ou o faz de forma muito limitada (dependendo da fração do lumpemproletariado), devido ao fato os indivíduos desta classe não se inserem (ou se inserem marginalmente) na divisão social do trabalho, ou seja, no mercado de trabalho e também as demais responsabilidades sociais são igualmente limitadas.
Sem dúvida, o indivíduo pertencente a tal classe que consegue efetivar isso não é exceção e sim uma pessoa que mudou de classe social. A pouca integração do lumpemproletariado na sociedade capitalista e sua não criação estruturada de uma condição juvenil se assemelha ao caso da inexistência da juventude em sociedades pré-capitalistas. Contudo, mesmo os indivíduos do lumpemproletariado em determinada idade, comumente considerada da “juventude” (apesar de suas variações devido artificialidade de sua existência), são atingidos por outras instâncias de ressocialização, tal como os meios oligopolistas de comunicação e o Estado capitalista (legislação, por exemplo).
Isso significa que a juventude é um grupo social que emerge na sociedade capitalista, ou seja, é constituído pela sociedade moderna (VIANA, 2012b). O que lhe caracteriza é o processo de ressocialização, o que é comum a toda a juventude (e com a exceção parcial do lumpemproletariado). Desta forma, a juventude existe para constituir a predisposição para o trabalho e as responsabilidades sociais, para aceitar a disciplina, os valores, as representações, típicas da sociedade capitalista e da adaptação ao trabalho e outras responsabilidades sociais.
Nesse sentido, é necessário recordar que o trabalho para o qual se destina o jovem é alienado. É uma atividade dirigida, controlada por outro. Por conseguinte, o produto da atividade é controlado por outro. E ao ter sua atividade e o produto dela controlado por outro, então ambos se tornam alheios, pertencentes a outro[6]. Desta forma, o trabalho alienado é uma relação social de controle e por isso gera o alheamento, que significa que tanto a atividade e o produto que são controlados pelo outro, também se tornam alheios. É uma relação social entre o trabalhador/produtor e o não-trabalhador/proprietário. E nessa relação na qual a atividade e o produto da atividade são controlados por outros e a eles pertencem, então não há o trabalho no sentido de práxis, atividade teleológica consciente. O trabalho alienado é a negação da essência humana, ao substituir o trabalho como objetivação, autorrealização do ser humano através de sua atividade que é humanização do mundo, por um trabalho heterogerido, e também por degradar a relações entre os seres humanos, sendo que alguns passam a controlar os outros ao invés de existir uma cooperação e ação conjunta.
A consequência desse processo é a recusa do trabalho: o trabalhador não sente bem no trabalho, mas infeliz; não desenvolve suas energias físicas e mentais, mas mortifica sua própria natureza. O trabalho alienado não é voluntário e sim forçado. Não é uma necessidade (tal como o trabalho como objetivação, práxis) e sim um meio para satisfazer outras necessidades. Assim, “tão logo não exista coerção física ou outra qualquer, se foge do trabalho como de uma peste” (MARX, 1989, p. 153).
A juventude é ressocializada para a execução do trabalho alienado e, por isso, as instâncias de ressocialização, especialmente a escola (no caso o ensino médio, técnico-profissionalizante e superior) reproduzem o processo de alienação, pois precisa disciplinar a futura força de trabalho e repassar os valores e representações dominantes. A escola, assim como o local de trabalho, possui um horário fixo e controlado, hierarquia, controle, etc. O produto do trabalho escolar são práticas e ideias, sendo que estas últimas são mais reprodução do que produção, ou seja, mesmo das pedagogias não-tradicionais, o conteúdo continua sendo “transmitido”, que é a ideologia dominante, o saber técnico, as representações cotidianas que estão de acordo com os interesses dominantes, com variações e possibilidades de manifestações marginais de divergência. Trata-se de uma educação burocrática (VIANA, 2008c; VIANA, 2002; SOUZA, 2012; TRAGTENBERG, 1988) cujo objetivo final é reproduzir as relações de produção capitalistas[7].
