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quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

UMA IMAGEM VALE MAIS DO QUE MIL PALAVRAS: INTELECTUALIDADE E INTERESSES DE CLASSE - Rubens Vinicius da Silva


UMA IMAGEM VALE MAIS DO QUE MIL PALAVRAS: INTELECTUALIDADE E INTERESSES DE CLASSE


Rubens Vinícius da Silva

Licenciado em Ciências Sociais pela FURB – Universidade Regional de Blumenau.




Nos últimos anos, alguns intelectuais brasileiros têm ganhado muita evidência, prestígio e dinheiro, em especial ao ampliar suas atividades para além do fixado pela divisão social do trabalho. Ademais, os vínculos entre estes que mais se destacam na competição no seio desta classe, buscam se aproximar ainda mais, reforçando vínculos e angariando ainda mais espaço na sociedade capitalista. Um exemplo é o caso da foto abaixo, que apesar de ter sido apagada por aquele que a postou numa famosa rede social, nos abre espaço para uma crítica que não pode ser escamoteada. O que intelectuais em primeiro momento tão díspares, como o juiz federal Sergio Moro e o professor e historiador Leandro Karnal (que tão logo recebeu críticas exasperadas teve a “prudência” em retirá-la de circulação) possuem em comum?



Devido aos limites do texto e ao fato de Karnal ter postado a imagem, além de sua notoriedade cada vez maior (ele possui um programa na Rede Bandeirantes, com o sugestivo nome “Careca de Saber”) iremos nos concentrar em sua figura sem, contudo apontar o que há de comum entre ele e o cada vez mais renomado juiz federal Sérgio Moro. Assim, partimos do pressuposto segundo o qual intelectualidade é uma classe social essencialmente conservadora, portanto uma das classes auxiliares da burguesia (VIANA, 2012). Isso significa dizer que todos aqueles que pertencem a esta classe (dos conservadores aos hegemônicos, bem como dos venais aos progressistas, expressando distintas posturas intelectuais) compartilham de um modo de vida e de atividade comum, do qual derivam interesses comuns e, por conseguinte, determinados valores, costumes e representações que também são partilhadas.

No que tange ao termo progressista, empregado para definir a produção, postura e discursos de Karnal, cumpre ressaltar que o uso deste termo possui conotação negativa. Progressista aqui se refere justamente aos membros do bloco progressista: Leandro Karnal se enquadra entre os membros da intelectualidade que manifestam, de forma organizada e consciente, a perspectiva burguesa sob um manto mais “crítico”.

Para este bloco social, cuja expressão é a ação de setores da intelectualidade e da burocracia partidária e sindical, numa união que se dá através de suas forças organizadas e formas de consciência, gerando assim novos interesses e processos de luta, existe a necessidade de defender posições que apontem para um questionamento de determinados aspectos isolados da sociedade moderna. Portanto, não se trata de propor uma crítica radical, ou seja, que vá até às raízes do problema.

A dinâmica dos blocos sociais complexifica a luta de classes (VIANA, 2016): uma de suas formas se dá pela confusão, muitas vezes estabelecida (e algumas até intencionalmente) pelos representantes intelectuais do bloco progressista, no sentido de desviar a luta de classes da questão fundamental, o modo de produção capitalista, para, no caso da foto, questões de ordem moral. Como se outros orgulhosos colegas de classe social não fizessem o mesmo ao longo da história do capitalismo subordinado brasileiro...

Numa palavra, para o bloco progressista trata-se de defender o progresso, o desenvolvimento, portanto uma crítica limitada que só aponta para microrreformas, negando a totalidade concreta, as relações sociais e a necessidade urgente de transformação social. É defender, de forma diferente, a manutenção das relações de exploração e dominação características da sociedade moderna, capitalista.

Os vínculos de Moro e Karnal com o capital comunicacional também são explícitos. Além disso, ambos os intelectuais são muito bem pagos para ministrar palestras e seminários no país e no resto do mundo. Cumpre saliente que ambos são financiados pela classe dominante, em especial pela fração do capital industrial. O que explica a proximidade entre ambos é o fato de Moro se tratar de um representante intelectual do bloco dominante, ao passo que Karnal pode ser considerado um representante da ala moderada do bloco progressista: as críticas dirigidas por ambos à ditadura militar, a defesa enérgica da democracia (burguesa) revelam a grande proximidade existente entre os dois ideólogos.

