A Internet e as Rebeliões Populares no Mundo Àrabe
Nildo Viana
A chamada "Revolução de Jasmin", uma rebelião popular na Tunísia, marca um processo de radicalização das lutas de classes neste país e mostra um novo elemento que deve acompanhar as lutas sociais em nossa época, a internet e as redes sociais como meios de articulação e difusão, o que rompe com o monopólio das informações através das emissoras de rádio e televisão e alcança uma rapidez muito maior do que as formas mais independentes de comunicação (cartas, por exemplo) e com maior impacto (através do telefone é possível informar, mas via internet é possível mostrar imagens, fotos, vídeos, textos, etc.). A difusão da rebelião popular por outros países àrabes tem como inspiração as lutas sociais na Tunísia e a internet tem papel importante no processo de divulgação dos acontecimentos neste país, o que contribui com sua difusão.
As tentativas de revolução social sempre foram inspiradoras de movimentos análogos em outros países, desde as do início do século 20 (A Revolução Russa de 1917 inspirou movimentos análogos em diversos outros países, como Alemanha, Hungria, Itália, etc., incluindo a ideia dos "sovietes", os conselhos operários, como forma de auto-organização dos trabalhadores). O mesmo ocorreu posteriormente, principalmente no caso das lutas sociais do final dos anos 1960. Hoje, essa inspiração tende a se tornar mais rápida e precisa graças à internet, pois a desinformação e falta de precisão no que realmente ocorria serviu para a criação de toda uma mistificação da revolução russa ao unir bolchevismo e conselhos operários, que, na verdade, eram contraditórios.
Assim, as lutas sociais na Tunísia, o que vem se estendendo para outros países, ganharam destaque na imprensa mundial pelo papel desempenhado pela internet, especialmente o Facebook e as redes sociais. A reportagem de Taíssa Stivanin informa que 25% dos tunisianos possuem conta no facebook (clique aqui) e tendo em vista que se trata de um país de capitalismo subordinado e que grande parte da população vive na pobreza, então é algo significativo, embora não abarque toda a população do país. A rebelião popular se espalha para diversos países, tal como o Iêmen (clique aqui) e algumas reportagens colocam o papel da juventude, dos desempregados (lumpemproletariado) e da suposta "classe média" (certamente setores das classes auxiliares da burguesia, como intelectualidade, e das classes subordinadas com melhor nível de renda) e principalmente da internet nesse processo (clique aqui).
A grande novidade da Revolução de Jasmin, como vem sendo chamado a rebelião tunisiana, é justamente o papel da internet e das redes sociais enquanto instrumento de articulação e difusão do movimento contestador. Isto, obviamente terá conseqüências, entre elas a censura sobre este meio de comunicação, o que já vem ocorrendo. Segundo Taíssa Stivanin, "As autoridades logo perceberam o perigo que representava a Internet, e suspenderam o Twitter e Facebook".
Obviamente que as bases sociais das lutas sociais na Tunísia e demais países, tal como os governos autoritários (alguns ditatoriais e quase "vitalícios"), o desemprego, etc., em países de capitalismo subordinado, sob domínio do neoimperialismo, são o fundamental, mas as condições semelhantes nestes países também produz uma tendência comum que o processo de difusão de informação das lutas reforça, ampliando a capacidade de expansão das lutas sociais. Claro que entre os países africanos, a situação da Tunísia é bem melhor do que o de muitos outros países, o que torna a base social da revolta mais forte na Africa do Norte.
O papel da internet na revolta popular na Tunísia é apenas um sinal de sua potencialidade de uso comunicacional subversivo, e os protestos no Egito, Jordânia, etc., não são desencadeados com base nas notícias veiculadas pelos meios oligopolistas de comunicação. Da "Revolução de Jasmin" (Tunísia) à "Revolução das Rosas" (Iêmen) é possível perceber que as revoltas populares ganham com o uso comunicacional da internet, e a ampliação do seu potencial subversivo é de fundamental importância, inclusive para passarem de revoltas com nome de revolução para verdadeiras revoluções sociais, que não apenas derrubam governos, mas abolem o estado de coisas existente em sua totalidade e instaura novas relações sociais e radicalmente diferentes em seu lugar.