Devido a isto existe a recusa tanto do trabalho alienado quando da escola. A recusa da escola (GOMES, 1997; VIANA, 2010; GUIMARÃES, 1996) se deve não apenas ao fato da alienação se reproduzir nesta instituição, mas também por outros motivos, desde as questões sociais que atingem os estudantes das classes exploradas até o caso da falta de perspectiva de emprego posteriormente ou pelo próprio descrédito e condições precárias de grande parte das escolas. Contudo, o nosso foco aqui é a recusa do trabalho alienado[8]. Sem dúvida, tal recusa independe de saber teórico sobre alienação e coisas semelhantes (embora exista e sirva de justificativa para certos setores), pois o próprio caráter do trabalho vivenciado cotidianamente ou visto através dos outros, mostra o parcelamento, o empobrecimento das tarefas, etc. (ROUSSELET, 1974). Numa sociedade competitiva, com trabalho empobrecido, a “alergia ao trabalho” é algo relativamente comum (ROUSSELET, 1974). Uma pesquisa realizada na França por Bajoit e Franssen (1997) aponta para a recusa do trabalho alienado e a busca de autorrealização, que, obviamente, se compreende fora dos quadros das relações de trabalho:
Essa recusa de um trabalho que impõe suas limitações ao conjunto da existência (“o trabalho que absorve vida inteira”) é expressa, de maneira mais ou menos aberta e declarada, pela maior parte dos jovens, qualquer que seja seu nível sócio-profissional: “Não quero uma vida em que você se sacrifica pela empresa” (Joy). O trabalho no quadro de um emprego não é considerado como o único modo de autorrealização. Na medida em que não seja realizador, ele tende a ser minimizado, para justificar uma autorredefinição, na esfera familiar para alguns, ou a partir de uma atividade pessoal para outros. “Eu não me definiria pelo trabalho, eu me definiria principalmente pelo que faço paralelamente” (Isabelle). O trabalho então é apenas um “bico”, o “trabalhinho”, o “contrato”, “temporário”, enquanto o verdadeiro trabalho é a atividade autônoma (BAJOIT e FRANSSEN, 1997, p. 85).
Contudo, ao mesmo tempo em que há uma negação do trabalho alienado, há também a sua necessidade. Na sociedade capitalista, a produção de mercadorias acaba se generalizando e esse processo gera a mercantilização de tudo (WALLERSTEIN, 1982; VIANA, 2008b). No capitalismo, os alimentos, roupas, habitação, etc., passam a ser mercadorias, portadores de valor de troca. Para sobreviver no capitalismo é preciso possuir uma mercadoria sui generis, o dinheiro, meio de troca universal, para comprar as demais mercadorias que são valores de uso e necessidade básica para sobrevivência. É por isso que aqueles que não possuem a propriedade dos meios de produção são constrangidos a vender sua força de trabalho em troca de um salário (MARX, 1988). É nesse contexto que o trabalho é valorado, pois não somente possui o caráter de uma necessidade, como também é cobrado e valorado socialmente (não em si mesmo, a não ser em algumas afirmações axiológicas, tal como a do “trabalho que dignifica o homem”) pelo que ele significa: sobrevivência, capacidade de consumo, entrada na vida adulta[9], “realização” profissional, etc.
Na sociedade capitalista, na qual a produção e consumo se separam parcialmente e se produz valores de troca, o consumo, a competição social, o status e tudo o mais é derivado do trabalho assalariado para a maioria da população (nos extremos há o lumpemproletariado e as classes privilegiadas, especialmente a burguesia, que não vende sua força de trabalho). Numa sociedade marcada pela alienação e, consequentemente, pela coisificação, então o trabalho alienado passa a “constituir um importante valor e ter como fundamental instância para a sua formação como sujeitos no sentido de ser um meio de realização dos sonhos e desejos pessoais” (MAIA e MANCEBO, 2010, p. 387). Sem dúvida, tais sonhos e desejos pessoais são os acima elencados, e se destaca a busca por ganhar a competição social, elemento estrutural da sociabilidade capitalista (VIANA, 2008b).
O resultado disso é uma ambiguidade diante do trabalho alienado: aceitação e negação, desvaloração e valoração. O caráter alienado do trabalho assalariado, bem como o seu caráter necessário no sentido da sobrevivência e da competição pela ascensão social. A juventude se encontra nessa condição ambígua e isso se reproduz também em relação à escola. Isso terá um forte impacto na questão da constituição de projetos de vida, que, contudo, possuem outras determinações.