Por ser uma classe auxiliar da burguesia, sua dependência material desta (a saber, uma parte do imenso mais-valor extraído do proletariado, sendo as duas classes citadas as fundamentais do modo de produção capitalista) se manifesta também na necessidade de buscar alianças com membros dessa classe.

Tal processo expressa seus interesses e alianças de classe, os quais se dão quer com membros da mesma classe ou de outras classes privilegiadas, (como por exemplo, a burocracia) no sentido de se reproduzir enquanto tal. A intelectualidade é paga pelos capitalistas para produzir ideologias, e seus membros tendem a se aliar e deste modo conservar e manter seus interesses e privilégios de classe.

Neste sentido, por mais aparentemente opostos que possam parecer em seus discursos, os intelectuais enquanto classe (ou seja, os indivíduos reais, históricos, concretos que produzem e reproduzem falsa consciência sistematizada - ideologia -, devido ao seu papel na divisão social do trabalho) têm sim algo em comum: para eles, trata-se de interpretar, compreender e criticar (nunca radicalmente, por óbvio) o mundo.

Porém, parafraseando Marx (MARX & ENGELS, 2004), um intelectual engajado e, portanto, revolucionário: os ideólogos têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo. Isso implica dizer que é necessário fortalecer posições intelectuais e produzir elementos de cultura que contestem a sociedade capitalista na sua totalidade, apontando para (dentre outras determinações) evidenciar a urgência do fortalecimento da perspectiva revolucionária, na forma de denúncia das alianças havidas entre a intelectualidade e a burguesia.

 O compromisso com a verdade e a busca pela transformação social são duas premissas fundamentais para os intelectuais engajados: romper com os vínculos com o capital e fomentar a luta pela autogestão social expressam a defesa do projeto de emancipação humana. Isso significa romper com os valores, ideias, sentimentos, interesses e representações de sua própria classe social, o que manifesta a luta individual e coletiva pelo resgate de uma produção efetivamente teórica, ou seja, uma expressão da realidade e não a deformação da mesma.

Bibliogr
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Referências
APÓS perder seguidores, Karnal apaga post de jantar com Sergio Moro. Disponível em: https://www.brasil247.com/pt/247/midiatech/284567/Após-perder-seguidores-Karnal-apaga-post-de-jantar-com-Sergio-Moro.htm.  Acesso em 12 de março de 2017.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã 1º Capítulo: Seguido das Teses sobre Feuerbach. 7ª Edição. São Paulo: Centauro, 2004.

VIANA, Nildo. A Teoria das Classes Sociais em Karl Marx. Florianópolis: Bookess, 2012.

VIANA, Nildo. Blocos Sociais e Luta de Classes. Disponível em: http://informecritica.blogspot.com.br/2016/03/blocos-sociais-e-luta-de-classes.html Acesso em 12 de março de 2017.

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Publicado originalmente em:
Revista Posição, Vol. 04, num, 14, 2017. 

Um comentário:

  1. Leandro Karnal (São Leopoldo, 1º de fevereiro de 1963) é um historiador brasileiro, atualmente professor da Universidade Estadual de Campinas[3] na área de História da América. Foi também curador de diversas exposições, como A Escrita da Memória, em São Paulo,[4][5] tendo colaborado ainda na elaboração curatorial de museus, como o Museu da Língua Portuguesa em São Paulo.[6] Graduado em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos e doutor pela Universidade de São Paulo,[7] Karnal tem publicações sobre o ensino de História, bem como sobre História da América e História das Religiões.

    Editora Contexto
    História dos Estados Unidos ISBN 978-85-7244-361-6
    Estados Unidos: a Formação da Nação ISBN 978-85-7244-177-3
    Conversas com um Jovem Professor ISBN 978-85-7244-723-2
    História na Sala de Aula ISBN 978-85-7244-216-9
    As Religiões que o Mundo Esqueceu ISBN 978-85-7244-431-6
    Editora Hucitec
    Teatro da Fé - representação religiosa no Brasil e no México do século XVI (1998) ISBN 85-271-0435-0
    Editora Nova Fronteira
    Pecar e Perdoar : Deus e Homem na história ISBN 978852093655-9
    Editora Unisinos
    A Detração - Breve Ensaio Sobre o Maldizer ISBN 978-85-7431-744-1
    Editora Leya
    Todos Contra Todos: o Ódio Nosso de Cada Dia ISBN 978-85-4410-532-0

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