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A comunicação entre os manifestantes é fundamental para a continuação e desenvolvimento das lutas em qualquer tipo de confronto. Sabendo disto, nestes momentos de acirramento das lutas, os governantes e as classes dominantes impõe medidas restritivas das mesmas (digo medidas mais restritivas do que em tempos de controle e passividade ...), tais como proibição de reuniões públicas, toque de recolher, censura da oposição nos rádios e nos canais de TV (fácil de o governo realizar, já que é o mesmo que em última instância controla estes meios de comunicação), e também na internet e celulares, como o Nildo já disse, e pode-se ver em reportagens tal como em http://www1.folha.uol.com.br/mundo/867206-egito-bloqueia-internet-e-celular-para-conter-megaprotestos.shtml .
ResponderExcluirNo entanto o movimento parece persistir e resistir a essas ações de censura e repressão. Uma hora os órgãos repressivos e as classes dominantes do Estado perceberão que não há mais como conter o movimento e abandonarão a figura do ''ditador'' e tentarão um novo pacto social para conter as massas e manter o estado de coisas tal como se encontram.
A esperança é que o movimento avance de um caráter espontâneo para um caráter de autonomia, e posteriormente para um caráter autogestionário (como teorizou Karl Jensen), e que os Conselhos Operários e outros conselhos se transformem na forma de organização e comunicação predominantes!
Prezado Anônimo,
ResponderExcluirConcordo com suas palavras, pois essa tendência é possível de se realizar, embora exista as contratendências e as condições específicas destes países (religião, cultura, condições sociais e espaciais, etc.). E em todas as experiências históricas de luta por transformação social, novas formas de comunicação tendem a surgir e outras são reelaboradas (a autoimolação do jovem tunisiano, universitário e desempregado (o que tende a se tornar cada vez mais uma realidade a nível mundial) que perdeu sua barraca de venda de legumes por ação policial e que levou ao seu suicídio é, de certa forma, uma maneira de se comunicar, de mostrar no próprio corpo e exemplo a que grau chegou a degradação humana e o aparato repressivo), como pichações (tal como no maio de 1968), etc.
Só tenho uma pergunta sobre esses movimentos de luta de classes.Será que é possivel esses movimentos atingirem um contesto amplo mundialmente, ou seja ,todos os trabalhadores do mundo?
ResponderExcluirPrezado Anônimo,
ResponderExcluirPenso que a possibilidade existe, mas que ainda não é uma tendência. Para explicar isso eu retomaria uma discussão que fiz num texto sobre Adorno e a educação, na qual ele falava da possibilidade de volta do nazismo e eu diferenciava entre possibilidade existente e possibilidade tendencial:
"Aqui se faz necessário diferenciar possibilidade existente e possibilidade tendencial. Uma possibilidade existente é aquela que existe, isto é, é algo possível, mas sua probabilidade depende da concretização de outras possibilidades. Uma possibilidade tendencial é aquela que não só existe, mas existem forças e elementos que apontam para sua efetivação, tendo uma probabilidade maior de se efetivar, pois o curso dos acontecimentos aponta para sua realização".
Assim, existe essa possibilidade, mas ainda não é tendencial. Isso vai depender de algumas outras determinações - a nova crise financeira, os desdobramentos das lutas de classes no continente americano e europeu, a passagem das revoltas populares para luta revolucionária, etc. - Se alguns destes elementos se desenvolverem, então a tendência de uma mundialização das lutas sociais aumenta. Uma crise do regime de acumulação integral certamente desencadearia lutas sociais em diversos países e colocando na ordem do dia a transformação social.
legal , me ajudou muito em um trabalho da escola .. valeeu
ResponderExcluirE a coisa se alatraou, chegou ao Egito e outros países, até a China começou a censurar o twiter!
ResponderExcluirTem um autor que critica essa importância da internet nas rebeliões, o que acha disso?
ResponderExcluirQual autor, qual o argumento??
ResponderExcluirNão sou esse autor que o 'Anônimo' acima cita, mas também sou cético a esse respeito. Vejo a eclosão de rebeliões, no caso dos países árabes, como uma coisa planejada e articulada com ajuda do ocidente. Em cada país onde houve mudança de mandatário, alguém ganhou muito dinheiro. Aqui no Brasil e no Chile esse movimento parece ter sido apropriado por partidos de esquerda, que aproveitaram a onda global para divulgar suas bandeiras (PSOL e PSTU, principalmente), mesmo falando como se fossem 'apartidários'. Na USP ficou claro essa participação, nos outros locais ainda tentam dissimular com máscaras e agenda global misturada às óbvias agendas partidárias. Há até sites de 'ocupa' em cidades onde não há ocupação ainda ou onde a mesma falhou, todos interconectados, o que demonstra uma organização centralizada. Podem até dialogar com movimentos em outros países, até tentam esse caminho, mas no fundo é um movimento político tradicional de tentativa de acesso ao poder formal.
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