Trabalho Alienado, Vida Alienada e Projeto de Vida
O trabalho alienado acaba generalizando a alienação por toda sociedade moderna. O processo de mercantilização e burocratização crescente das relações sociais criam uma situação em que o controle se torna cada vez mais amplo. A alienação passa a tomar conta de todas as relações de trabalho em diversas instituições, atingindo até mesmo o lazer, ou seja, o tempo supostamente livre após a jornada de trabalho alienado. Isso afeta diretamente a juventude e o projeto de vida dos jovens.
Contudo, antes de passar para a análise dos efeitos da generalização da alienação no que se refere aos jovens, é preciso acrescentar a questão das mudanças contemporâneas. A nova fase do capitalismo marcada pela emergência do regime de acumulação integral (VIANA, 2009; VIANA, 2003) gera mudanças sociais na esfera das relações de trabalho (reestruturação produtiva, toyotismo), na formação estatal (neoliberalismo) e nas relações internacionais (neoimperialismo) que tem consequências diretas para a juventude. A juventude, além de ser atingida pelas mudanças sociais gerais (incluindo as culturais derivadas desse processo, tal como colocaremos adiante), também sofre diretamente o impacto dessas mutações do capitalismo no processo educacional e nas relações de trabalho.
No que se refere ao trabalho, o processo de superexploração, precarização, etc. torna o trabalho alienado ainda mais degradante e menos atrativo. Da mesma forma, o processo de escolarização perde espaço não somente por sua precarização devido à dinâmica neoliberal de redução de gastos e desvio da renda estatal para investimentos onde o capital mais necessita[10], como também pelo futuro profissional do setor da juventude que entraria na profissão docente (VIANA, 2012c). Assim, cada vez mais a escola e o trabalho se tornam atrativos, e cada vez mais o futuro profissional e escolar se torna menos desejável. O processo de crescimento do desemprego que acompanha o regime de acumulação integral é outro elemento que deve ser considerado (bem como a estratégia do prolongamento da escolarização que é ao mesmo tempo despesa e disfarce para o desemprego juvenil que atinge milhões a nível mundial).
A vida alienada se intensifica e se torna ainda mais degradada. Assim, a ambiguidade da juventude em relação ao trabalho alienado se torna mais intensa. A alergia ao trabalho aumenta, da mesma forma que a necessidade do trabalho numa sociedade de alto grau de desemprego. É neste contexto que se pode pensar a questão do projeto de vida dos jovens na atualidade. Contudo, ainda faltam outras determinações nesse processo. É aqui que se estabelece a questão cultural.
Como o regime de acumulação integral emerge uma nova geração. A geração nascida entre os anos 1970 e 1980, em alguns países, ou entre 1980 e 1990, em outros países, é marcada por um processo de mutações do capitalismo que trazem especificidades na situação juvenil (VIANA, 2012d). A juventude como mercado consumidor passou a ser um nicho em crescimento e os meios oligopolistas de comunicação atuaram fortemente sobre ele. O consumo cultural torna-se um dos focos principais desse nicho de mercado. E é neste contexto que vão emergir e se tornar hegemônica novas ideologias e representações, entre as quais o pós-estruturalismo, o neoliberalismo, entre outras. O pós-estruturalismo emerge como uma contrarrevolução cultural preventiva depois das derrotas das lutas estudantis e operárias do final dos anos 1960 e início dos anos 1970, especialmente o Maio de 1968 (VIANA, 2009; VIANA, 2003). A nova vigência cultural do pós-estruturalismo, em suas diversas formas de manifestação, marcam processos que buscam naturalizar e essencializar processos culturais (YOUNG, 2002).
A preocupação com a identidade e multiplicidade de “identidades” constituídas socialmente acabam tornando o processo de ressocialização mais complexo e indefinido, embora muito mais no reino da ideologia do que na realidade concreta. A chamada “crise das utopias”, no fundo uma campanha ideológica orquestrada por um conjunto de ideólogos apoiados nos meios oligopolistas de comunicação e parte da intelectualidade conservadora e reformista, bem como um contexto social favorável (a ideologia do fim da história de Fukuyama não surgiu gratuitamente e sem dúvida a queda do Muro de Berlim fez com que parte da intelectualidade e da juventude perdesse seus referenciais de resistência ou buscasse unir os antigos ideais – alterando-os com as novas ideologias da moda – foi uma determinação). A década do “pensamento único” (anos 1990) e a hegemonia pós-estruturalista abriu caminho para toda uma situação de pessimismo, relativismo, ceticismo, que somente no final dessa década começou a perder espaço, mas continua ainda sendo a ideologia dominante.
A falta de um projeto utópico (e este não deixou de existir e inclusive de se fortalecer, e quanto mais há o desgaste do regime de acumulação integral, mais forte fica, mas ainda sem a força que já possuiu no passado e abrindo novas perspectivas hoje) promove a falta de ideais, ou que Ingenieros (2010) denominou a emergência do “homem medíocre”, o homem sem ideais, que sempre existiu, mas que percentualmente se elevou desde os anos 1970. Assim, junto com a ideologia pós-estruturalista e o neoconservadorismo – bem como manifestações análogas – emergem o “homem light” e a “vida light”, marcado pelo hedonismo e permissividade (ROJAS, 1996).
Diante desse processo, a juventude é constituída e reconstituída. A “identidade” da juventude é constituída socialmente e a falta de projeto de vida que se manifesta em determinados setores dela, está ligada a este conjunto de problemas existentes. Assim, a recusa do trabalho alienado persiste, bem como sua necessidade para amplas camadas da juventude. Nesse caso, não existe homogeneidade na juventude. Para a juventude das classes exploradas não há muita opção: é necessário se inserir no mercado de trabalho para garantir sua sobrevivência. Apesar de muitos, nesse caso, recusarem o trabalho alienado, necessitam dele. Esse processo de recusa-aceitação não gera um projeto de vida vinculado ao trabalho, como muitos pensam. O que gera, no fundo, é a busca de inserção no mercado de trabalho e ao mesmo tempo a busca de sua superação (a busca em se tornar pequeno empresário, etc., e, em alguns casos, transformação revolucionária da sociedade ou mesmo a transformação da política profissional como horizonte de superação de sua situação de classe). Em muitos casos, há uma ausência de projeto de vida, pois a vida alienada suga as energias e a capacidade de lutar por uma nova vida ou mesmo a força das ideologias e concepções dominantes – pragmatismo, hedonismo e permissividade, como coloca Rojas[11], podem ser fonte de ausência de um projeto de vida ou então de sua existência alienada e, portanto, fria, apenas reprodutor dos valores dominantes (competição, ascensão social, riqueza, poder, etc.) que não satisfaz os seres humanos, mas que o fracasso em atingir sua realização promove necessidade de fuga ou satisfação substituta. Alguns escapam pela via religiosa (SOFIATI, 2011). Outros transformam sua carreira profissional em projeto de vida (FORACCHI, 1965). Desta forma, há, para certos setores da juventude, uma ausência de projeto de vida, e, para outros, a existência de projetos de vida alienados.
Para um setor minoritário, há ainda a elaboração de projeto de vida que vai além da adequação à sociedade existente. Segundo Foracchi (1965), alguns (o que remete à questão do pertencimento de classe), fazem da carreira profissional não apenas o projeto de vida, mas também a transformação da profissão e da sociedade. Além disso, a recusa do trabalho alienado e da escola pode passar de contestação para projeto de vida de transformação radical da sociedade (VIANA, 2011). Claro que isso pode ser casos de setores minoritários, que podem ser impulsionados por uma cultura contestadora existente, movimentos sociais radicalizados, ascensão das lutas operárias e pode ser tornar uma tendência coletiva mais poderosa quando as lutas sociais avançam e se radicalizam, tal como ocorreu na rebelião estudantil de maio de 1968 em Paris (VIANA, 2011). Assim, o projeto de vida libertário se torna momentaneamente hegemônico na juventude. Em outros casos, pode ser mais ou menos forte, dependendo de um conjunto de determinações.
Considerações Finais
A partir da discussão anterior sobre projeto de vida, trabalho alienado, vida alienada, podemos concluir que a questão muitas vezes é mal colocada. Sem dúvida, não há consenso em torno dessa questão. O dissenso entre os pesquisadores manifesta distintas posições diante da sociedade moderna. É por isso que a maioria esmagadora dos estudos sobre juventude que aborda a questão do projeto de vida o confunde com o “projeto profissional”, a inserção dos jovens no mercado de trabalho, na carreira profissional. Sem dúvida, isso é mais forte na área da psicologia. As posições diante da sociedade moderna, no entanto, não são escolhas arbitrárias e indeterminadas dos indivíduos. Está ligada a questão de pertencimento de classe, formação intelectual, valores e representações, que formam mentalidades e posicionamentos diante da realidade. Assim como colocamos a diversidade de posição dos jovens diante da questão, os pesquisadores que estudam a situação e projetos destes jovens também se distinguem e manifestam diferentes perspectivas.
Da nossa perspectiva, que, obviamente, consideramos a correta, a discussão em torno dos projetos de vida vinculados apenas ao processo da carreira profissional significa em se limitar a apenas determinados setores da juventude que possuem projetos de vida alienados, ou seja, determinados pela sociedade (em suas diversas instâncias: família, meios oligopolistas de comunicação, Estado, discursos científicos, etc.). Também não deixa de ser verdade que a posição do pesquisador e o discurso científico (ou qualquer outro discurso especializado) sobre a questão tende a reforçar aquilo que se defende. A vida na sociedade capitalista é um palco de lutas e estas estão em todos os lugares, momentos, relações.
A discussão em torno da relação entre juventude e projeto de vida deve ser mais ampla, desde contemplando a ausência de projeto de vida até a inclusão de projetos de vida de setores minoritários e de caráter libertário, utópico. No fundo, o grande problema não é a ausência de projeto de vida, nem a existência de projetos de vida alienados, e sim os projetos de vida libertários serem minoritários, pois é isso que permite a humanização, a superação da mediocridade (INGENIEROS, 2010) ou do “vazio” (ROJAS, 1996), e o que permite unir envolvimento e objetivo, necessidade e autorrealização. Neste sentido, quando Reich (1976) afirma que o que se deve explicar não é o roubo derivado da fome e sim como que pessoas que têm fome não roubam comida, ele diz mais ou menos o que colocamos aqui: o que é preciso explicar não é porque alguns jovens possuem um projeto de vida libertário e sim porque a maioria não possui tal projeto.

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[1] Dependendo do idioma, a palavra muda de sentido ou se mistura com outras palavras e mais de um sentido (BOUTINET, 2002). Em italiano é progetto, englobando os significados de intenção, esquema e plano; em francês é projeto que possui os mesmos sentidos que no caso italiano. Em alemão é projekt ou Entwurf, que distingue entre projeto como desígnio (entwurf) e projeto como programa – Project (o que em inglês é distinguido como purpose e project). Em russo é proekt.
[2] Existem várias passagens em seus escritos posteriores que confirmam isso: “O homem é tão-somente, não apenas como ele se concebe, mas também como ele se quer; como ele se concebe após a existência, como ele se quer após o impulso para a existência. O homem nada mais é do que aquilo que ele faz de si mesmo: é esse o primeiro princípio do existencialismo” (SARTRE, 1987, p. 5-6).
[3] A concepção de liberdade em Sartre é a da “liberdade de escolha” e em Marx é a “liberdade para”, para usar terminologia de Ernst Bloch. A liberdade assume, para este filósofo, duas formas: a “liberdade de” e “liberdade para”, sendo que a primeira significa rompimento dos grilhões (estar livre da opressão, da prisão, etc.) e a segunda significa ação, realização de potencialidades, ou seja, a primeira é liberdade negativa, se livrar de algo, e a segunda, liberdade positiva, poder fazer (BICCA, 1987).
[4] É preciso destacar que o conceito de lumpemproletariado aqui é distinto das concepções simplistas que atribuem a Marx apenas uma noção pejorativa dessa classe e expressa aqueles que estão marginalizados na divisão social do trabalho (VIANA, 2012a). Quanto ao caso do proletariado, existem setores, em determinados lugares e épocas, que possuem um nível de renda e vida relativamente elevado, enquanto que em outros lugares e épocas, possuem estão numa situação extremamente desfavorável, e isso é mais complexo se pensarmos não apenas em termos geográficos e históricos, mas também entendendo que o proletariado é dividido por frações de classes e diversas outras subdivisões, tendo setores em situação bastante precária.
[5] Esse é o caso daqueles que optam pela adesão a manifestações religiosas: “A procura principal do jovem é por seu processo de inserção na sociedade. A questão é que essa sociedade vive um profundo problema de exclusão. Diante de uma situação de crise, a busca do religioso se configura numa tentativa de reconquistar o futuro como espaço de estabilidade social. como afirma Novaes, na análise do tema da juventude e religião é fundamental que se agreguem os elementos da insegurança e dificuldades de inserção social presentes no Brasil. Para a autora, o futuro é olhado pelos jovens pela ótica do medo. O caminho percorrido nesse processo se dá a partir da crise educacional, da falta de trabalho formal, da não participação política e da falta de perspectiva de futuro. Isso leva preponderantemente às drogas, ao alcoolismo e à prostituição. Nessa situação a Igreja passa a ser o ambiente de reencontro com a identidade e de resgate do projeto de vida” (SOFIATI, 2011, p. 49).
[6] A discussão sobre alienação e trabalho alienado é longa e já foi realizada por inúmeros pensadores. A palavra alienação tem vários sentidos, inclusive o jurídico. O uso aqui remete a concepção de Marx (1983), tal como apresentou nos seus Manuscritos de Paris. A grande questão é que mesmo na interpretação da concepção de Marx existe toda uma polêmica. Da nossa parte, julgamos que o contexto discursivo do referido texto é fundamental para a compreensão do conceito marxista de alienação e os problemas interpretativos e de tradução são, grande parte das vezes, gerados por valores, interesses, representações, que revelam uma divergência de perspectiva em relação a Marx e daí demonstra sua incompreensão. O mais comum nesse processo é a substituição da concepção materialista e social de alienação inaugurada por Marx por uma concepção idealista – e o objetivo de Marx era justamente superar isso – que remete a alienação para o plano da consciência. Porém, basta notar que Marx trata do trabalho alienado e não da “consciência” alienada, para se notar o quão problemática é tal interpretação. A questão da consciência diante do trabalho alienado é uma consequência e não a própria alienação. Da mesma forma, determinadas traduções problemáticas, que trocam o trabalho alienado por “trabalho estranhado” (MARX, 2011), reproduzem a mesma divergência de perspectiva e valores, representações e interesses em desacordo com a proposta de Marx de emancipação humana.
[7] O papel reprodutor da educação é reconhecido por diversas tendências sociológicas, incluindo Durkheim (1978) e Bourdieu e Passeron (1982), bem como tendências à esquerda (ILLICH, 1980), marxistas (TRAGTENBERG, 1988) ou influenciados pelo marxismo (SARUP, 1980). A diferença reside apenas em determinar o objeto da reprodução (desigualdades sociais, como em Bourdieu; ou “estados físicos, mentais e morais” para viver em sociedade). Claro que o caráter positivo dessa reprodução em Durkheim contrasta com a crítica da mesma, bem como a não percepção da contradição em algumas dessas posições difere da percepção da resistência e luta em outras.
[8] Sem dúvida, surgem ideologias e concepções que buscam naturalizar esse processo, transformá-lo em oposição entre “jovens” e “adultos”, o que não é totalmente falso mas que reflete mais uma pseudoconcreticidade (KOSIK, 1986) do que a questão essencial. Assim, pode parecer uma recusa das instituições dos adultos (SEIDMANN, 1968) ao invés do que realmente é, uma recusa da alienação.
[9] O que significa a integração completa na sociedade burguesa e motivo pelo qual emergiu o que Georges Lapassade denominou “mito do adulto-padrão” (LAPASSADE, 1975).
[10] Um elemento fundamental da educação superior no Brasil nos últimos anos, desde a emergência do regime de acumulação integral no Brasil, é a precarização do ensino superior estatal (VIANA, 2012c) e crescimento do ensino superior privado (VIANA, 2012c; SGUISSARDI, 2008).
[11] O uso de drogas, em constante crescimento, está relacionado com a falta de um projeto de vida: “com a droga se combate o tédio e a falta de um projeto de vida coerente e realista” (ROJAS, 1996, p. 108).
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Publicado em:
VIANA, Nildo. Juventude e Sociedade. Ensaios Sobre a Condição Juvenil. São Paulo: Giostri, 2015.

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